Por José Barbosa Junior*, compartilhado da Revista Fórum –
“O novo Ministro da Educação vem de um dos polos mais fundamentalistas e retrógrados no Brasil, onde, por exemplo, ainda se discute se a mulher pode ou não exercer o pastorado. E tudo isso com a face polida, branca, aprovada e comprovada no Lattes. É o fundamentalismo em sua mais alta elaboração: a acadêmica”
Quando se fala em “fundamentalista” no Brasil, é comum a gente logo imaginar um pentecostal ou neo-pentecostal bradando nas ruas ou nos programas da TV aberta, e geralmente associamos essa imagem à falta de formação e informação. Isso pode não ser tão verdadeiro quanto pensamos.
O fundamentalismo como movimento surge na mudança entre os séculos XIX e XX como reação do protestantismo mais conservador (não pentecostal) ao chamado liberalismo teológico, que propunha uma interpretação da Biblia em diálogo com outras ciências e com base na crítica histórica e literária. Esse movimento de reação lança, então, uma série de documentos chamados “The Fundamentals: a Testimony to the Truth” (daí a alcunha de fundamentalistas), que tem vários alvos dentro do liberalismo teológico e o principal seria a aceitação do darwinismo por parte desses teólogos. Logo, a conclusão que os fundamentalistas chegam é que “ciência boa é a que confirma a Bíblia”.
Faz-se necessário e importante entendermos que o negacionismo científico, o racismo “trabalhado hermeneuticamente”, a legitimação da escravatura (os primeiros missionários no Brasil eram escravagistas), a homofobia e até, pasme, o sionismo dentro da igreja evangélica (entendem agora as bandeiras de Israel nos protestos?) são construídos ou reforçados por esse movimento fundamentalista. Sem contar o capitalismo, filho direto do calvinismo protestante, logicamente reforçado nesse momento.
É bom lembrar também que uma das principais formas de disseminação desse protestantismo se dá através da… Educação! É a época da explosão de Escolas e Universidades protestantes no Brasil como, por exemplo, os Colégios Batistas, institutos metodistas e presbiterianos (como a Mackenzie).
Mas, como são mais “discretos” e polidos, como têm um discurso aparentemente dialogal, belo, recatado e do lar, não são tão atacados quanto os neopentecostais, que são apenas a face extremada e midiática daquilo que sempre circulou nos bastidores do conservadorismo evangélico brasileiro.
Portanto, não me espanta que, para agradar a bancada evangélica e a ala conservadora (há muitos não neopentecostais nas bases de apoio ao governo Bolosonaro) o novo Ministro da Educação venha de um dos polos mais fundamentalistas e retrógrados no Brasil, onde, por exemplo, ainda se discute se a mulher pode ou não exercer o pastorado.
E tudo isso com a face polida, branca, aprovada e comprovada no Lattes. É o fundamentalismo em sua mais alta elaboração: a acadêmica.
É o MEC ajoelhado diante da cruz vazia do protestantismo. Neste caso, totalmente vazia. Sem nenhuma alusão ao pobre de Nazaré, assassinado por um sistema religioso fundamentalista aliado ao poder opressor do Estado.
A história, mais uma vez, se repete.
*José Barbosa Junior é teólogo, pastor da Comunidade Cristã da Lapa, escritor, membro do Comitê Estadual de Defesa da diversidade religiosa de MG