O obscuro escândalo bilionário das Lojas Americanas

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E como a imprensa trata que paga suas contas

Por Leandro Demori, recebido por Mail




Há poucos precedentes na história do Brasil. Vocês viram o que aconteceu? A empresa Americanas SA “descobriu” da noite pro dia uma “inconsistência fiscal” em seu balanço. Foi assim que eles chamaram o problema em seu comunicado ao mercado na quarta-feira à noite.

Que inconsistência é essa?

A mágica aparição, em balanço, de uma dívida de 20 bilhões de reais.

Não, você não leu errado: vinte BILHÕES de reias, que estavam ocultos em alguma contabilidade paralela da companhia. Inicialmente a empresa disse que se tratava de um erro de lançamento. Essa conta seria uma dívida com fornecedores que foi, em tese, comprada por bancos.

Nessa hipótese, fornecedores que desejam antecipar seus pagamentos a receber das Americanas recorrem a bancos, que pagam esses fornecedores e depois cobram das Americanas.

O comunicado da empresa é lacônico, e tudo indica que o problema vai muito além disso.

Não se trata de uma mera mudança de linhas em um excel.

A dívida da Americanas com fornecedores é de pouco mais de R$ 5 bilhões. De onde vieram esses outros R$ 20 bilhões?

O rombo dá mais que o dobro do próprio caixa da empresa, que é de R$ 8 bilhões – e chega a ser maios até mesmo que o patrimônio da loja, reportado em R$ 14 bilhões.

Nada faz sentido e tudo cheira a fraude fiscal.

A real

Eu ouvi ontem algumas pessoas familiarizadas com a questão. A tese levantada por elas é de que a empresa escondeu essa conta por anos pra melhorar seus balanços e se valorizar no mercado. A fraude teria anos e foi se avolumando de modo assustador. Duas semanas atrás, o executivo Sérgio Rial foi chamado para assumir como CEO da empresa. Ele “renunciou” ontem, mas essa renúncia seria uma fachada. Rial foi chamado justamente para dar credibilidade ao plano pós-hecatombe.

Os prejudicados serão sobretudo as “sardinhas” – pequenos investidores que compraram ações da Americanas e viram seu dinheiro evaporar.

Os bancos credores devem se safar. Os controladores Marcel Telles, Beto Sicupira e Jorge Paulo Lemann já garantiram que todos receberão seu dinheiro. Qual deve ser o plano, segundo essas mesmas fontes do mercado? Passa por emitir mais ações e vendê-las no mercado. No fim, mais sardinhas serão atraídas pra pagar a conta.

Há também enormes fundos com participação nas Americanas. Eles terão de segurar essa queda por enquanto. Em se tratando de bilionários como os controladores, imagino que seja difícil que eles pulem fora do negócio deixando a empresa à deriva. Não que rico passando a mão na bunda de rico não seja uma constante, mas minha aposta é que todos se sairão muito bem disso.

Auditorias 

Duas empresas globais de auditoria investigaram as contas da empresa nos últimos anos. Nem a atual, a PwC, nem a anterior, a KPMG, acharam nada.

Punição

Fosse uma empresa pública já teríamos até mesmo pedido de CPI e prisões. O que fará a Comissão de Valores Mobiliários com todos? O que acontecerá com os ex-diretores da empresa que participaram desse jogo? E com seus controladores?

Escandalosamente, muitos deles VENDERAM suas ações das Americanas seis meses atrás. Botaram R$ 210 milhões no bolso antes que o escândalo viesse à tona. Serão punidos por informação privilegiada.

E a imprensa?

A cobertura é medíocre. Esse é o maior escândalo empresarial do país desde a derrocada de Eike Batista, que tomou meses (anos?) de manchetes. Eu precisei diminuir ao máximo as capas dos principais veículos do Brasil pra encontrar as notícias sobre a Americanas.

Como isso tudo está acontecendo no setor privado, veremos o fim das manchetes em pouco tempo. A passada de pano será geral. O que explica?

Começo com os R$ 105 milhões que a Americanas investiu para patrocinar o BBB deste ano. A empresa é uma das maiores anunciantes do mercado e irriga de dinheiro os donos dos meios de comunicação.

Os controladores da Americanas controlam também outras mega anunciantes, sobretudo a InBev, patrocinadora do Campeonato Brasileiro na Globo, e Burger King, um mega anunciante de TV, sites e jornais. São intocáveis. O bilionário controlador Carlos Alberto Sicupira renunciou à presidência do conselho de administração da companhia apenas dois anos atrás. Estava lá quando tudo aconteceu. Quem fará a ele as perguntas incômodas?

Negócios, como sempre.

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