Por René Ruschel, Carta Capital –
Em meio a greves de vários setores, o governador Beto Richa (PSDB) apela a “tapetão” legislativo para aprovar pacote de cortes
As sessões de quarta-feira 11 e quinta-feira 12 na Assembleia Legislativa do Paraná deverão entrar para os anais do absurdo. Na quarta-feira, com o plenário tomado pelos servidores públicos em greve, os parlamentares que compõem a base de apoio do governador Beto Richa (PSDB) se reuniram no restaurante da Casa para discutir e aprovar um requerimento de Luís Claudio Romanelli (PMDB), líder da bancada governista, que prevê a votação “expressa” de um pacote de medidas administrativas e financeiras do Executivo. Nesta quinta, a sessão foi retomada. Com a Assembleia cercada pelos manifestantes, que tentavam evitar a chegada dos deputados, os governistas entraram no prédio escoltados pela Polícia Militar, escondidos em um caminhão da PM. Os grevistas reagiram e cercaram os deputados até que o projeto fosse retirado da pauta.
A bizarra entrada dos parlamentares na Assembleia tinha como objetivo aprovar o projeto que propunha a instalação de uma Comissão Geral para votar, em regime de urgência, o chamado “pacotaço” lançado por Beto Richa. Com essa manobra, a votação do pacote poderia se dar em menos de 24 horas, sem passar pelo crivo da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) nem voltar ao plenário para os debates.
A estratégia indignou os manifestantes, que voltaram a tentar ocupar a Assembleia. Os policiais militares reagiram, usando balas de borracha, gás de pimenta e bombas de efeito moral, mas foram incapazes de segurar a multidão. Em pouco tempo, os manifestantes reocuparam todas as dependências da Assembleia e acuaram os parlamentares governistas em uma sala e impediram que eles saíssem. Aos gritos de “retira ou não sai”, segundo relato do jornal Gazeta do Povo, os manifestantes exigiram que o projeto fosse retirado da pauta e tiveram sucesso.
Os deputados da oposição, que não participaram da sessão de quarta-feira, tentaram mediar o conflito entre os governistas e os manifestantes, mas não tiveram sucesso. “Trata-se de uma farsa com a qual não compactuamos. O Paraná vive a maior crise de sua história. Uma crise política, financeira e ética” afirmou na quarta-feira o deputado Requião Filho (PMDB).
Na manhã de quarta-feira, o presidente da AL, deputado Ademar Traiano (PSDB), decidiu cancelar a reunião de terça-feira 10, que provocou a rebelião. Nela, por 34 votos favoráveis e 19 contrários, os parlamentares aprovaram o requerimento que transformava o plenário da Casa em Comissão Geral. Foi o que bastou para provocar a invasão do plenário.
Apesar da mixórdia, desde segunda-feira o governador tucano não fez nenhuma manifestação à imprensa. Segundo rumores, no dia em que os servidores deflagraram a greve, Richa teria se ausentado do Palácio Iguaçu, que fica do outro lado da praça Nossa Senhora da Salete, no Centro Cívico, onde mais de 15 mil grevistas protestavam e aguardavam o encaminhamento da votação pelos deputados. Na quarta-feira 11, o secretário Chefe da Casa Civil, Eduardo Sciarra, declarou que o governador não está fugindo de suas responsabilidades e, no momento adequado, “irá se manifestar”.
Todo o imbróglio teve início com o envio de um projeto do governador Beto Richa à Assembleia propondo uma série de mudanças na estrutura organizacional e financeira do Estado. Dentre elas, Richa subtraía vantagens conquistadas pelos professores em seu plano de cargos e salários, como o fim do “quinquênio” – um adicional que é incorporado ao salário dos professores a cada cinco anos – além da demissão de professores, pedagogos e até merendeiras. Além disso, a Secretaria de Educação promoveria o que os professores chamam de “desmonte da estrutura educacional do Paraná”, com o fechamento de mais de 2.500 turmas de sala de aula e a suspensão de cursos noturnos em comunidades carentes. No fim da tarde de quarta-feira, todas as universidades estaduais aderiram à greve.
O que tem provocado maior debate, no entanto, é a proposta de transferir 8 bilhões de reais da previdência estatal reservada para o pagamento dos futuros aposentados no caixa único do governo. Com isso, o governador poderá utilizar a “poupança futura” para o pagamento da folha atual. Segundo especialistas, em menos de três anos esse montante terá virado pó e os servidores, ativos, inativos e pensionistas, podem ficar a ver navios.
Na Assembleia Legislativa, onde Richa tem uma folgada maioria de 37 deputados de um total de 54, o embate com a oposição e grevistas se dá pelo fato dos parlamentares da base do governo não aceitarem discutir o projeto pelos trâmites normais, debatidos nas comissões da Casa e depois em plenário, mas aprovar em menos de 24 horas com a chancela da Comissão Geral. “Esse projeto mexe com a vida de milhares de servidores e suas famílias. É preciso cautela e bom senso. O Paraná vive uma situação caótica e o governador não é um imperador para decidir, sozinho, os destinos dos paranaenses” afirmou o deputado Tadeu Veneri (PT).