Por Grasielle Castro, compartilhado de Huffpost Brasil –
Para a militância bolsonarista, a destituição da deputada não é obra do presidente, mas de integrantes do seu governo.
O fato de a deputada Bia Kicis (PSL-DF), aliada de primeira hora do presidente Jair Bolsonaro, ter sido informada por um colega de que havia sido destituída da vice-liderança do governo diz muito sobre o futuro da ala mais radical do bolsonarismo. A retirada dela do cargo, após ter votado contra orientação do governo pela constitucionalização do Fundeb, indica que o presidente está disposto a ceder aos conselhos dos parlamentares do Centrão por uma postura mais política e menos intransigente. Sinaliza ainda que o presidente está disposto a colher frutos de políticas que antes criticava, como as de transferência de renda.
Desde que intensificou a aproximação com parlamentares do Centrão para formar uma base no Congresso capaz de levar adiante sua pasta, especialmente econômica, o presidente tem ouvido que precisa baixar o tom. Os novos aliados advertem que a mudança também pode ajudar a descolá-lo das ações que investigam a promoção de fake news. Para isso, seria bom ele se afastar de figuras envolvidas nas investigações que ocorrem tanto no STF (Supremo Tribunal Federal) quanto na CPMI das Fake News.
Bolsonaro já vinha ouvindo os conselhos. No início deste mês, em gesto de pacificação com o STF, ele substituiu 2 de seus mais aguerridos aliados da vice-liderança do governo na Câmara. Otoni de Paula (PSC-RJ) e Daniel Silveira (PSL-RJ), listados nas ações das fake news, perderam seus cargos. Ambos têm histórico de ataques aos ministros da Corte. No lugar deles, entraram Carla Zambelli (PSL-SP) e Maurício Dziedricki (PTB-RS). A indicação do petebista já era uma inclinação clara aos novos aliados e atendia ao pleito do presidente do PTB, Roberto Jefferson.
A movimentação evidencia o quanto os bolsonaristas mais ligados ao guru ideológico do governo, Olavo de Carvalho, estão ficando de lado no governo Bolsonaro. Esse rearranjo ocorre no momento em que o grupo perdeu o comando do Ministério da Educação, e os militares e parlamentares do Centrão passaram a ter mais voz dentro da articulação do governo.
A maior participação desses 2 setores têm sido bem avaliada por Bolsonaro. O presidente, segundo os novos aliados, tem considerado positivos os resultados da nova estratégia. Além de afastá-lo do imbróglio do inquérito das fake news, Bolsonaro estaria satisfeito com a boa avaliação do auxílio emergencial. Tanto que buscou instituir um novo programa de transferência de renda.
Há ainda quem lembre que o comportamento do presidente se repetiu tanto na aprovação do auxílio emergencial quanto do Fundeb. Inicialmente, o governo estipulou o valor de R$ 200 para o auxílio, disse que não tinha de onde tirar dinheiro para a medida, mas quando viu que o Congresso se articulava para aumentar o valor para R$ 500, ele atropelou e apresentou uma contraproposta, de R$ 600. Pode, então, capitalizar a vitória da medida.
Foi assim também com o Fundeb. A equipe do presidente passou o fim de semana em uma ampla articulação contra a proposta, tentou empurrar o reajuste do fundo para 2022, mas alertado pelos novos aliados do Centrão, de que não venceria essa batalha, o presidente se apressou e sugeriu então aumento de 20% para 23% na participação da União. Faltou apenas combinar com a ala mais radical, que estimulada por sua equipe, havia passado o fim de semana inteiro trabalhando publicamente contra a constitucionalização do Fundeb.
No dia da votação, apenas 7 parlamentares foram contrários, todos aliados do presidente — que inicialmente também era contra o texto. Essa postura irritou o presidente porque deu a impressão de que ele foi derrotado. Na quarta-feira (22), ele minimizou o voto contra desses bolsonaristas. “Seis ou sete votaram contra. Se votaram contra, eles devem ter os seus motivos. Só perguntar para eles por que votaram contra. Agora, alguns dizem que a minha bancada votou contra. A minha bancada não tem seis ou sete, não. A minha bancada é bem maior do que essa aí”, disse.
A versão dos bolsonaristas
Apesar da alfinetada do presidente, parlamentares que votaram contra a proposta dizem que seguirão fiéis. No Twitter, a deputada Bia Kicis confirmou a manutenção da aliança. “Fora da vice-liderança, mas sempre apoiando o presidente Bolsonaro”, disse.
Fora da vice-liderança mas sempre apoiando o Presidente Bolsonaro https://t.co/qsBAbL4eGD via @YouTube pic.twitter.com/W0aqILJ90a
— Bia Kicis (@Biakicis) July 23, 2020
Ela também compartilhou uma declaração de apoio ao presidente que havia concedido à GloboNews. “Votei de acordo com a minha consciência. Aliás, eu segui o exemplo do presidente Jair Bolsonaro que, quando foi parlamentar, só votou de acordo com a consciência dele. Para mim, ele é um modelo e continua sendo um modelo”, disse.
A militância bolsonarista, que passou dias se manifestando publicamente contrária ao Fundeb, tem afirmado que a destituição de Bia Kicis não é obra do presidente, mas do governo dele — especialmente da ala militar. O grupo tenta não atrelar o presidente ao seu governo. A quinta-feira (23) foi de alertas ao presidente — de que ele estaria sendo manipulado.
Definitivamente, o Presidente precisa de melhores conselheiros ao seu lado.
— Eric Lins (@ericlinsg) July 23, 2020
O Bolsonaro demorou 1 ano pra chutar a Joice e os Generais chutaram a Kicis em 1 dia
— Deixa o Loen te Leitar? 🥛 (@_Leitadas_Loen) July 23, 2020