Por Carlos Eduardo Alves, jornalista, Bem Blogado
Tem muita água ainda para rolar, mas está cada vez mais provável a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva na eleição presidencial de outubro. Haverá tentativa de golpe ou de tumultuar o processo, mas a dúvida hoje é se Lula líquida a fatura no primeiro turno ou se precisará de uma segunda rodada para terminar com o atual governo genocida. No Brasil do imprevisível futebol clube, sempre é arriscado falar de futuro, mas é possível antever algum cenário na volta de Lula ao poder.
Primeiro, muito vai depender do Congresso Nacional que vai sair das urnas de outubro. A aberração do orçamento secreto já é tratada pública e despudoradamente pelo Centrão como uma ferramenta para engessar a administração Lula.
Feita a ressalva, que é relevante, imaginemos as prioridades. Infelizmente, o flagelo vergonhoso da fome voltou ao Brasil. Cálculos baseados em estudos de gente séria da área cravam que ao menos 33 milhões de compatriotas sobrevivem hoje enfrentando o drama da insegurança alimentar.
Qualquer governo minimamente decente teria que priorizar a solução dessa questão. Lula ainda mais, por seu legado de inclusão social. Portanto, um programa de urgência para eliminar esse flagelo tem que obrigatoriamente ser colocado em prática logo no início. Para isso, obviamente o famigerado teto de gastos terá que ser atropelado. Garantir a comida aos que padecem da fome gerada pela política econômica de Paulo Guedes é dever.
A tarefa de Lula não será facilitada pelo cenário internacional de incerteza econômica e pelo quadro fiscal gerado pelo misto de incompetência e medidas eleitoreiras de última hora do atual desgoverno Bolsonaro.
Em Português claro, não haverá dinheiro para que o Brasil imediatamente volte aos saudosos tempos das administrações lulistas anteriores. É preciso deixar isso claro. Será a hora de priorizar, no começo da administração, a aplicação de cada centavo no resgate à cidadania trucidada pelos fascistas.
Mas, mesmo com o quadro de penúria de recursos, é possível — além de necessário liminarmente — resgatar do estado medieval em que foram jogadas duas áreas fundamentais para presente e futuro da Nação, a Saúde e a Educação.
Um governo Lula tem a obrigação de salvar o SUS da sanha privativista que o sucateou. A Saúde Pública é o único instrumento de milhões de brasileiros para a preservação da vida. Não pode faltar dinheiro para o setor. A política de desmonte do SUS tem que ser enterrada, seus profissionais dotados de meios e ferramentas para servir à população.
Na Educação, o exército de gafanhotos do fascismo causou estragos que talvez custem muito tempo para serem reparados. É imprescindível que se “limpe a área” imediatamente, Ali também se instalou o atraso, com a reversão de quase todas as iniciativas de inclusão dos governos petistas.
O estado atual de abandono e penúria das instituições públicas é inadmissível. Do ensino básico ao superior o quadro é desolador. Faz-se necessário um choque imediato de recursos e de motivação aos profissionais desesperançados pelos absurdos promovidos pelos ignorantes que se apossaram da Educação.
Enfim, a tarefa não será bem um pouco fácil, ao contrário do que alguns sonhadores pensam. O governo Lula será de reconstrução. Da civilidade e respeito à diversidade, por exemplo.
Para isso não se precisa de muito dinheiro, mas de princípios mínimos que combatam as trevas. As mulheres, os negros, os indígenas devem ter em seus órgãos governamentais de proteção pessoas comprometidas com inclusão e reparação, o que certamente Lula fará. O passado o credencia.
A tarefa, no conjunto, será muito mais difícil do que a de 2003, quando Lula subiu a rampa do Palácio pela primeira vez. Não nos iludamos. O Brasil andou décadas para trás com as insanidades de Bolsonaro.
Restituir a civilidade e combater a fome não é pouco, longe disso, aliás. E Lula é o indicado para que o Brasil comece a voltar a tomar o caminho que queremos.
Foto: Ricardo Stuckert