O Rio de Janeiro e o terror como cotidiano

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Por Alexandre Cosleipublicado no Jornal GGN – 

Em qualquer região civilizada do mundo, o que ocorreu no sábado (27/01/2018) na Tijuca, bairro da zona norte carioca, seria considerado um ato inequívoco de terrorismo. Bandidos atirando com fuzis contra policiais que os perseguiam e na direção de um bar com grande movimento de clientes. Tudo isso durante o desfile de um bloco carnavalesco, a dez metros de um posto de gasolina, o que poderia ter culminado numa grande explosão. Um morto (um garçom de 24 anos) e diversos feridos contabilizados. O que representaria um chocante evento de terrorismo em alguns países, aqui é violência cotidiana.

Há diversas áreas conflagradas, proibitivas ao ir e vir, locais de conflitos armados diários e arrastões previsíveis. Guadalupe, Jacarezinho, Manguinhos, Estrada Grajaú-Jacarepaguá etc. Explosões de bancos e constantes atividades criminosas que se assemelham ao terrorismo vão ganhando destaque crescente na rotina dos habitantes.




A cada dia é mais difícil setorizar a violência, mesmo que a zona sul da cidade ainda insista na pretensão de se preservar como área nobre, obtendo pela ordem das castas um policiamento mais ostensivo e atuante. Os bárbaros avançam sobre a abastada elite, não irão perdoá-la nem a deixar de fora.

O Rio sempre padeceu com surtos de violência. O bairro da Tijuca, em particular, ilha de prosperidade fora das zonas privilegiadas, é um dos termômetros sensíveis, cercada de favelas dominadas por marginais que oprimem moradores e o perímetro onde se localizam.

Em paralelo ao domínio do mal, há uma Polícia Militar que se formou no século 19, com gente que combatia revolta de escravos e insurreições populares. Permaneceu como instituição velha, apesar da recente renovação recente da tropa. Carcomida por dentro, é incapaz de proteger seus próprios soldados, que estão sendo executados às centenas, diuturnamente, pelo crime organizado e avulso. Também se tornaram vítimas da atual onda de carnificina que nos assola.

Basta uma observação empírica para constatarmos que o tráfico de drogas é composto, prioritariamente, por jovens sem acesso a tal meritocracia. Eles são seduzidos pelo irresistível apelo do consumo material, enxergam no tráfico e nos traficantes a única possibilidade concreta de alcançarem status, respeito e dinheiro. No percurso, desprezam a ameaça de uma existência abreviada pela prisão ou pela morte. Afrontam o sistema porque odeiam o sistema que lhes reservou um único destino, caso ousem provar de uma vida para qual não obtiveram direito justo.

Dentre seus governantes, o Rio talvez tenha sido compreendido somente por dois personagens históricos: Brizola e Darcy Ribeiro. Transformaram em realidade o projeto dos CIEPs, centros de educação de horário integral que acolhiam e atendiam crianças das comunidades desfavorecidas. Aliando educação, esporte, saúde e alimentação, os CIEPs pretendiam formar cidadãos dignos, presenteá-los com novos horizontes e perspectivas. Um projeto que atravessou as décadas de 80 e 90, para, em seguida, ser desmontado pelo governo do Moreira Franco. Nunca mais foi retomado, o resultado do desprezo por programas civilizatórios como esse nós vemos agora: o caos.

A última notícia do jornal O Globo informa que milicianos e traficantes estão se unindo em Santa Cruz, descobriram que é melhor para os lucros de ambos. Evoluem de organizações criminosas para uma única corporação criminosa. O que prova, irrefutavelmente, que as milícias não são grupos de paramilitares contra o crime. Milícia é o apelido de outro grupo de criminosos.

Enquanto isso, a classe média tijucana promete uma mobilização e uma caminhada pela paz saindo de uma praça próxima ao bar da trágica ocorrência do último sábado. Sim, vão pedir o fim da violência. A hipocrisia continua negando a própria conivência e omissão diante das causas e das consequências da barbárie.

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