O Sul é meu Norte: crônica do caos

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Compartilhado de Brasil 247 – 

Rodrigo Vianna escreve sobre como um jornalista da América do Sul cobriria as eleições nos EUA se usasse a mesma “sintaxe discursiva” adotada pela mídia estadunidense ao olhar para a América Latina

Trump discursa em comício de campanha em Omaha, no Estado do Nebraska. 27/10/2020
Trump discursa em comício de campanha em Omaha, no Estado do Nebraska. 27/10/2020 (Foto: REUTERS/Jonathan Ernst)

O regime de Donald Trump ameaça não reconhecer o resultado das eleições presidenciais no maior país da América do Norte.

Grupos motorizados que dão apoio ao regime têm organizado emboscadas nas estradas. Às vésperas da eleição, uma das gangues que atuam no sul e no meio-oeste do país cercou o comboio que levava eleitores de uma facção rival: houve ameaças de tiros.




Observadores internacionais avaliam com preocupação a movimentação de líderes ainda leais a Trump, que circulam pelas ruas armados e usam a Bíblia para justificar um golpe. Há rumores de que o líder populista se isolou no Palácio, e já tem uma aeronave pronta para levá-lo ao exterior se o golpe fracassar. Mas o governo da Hungria nega que Trump possa se exilar em Budapest.

A Embaixada da Bolivia em Washington emitiu há pouco um comunicado recomendando que seus cidadãos evitem circular sozinhos, especialmente nas áreas conflagradas da Pensilvânia e da Carolina do Norte.

O presidente mexicano disse que está pronto para intermediar negociações entre os grupos rivais “democratas” e “republicanos”. Mas já avisou que vai reforçar a segurança nas fronteiras, evitando que facções minoritárias tentem cruzar o muro que separa a América Latina da Nação em crise.

A oposição consentida, que se organiza em torno do desgastado Partido “Democrata”, apresentou como candidato um senador sem grande brilho intelectual, mas que está à frente nas pesquisas.

Quem chega do Hemisfério Sul tem dificuldade para compreender por que o partido rival, de extrema direita, hoje controlado por grupos supremacistas brancos, recebe o nome de “Republicano”. A explicação talvez esteja no sistema político excludente – em que a República sempre foi para poucos…

História

No século XVIII, uma elite escravocrata – mas que gostava de ler autores franceses – criou nessas terras selvagens instituições políticas estranhas: o sistema afastou a massa de cidadãos livres e, claro, mais ainda os descendentes de africanos.

Uma dessas instituições é o famigerado Colégio Eleitoral, que permite a um candidato com menos votos no país acabar escolhido como presidente. Trump chegou ao poder assim, e agora tenta consolidar sua ditadura.

Mesmo após a abolição da Escravatura, a população negra era impedida de votar em muitas regiões – dominadas por seitas de fanáticos brancos que adoram um livro sagrado conhecido como “Bíblia”.

Só na segunda metade do século XX essa nação, que um autor austríaco chegou a definir como “país do futuro”, aprovou o voto para os afroamericanos. Ainda assim, seguiu assombrada pelo passado.

Nas principais cidades do país, vê-se massas de famintos dormindo nas ruas, enquanto os ricos se escondem em suas mansões nos subúrbios. Apesar da crise, muitos preferem acompanhar jogos de basquete e beisebol, em vez de prestar atenção ao debate político.

Análise

O professor Marco Silva, importante “estadunidista” que comanda o Centro de Estudos Brasileiros para o Fomento da Democracia nas Américas (CEBRAFODA), com sede no Rio de Janeiro, prevê a possibilidade de o país do Norte se dividir em três: “a Democracia é fragil nessa Nação rica em recursos naturais, mas onde infelizmente as instituições funcionam sempre de maneira enviesada, favorecendo os interesses de grupos oligárquicos”, diz o professor Silva.

Ele aponta para a possibilidade de surgir um Califado Cristão, controlado pela minoria étnica dos “rednecks”, abrangendo parte do Meio Oeste e do Sul dos Estados Unidos. “Trump pode transferir a capital para o Alabama, adotando a bandeira dos Confederados”, afirma. Na Costa Oeste, seria criado um Estado Laico, com apoio dos japoneses e chineses. E a Costa Leste, com capital em Boston, se transformaria de novo em colônia inglesa.

Ainda que o quadro seja preocupante, Silva pede que os sulamericanos procurem compreender os Estados Unidos “para além do estereótipo de cowboys armados que comem hambúrgueres e matam índios”.

O importante jornalista argentino Pedro Caballero, do Buenos Aires Post, viaja reguarmente para os Estados Unidos. Premiado por reportagens investigativas nos guetos racistas do Missisipi, Caballero diz que a violência faz parte da cultura dos EUA: “é atávico, eles são incapazes de respeitar as regras; mas é um belo país, cheio de belezas naturais que a América do Sul precisa ajudar a preservar”.

Intervenção

A Organização dos Estados Bolivarianos (OEB), com sede em Caracas, divulgou há pouco relatório em que aponta ao menos 387 violações de Direitos HUmanos praticadas pelo regime de Donald Trump nos últimos 4 anos.

A OEB diz que, se o regime não aceitar o resultado das urnas, a única saída pode ser o envio dos capacetes azuis para restaurar a ordem.

Fontes de Washington dizem que o Pentágono aceitaria montar uma Junta Miitar Provisória para atuar em parceria com as tropas de intervenção externa – coordenadas por Venezuela, Cuba e Nicarágua.

O ex-presidente brasileiro Lula da Silva disse que a América do Norte tem “um longo caminho até consolidar suas instituições democráticas”. E se mostrou disposto a intermediar o diálogo entre republicanos moderados e democratas, se o velho senador Biden ganhar a eleição e evitar o esfacelamento do país.

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