Por Carlos Eduardo Alves, para o Bem Blogado –
A gente resiste sempre, grita, denuncia, sabe que o avanço primitivo é mundial, mas se parar para pensar um pouco mais não tem como evitar a desalentadora constatação: entre os ditos países civilizados, o Brasil é hoje medalha de ouro em todo tipo de retrocesso.
Aqui, o golpe parlamentar abriu as portas para o inimaginável até dois anos atrás. Da foice em direitos trabalhistas e previdenciários à desfaçatez de corruptos falsamente combatendo corrupção até a ofensiva de religiosos primitivos e grupos fascistas.
Dois capítulos recentes dão ideia do horror. Primeiro, a tentativa de grupos de extrema direita como o MBL de cercear exposições artísticas e, ao fim e ao cabo, se arvorarem a dizer o que podemos ou não ler, ver ou fazer. Como diria um direitista clássico, Nelson Rodrigues, “hoje os idiotas perderam a modéstia”.
Na sequência, 18 homens, uma brigada que reúne religiosos picaretas e políticos idem, enfiaram de contrabando em PEC que visava proteger direitos de mães trabalhadoras uma inacreditável proibição do aborto até para vítimas de estupro. Se a legislação sobre aborto já era restritiva, trataram de impor uma pena acessória às atingidas por um crime hediondo.
Grupos feministas saíram às ruas na última segunda-feira para dizer não aos que querem legislar sobre o útero alheio. Ao menos em São Paulo, a manifestação foi bem expressiva, com forte presença da juventude. O sucesso deve ser realçado principalmente pela visibilidade nula da convocação do ato por parte dos grandes veículos de comunicação, que no dia preferiram dar destaque à “relevante” dança de José Dirceu na festa de aniversário de sua esposa… Paradoxalmente, é no meio do desastre que surgem alguns sinais do combate possível à retirada de direitos. As feministas, em legítima defesa, e grupos como MTST e MST mostram que há e haverá resistência contra a barbárie,
Enfim, essa avacalhação total do país tomado pela cleptocracia de Temer coloca mais premência para as esquerdas no ano eleitoral de 2018. O que fazer se a candidatura Lula for barrada no tapetão das togas, como parece ser quase inevitável? É possível, sem Lula, obter uma candidatura de frente para barrar o fascista Bolsonaro e o candidato da direita tradicional, seja Alckmin ou Hulk? Em quais pontos uma postulação forte de esquerda pode se unir?
Até agora, existe no PT mais torcida do que razão sobre Lula. Todos os sinais emitidos pelo tribunal recursal de Porto Alegre apontam que haverá uma pressa inédita para dar como inelegível o ex-presidente da República, de nada importando, no caso específico, se existiria ou não fundamento jurídico para a medida. A lógica política da direita segue na mesma direção. O conservadorismo sabe que dificilmente Lula perderia na urna.
É conhecido, e respeitável, o argumento que o PT não pode renunciar à candidatura Lula até para não legitimar o golpe que será a sua impugnação. Mas e se não houver mobilização popular suficiente para assegurar Lula na disputa? Como indagava aquele velho russo, o que fazer? Não existem resposta fácil e uma formula acabada, mas é bom cada vez mais pensar no caso e não ficar se deleitando sobre uma liderança nas pesquisas, que é real e retrata o sentimento popular, mas que tende a não se concretizar, infelizmente.
Outras forças de esquerda como PC do B e PSOl já colocam suas peças no tabuleiro. No caso do PC do B, como lançamento da candidatura Manuela D’Ávila, muito mais para negociar na frente do que para valer, embora fosse legítima a postulação própria. No PSOL, muitos setores enxergam, no fundo, no fundo, que só haverá espaço para a “nova esquerda” quando Lula for sepultado politicamente. E Ciro Gomes, bom de discurso e confuso na forma política, não está sabendo jogar para eventualmente contar com o PT em quadro que exija uma aliança.
Passando a régua, se é verdade que a direita tradicional, que terá que disputar espaço com Bolsonaro para reconquistar eleitores, ainda não tem um nome viável, também é real o dilema nas esquerdas: como e com quem enfrentar o tsunami primitivo se Lula for tirado à força da eleição presidencial de 2018?
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