ESPORTE
Por Claudio Lovato, jornalista e escritor
O velho treinador perdeu o sono. Isso não lhe acontecia havia muito tempo. Tanto tempo que o fato de ter perdido o sono chega a lhe parecer engraçado. E, de fato, ele ri, no escuro, em seu quarto de hotel, no meio da madrugada.
Não, não é nada de mais o que ele e o time vão enfrentar dali a algumas horas. Um jogo de meio de campeonato. Mas o treinador descobre de repente que quer muito vencer aquela partida. Quer porque quer. E não se preocupa em buscar explicações mais profundas sobre essa vontade tão acentuada.
O velho treinador não se levanta, apenas coloca as duas mãos atrás da cabeça, inspira e expira profundamente, os olhos abertos. E ri, silenciosamente. Ri porque ri. Porque acha engraçado sentir o coração acelerado, a adrenalina subindo.
Tem 68 anos. Já ganhou campeonatos nacionais com três times diferentes, já foi a uma Copa com a seleção, já perdeu as contas de quantos estaduais faturou.
O velho treinador vira para o lado na cama. Pensa na esposa, no jeito que ela balança a cabeça para um lado e para o outro e diz: “Você não tem jeito”.
Está feliz. Sente que vive a vida que tinha que viver, que está onde deveria estar – neste exato momento e para sempre (ou até quando se aguentar).
O velho treinador então repassa mentalmente a escalação do time. E visualiza o posicionamento dos jogadores, quando estiverem atacando e quando estiverem defendendo. Visualiza até aquela jogadinha ensaiada que, de repente, pode dar certo.
E o velho treinador por fim volta a dormir. Sorrindo. Acordará feliz, ainda que os velhos vícios da reclamação e da rabugice levem os outros a achar que não.
O velho treinador é o encontro do homem com ele mesmo, unos e indissociáveis, como precisa ser (e como tantos já desistiram de acreditar que é possível).