”O vice de Covas está na condição de investigado no inquérito civil público do MP sobre a máfia das creches”, diz advogado; vídeos

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Por Conceição Lemes, compartilhado de Viomundo – 

As covereadoras (da esquerda para a direita) Dafne Sena, Paula Nunes, Silvia Ferraro, Natalia Chaves e Carolina Iara, da bancada feminista do PSOL, entraram com representação no MPSP contra o vereador Ricardo Nunes, vice de Covas. O advogado  Guilherme Prescott também assina

Quem é Ricardo Nunes, o vice de Covas?

É a pergunta que está na boca de muitos eleitores da cidade de São Paulo, desde que o nome apareceu como vice na chapa de Bruno Covas (PSDB), que disputa a reeleição ao cargo de prefeito da capital.




Curiosidade absolutamente normal.

Afinal, um ilustre desconhecido para a esmagadora maioria dos paulistanos.

Ricardo Nunes (51 anos) é empresário.

Em 2012, elegeu-se vereador pelo MDB para a Câmara paulistana.

Está no seu segundo mandato.

Na sua biografia oficial, no portal da Câmara Municipal, é apresentado como ”empreendedor e empresário de sucesso”.

Nas eleições de 2016, declarou patrimônio de R$4.505.337,23.

A lista de bens inclui terrenos, imóveis, fazendas, um trator, várias aplicações e dinheiro vivo.

O valor aplicado por ele mesmo em sua própria campanha beirou o teto dos 10% das posses com um investimento de R$ 450 mil.

Seu reduto político é a Zona Sul da capital, onde construiu a sua biografia, tendo como uma das bandeiras a expansão das creches no município.

No portal da Câmara, é apresentado também como um filantropo:

Como voluntário Ricardo Nunes é colaborador em diversas entidades. A SOBEI (Associação Beneficente de Interlagos) é uma delas, por exemplo. A entidade, que é sem fins lucrativos, atende mais de quatro mil crianças.

Surfa de braçada na onda conservadora.

Integra a “bancada da Bíblia” na Câmara Municipal, faz campanha aberta contra os direitos das mulheres, das LGBTQIA+, à educação sexual e igualdade de gênero nas escolas.

Nos últimos dias, porém, um lado nada cristão de Ricardo Nunes tem emergido das páginas policiais.

Em 18 de fevereiro de 2011, a esposa Regina Carnovale denunciou-o por violência doméstica, ameaça e injúria na 6ª Delegacia da Mulher, em Santo Amaro (Zona Sul da capital)

O boletim dessa ocorrência policial foi revelado pela Folha.

Porém, nessa quinta-feira, 26/11, em entrevista ao Estadão, Regina negou ter sido sido agredida pelo marido e deu nova versão ao BO.

Ao lado do marido, ela disse:

“Não me lembro de feito aquele boletim de ocorrência. Não sei se apagou da minha memória porque eu estava muito nervosa.

“Mas eu não me recordo de ter ido até a delegacia fazer um B.O. contra ele. Se eu tivesse ido até uma delegacia, eu iria lembrar do delegado, de quem me atendeu, enfim”.

Não é a única notícia policial que tem tirado o sono da equipe de campanha de Bruno Covas.

Ricardo Nunes é alvo de várias outras denúncias, entre as quais irregularidades envolvendo creches conveniadas.

Embora tenha ganho mais repercussão agora, reportagens da Folha de 2019 denunciaram o caso, que ficou conhecido como a “máfia das creches”.

Em setembro de 2019, o Ministério Público do Estado de São Paulo (MPSP) instaurou um inquérito civil público para apurar as denúncias.

Uma representação havia chegado à Promotoria do Patrimônio Público e Social do MPSP e ela foi distribuída ao promotor José Carlos Blat.

Na reportagem Promotoria apura irregularidades e elos políticos em creches terceirizadas, publicada na Folha em 16 de setembro de 2019, o repórter Artur Rodrigues entrevistou Blat que lhe disse:

“Trata-se de um caso grave. A polícia adotou medidas na esfera criminal. Recebemos outras denúncias que levam a crer que em São Paulo há uma máfia das creches”.

Na mesma matéria, o repórter observa (os negritos abaixo são nossos):

“O promotor José Carlos Blat, da Promotoria do Patrimônio Público, ampliou o escopo de investigação a partir de novas informações sobre o assunto na esfera não criminal.

As entidades administradoras de creches investigadas criminalmente são as associações Águas Marinhas, Criança de Deus, Mulheres da Cidade Tiradentes e Casa da Mulher da Cidade Tiradentes.

A máfia das creches é suspeita de crimes como apropriação indébita, peculato, formação de quadrilha, ocultação de patrimônio e até de desviar comida das crianças.

O promotor vai apurar suspeitas de desvio do dinheiro enviado pela prefeitura para aluguéis e comida por meio de empresas de fachada e ligadas a pessoas das próprias gestoras das creches.

Outro ponto que deve ser apurado pela Promotoria é o grau de proximidade dessas organizações sociais e alguns vereadores da capital.

As ligações políticas das entidades com vereadores foram incluídas em representação anônima de centenas de páginas e com farta documentação enviada à Promotoria, cujas informações citadas nesta reportagem foram confirmadas pela Folha.

O inquérito aberto também cita reportagem da Folha, noticiando operação policial.

Nomeados na representação, dois vereadores da zona sul, Ricardo Nunes (MDB) e Rodrigo Goulart (PSD), por exemplo, são muito próximos da Sobei (Sociedade Beneficente de Interlagos).

Trata-se da maior organização social gestora de creches da cidade, com unidades que atendem 5.000 alunos.

Nunes é ex-conselheiro da entidade e hoje atua como voluntário.

Já nomeou para seu gabinete ao menos três membros da direção da Sobei —um deles, Reinaldo Tacconi, continua lá até hoje.

Os promotores vão investigar preços de aluguéis de imóveis que sediam creches, uma vez que parcela deles apresentava superfaturamento”.

AS PERGUNTAS DO VIOMUNDO AO PROMOTOR DO CASO

Já se passaram 14 meses, desde que o MPSP instaurou o inquérito civil público para apurar as possíveis irregularidades nas creches.

De lá cá, aparentemente nada comunicou sobre o andamento do inquérito.

Diante disso, via assessoria de imprensa do MPSP, o Viomundo perguntou ao promotor José Carlos Blat:

1) Essa investigação aberta está paralisada ou já foi concluída?

2) Se não está paralisada, qual a conclusão do inquérito civil público?

3) Que medidas foram tomadas desde então em relação à ‘máfia das creches’?

4) Há algum procedimento em andamento em relação à ‘máfia das creches’?

5) A que conclusão o senhor chegou em relação ao vereador Ricardo Nunes? Ele faz parte do esquema?

6) Em 21 de outubro de 2020, a bancada feminista do Psol na Câmara dos Vereadores entrou com uma representação no MPSP em relação à participação do vereador Ricardo Nunes na máfia das creches.

O senhor vai juntar essa representação ao inquérito civil existente desde 2019? O que pretende fazer?

7) Com base nas suas investigações, está convencido de que há mesmo uma máfia das creches em São Paulo?

Blat não respondeu objetivamente as nossas questões.

Disse que prefere não se manifestar sobre o caso em andamento e diligências pendentes.

E pediu para que nos fosse encaminhada a última manifestação da Promotoria de Justiça do Patrimônio Público no caso.

Solicitamos a íntegra do inquérito para consulta, não foi possível: “Está com o doutor Blat no momento’’, disse-nos a assessoria de imprensa.

A última manifestação do MPSP no caso é um relatório de sete páginas, datado de 21 de setembro de 2020 (na íntegra, ao final).

O promotor Blat é que assina.

O relatório revela um dado que desconhecíamos: o inquérito foi instaurado a partir de representação anônima entregue em atendimento ao público na Promotoria do Patrimônio Público.

Depois, a ela foram acrescidas outras manifestações, entre as quais reportagem da Folha, de 13 de setembro de 2019.

 

Na sequência, há um resumo das manifestações dos nomes suspeitos  de envolvimento em possíveis irregularidades.

Todos negam malfeitos. Garantem que tudo foi feito com a maior lisura.

Viomundo, via assessora de imprensa do vereador Nunes, perguntou-lhe:

Nos últimos tempos tem saído várias reportagens, ligando-o à máfia das creches. As denúncias são de que teria obtido benefícios financeiros. O que tem a dizer a respeito delas?

Ela não respondeu.

Pediu que encaminhássemos a nossa demanda à assessora de imprensa da campanha de Bruno Covas.

O que fizemos prontamente, acrescentando uma segunda pergunta: Por que está se escondendo da imprensa, deixando a Bruno Covas a tarefa de responder os questionamentos sobre o senhor?

A assessora de imprensa da campanha de  Bruno Covas também não respondeu.

Entrevistado no programa Roda Viva, da TV Cultura, Covas foi questionado pelo jornalista Pedro Dias Leite, da rádio CBN (vídeo abaixo).

Sobre a violência contra a mulher de Ricardo Nunes, Covas disse:

”Não há sequer denúncia de agressão envolvendo o vereador Ricardo Nunes”.

(…)

“Infelizmente, nós estamos num país em que as pessoas gostam de lacrar e acabar com o currículo dos outros”

(…)

Em relação às creches a mesma coisa. Todos os contratos que a gente tem hoje na Prefeitura, envolvendo entidades que ele conhece, tiveram o aluguel majorados para baixo durante a nossa gestão”. 

MP PRORROGA INQUÉRITO E DETERMINA INVESTIGAÇÃO

Só que, diferentemente do que pode fazer supor a declaração do prefeito Bruno Covas, o inquérito civil não foi concluído ainda.

Devido à necessidade de mais deligências, em 21 de setembro de 2020, o promotor José Carlos Blat prorrogou por mais um ano o prazo para a conclusão dele.

No mesmo ato, determinou a investigação em vários órgãos dos nomes suspeitos que aparecem no inquérito civil público.

Ricardo Nunes, o vice de Covas, é um deles.

“Apesar do silêncio do MP, o Viomundo obteve uma informação importante: Ricardo Nunes, o vice de Covas, está na condição de investigado no inquérito civil público”, atenta o advogado Guilherme Prescott Monaco.

“E, diante do que já é público, Nunes deve ser denunciado, sim, à justiça”, acrescenta. “A população de São Paulo tem direito de saber o envolvimento dele na máfia das creches.”

“AS FEMINISTAS VÃO ACABAR COM A MÁFIA DAS CRECHES”

Guilherme Prescott é advogado da bancada feminista do PSOL na Câmara Municipal.

Em 21 de outubro de 2020, como dissémos um pouco atrás, a bancada entrou com uma representação no MP contra Ricardo Nunes.

É dela que tratamos na sexta pergunta ao promotor José Carlos Blat, que até o momento não se manifestou a representação.

A bancada feminista do PSOL é um mandato coletivo eleito no primeiro turno das eleições de 2020.

Assinam a representação as covereadoras Dafne Sena, Paula Nunes, Silvia Ferraro, Natalia Chaves e Carolina Iara e o advogado Guilherme Prescott.

Na representação de 13 páginas (na íntegra, ao final),  justificam:

Nós da Bancada Feminista do PSOL protocolamos uma representação no Ministério Público Estadual solicitando a investigação de possíveis benefícios a Ricardo Nunes na “máfia das creches”, além de informações sobre inquérito já aberto em 2019 referente ao caso. Se forem confirmadas as relações do vice de Covas com esse esquema, a chapa do tucano precisa se tornar inelegível.

O vídeo abaixo foi gravado em frente ao MPSP, em 21 de outubro de 2020, logo após a bancada protocolar a representação.

“As feministas vão acabar com a máfia das creches”, elas prometem

 

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