Por Bibiana Maia, Projeto Colabora –
Alunos do Pedro II saem do colégio para prestar o exame, mas voltam para continuar o protesto e reclamam da falta de diálogo com o governo
Nara, de 16 anos, estava exausta ao retornar ao Colégio Pedro II, no Humaitá, ontem. Ela deixou a ocupação na escola duas vezes, neste fim de semana, para prestar o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), no bairro vizinho, Botafogo. “Foi muito cansativo. No final, sentia que estava há três dias ali”, brinca.
O campus ao qual Nara voltou para descansar está ocupado há uma semana, seguindo a onda que começou há cerca de um mês no Paraná. Os números nacionais são incertos. Os paranaenses chegaram a ocupar 850 unidades. Estima-se que, com o avanço para outros estados como Rio, São Paulo e Minas Gerais, o total de escolas ocupadas tenha passado de mil. Em terras fluminenses, os estudantes tomaram três campi do CPII e quatro do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro (IFRJ).
A participação no movimento afetou os estudos de Nara. “Eu dei uma diminuída, mas estou contando com os aulões que vamos ter na semana que vem”, conta referindo-se às atividades ministradas por voluntários e pelos próprios alunos.
Os estudantes protestam contra a PEC 241/55, que estabelece um teto para o aumento dos gastos públicas; a Medida Provisória que reforma o currículo do ensino médio; e o projeto Escola Sem Partido. Eles também criticam a postura do governo sobre a aplicação do Enem. O Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) chegou a informar que as provas deixariam de ser aplicadas em 405 escolas e universidades do país, por causa do movimento, e que 271.033 estudantes teriam que adiar o exame para os dias 3 e 4 de dezembro. O órgão, no entanto, admitiu ontem que errou e que tinha incluído na lista escolas onde o Enem acabou sendo realizado.
“Foi uma falta de diálogo muito grande do MEC. Não custava nada tentar chegar a um consenso que ficasse ok para os dois lados”, opina a adolescente. Na avaliação do grupo, essa foi uma tática do governo para diminuir a força do movimento. “É uma galera tão pequena que vai refazer, diante dos milhões que prestaram o exame… Foi só para jogar contra os estudantes mesmo. Várias escolas ocupadas foram usadas nas eleições, porque teve como dialogar”, completa Isaac Galvão, de 18 anos.
Um ano após as primeiras ocupações, que aconteceram em São Paulo, os alunos do Pedro II parecem bem organizados e cientes da melhor forma de gerir o espaço. Eles se dividem em cinco comissões: eventos, comida, limpeza, segurança e infraestrutura, e comunicação, grupo que atende a imprensa, por exemplo. Para entrar, é preciso autorização dos estudantes e ter o nome registrado em um caderno, na entrada. Por todos os lados, se vê alguém com latas de tinta. “A gente conseguiu melhorar um problema de infiltração na biblioteca e estamos redecorando a escola, pintando as portas, vamos replantar os canteiros. Tentamos deixar a escola mais bonita”, conta Isaac.
Além de lutar por melhores condições da escola, os estudantes reivindicam boa remuneração para professores e terceirizados, e autonomia pedagógica. Membro da comissão de comunicação, Isaac diz que eles estão conseguindo administrar bem as doações e que, além dos pais, moradores do bairro estão ajudando. São cerca de 200 pessoas circulando por dia na escola, mas apenas metade delas fica para dormir. O único susto foi uma tentativa de invasão no último sábado, por volta das 2h da manhã. “Sete pessoas mascaradas passaram aqui na frente e tentaram pular o portão da frente, depois o da garagem, mas viram que percebemos. Era uma galera jovem. A gente acredita que possa ser gente do desocupa (movimento de estudantes contrários à ocupação de escolas)”.