Por Wilson Roberto Vieira Ferreira, publicado em Jornal GGN –
Típica operação militar de guerra híbrida para criar a Conspiração Perfeita: protestos no Chile, virada à esquerda argentina, Lula solto, Globo sacaneando, “PSL traindo”, ecoterrorismo de ONGs no Nordeste. Códigos para a criação do cenário perfeito para um golpe dentro do golpe.
O timing de uma sequência narrativa análoga às ficcionais: a perfeita marcação de cena dos atores, um teaser, o thriller, a live action e, no final, a “escada” perfeita do ator coadjuvante para o sucesso final do esquete… Estamos falando do timing da sequência desses eventos: o vídeo das hienas inimigas simbólicas do Rei Leão Bolsonaro seguida pelo depoimento-bomba do porteiro do condomínio do presidente no JN da Globo, a live action paródia de Bruno Ganz no filme “A Queda” perpetrada por um presidente indignado na Arábia, finalizado pelo rabo entre as pernas da Globo em respostas protocolares. A denúncia-escada do JN não passou de um conjunto de ilações, a participação numa operação psicológica ao estilo de uma “false flag” típica das agências de inteligência – “Operação bandeira falsa” ou “inside job”, espécie de auto-terrorismo onde atentados são criados pelo próprio Estado para justificar uma agenda política. Típica operação militar de guerra híbrida para criar a Conspiração Perfeita: protestos no Chile, virada à esquerda argentina, Lula solto, Globo sacaneando, “PSL traindo”, ecoterrorismo de ONGs no Nordeste. Códigos para a criação do cenário perfeito para um golpe dentro do golpe.
O chamado “escada” é aquele ator que auxilia o seu parceiro de cena a atingir um sentido inesperado na interação. Embora muitas vezes visto como “sem graça”, esse ator é fundamental para a construção do risível nos esquetes de humor. Nesse sentido relacional, o humor é uma questão de timing, o tempo certo para a “deixa” para, através dela, a “punch line” da piada dar certa.
Acompanhamos nesses últimos dias os desdobramentos de um cenário político com a perfeita marcação de cena dos atores, teaser, live action e, no final, o “escada” perfeito para o sucesso final do esquete, no caso de humor negro – o papel de “escada” desempenhado pelo personagem mais sem graça e odiado por todos os lados: a TV Globo.
Óleo invadindo as praias do Nordeste; manifestações e protestos violentos explodindo no Equador e Santiago; a vitória eleitoral das esquerdas na Argentina; crise na Bolívia com a vitória de Evo Morales no primeiro turno; Bolsonaro vagando perdido pela Ásia e Arábia entre a gafe de não ter levado um tradutor; franqueando para turistas entrada no Brasil sem vistos e promessas e acordos genéricos de negócios. Tudo sob o mantra: “o Brasil é um país de oportunidades”, como fosse um feirante desesperado na xepa.
Até o momento em que Carlos Bolsonaro tuitou no perfil do pai um vídeo toscamente editado e metaforicamente primário sobre um Leão assediado por hienas simbolizando os inimigos que tentam derrubar Bolsonaro – PT, STF, PSL e por ai vai…
Globo é o “escada”
Foi o teaser para a entrada de cena do “escada” perfeito: a TV Globo e a câmara de eco do Jornal Nacional – a denúncia de que o assassino de Marielle esteve no condomínio de Bolsonaro na Barra da Tijuca/RJ no dia do crime. E interfonado para a casa do presidente pedindo autorização para entrada.
JN levantou a bola para Bolsonaro dar a cortada final: uma live na Internet em plena madrugada na Arábia numa performance paródia da clássica sequência do ator Bruno Ganz no filme A Queda: cólera e descontrole bem controlados que, por sua vez, ofereceram ganchos para a contemporização cínica da Globo na edição seguinte do telejornal.
Praticamente, a explosão de Bolsonaro foi uma espécie de live action do teaser-pastiche anterior com ares de National Geographic.
Foram lances de uma guerra criptografada (e dessa vez bem coreografada e complexa) numa articulação perfeita de elementos cênicos: o contexto (o suposto contra-ataque do Foro de São Paulo na América Latina somado ao ecoterrorismo de ONGs como o Green Peace), o trailer-teaser de Carluxo, a “escada” da “denúncia” da Globo (que apenas retro-alimentou o plot do leão encurralado por hienas) e o thriller do desfecho (a paródia de Bruno Ganz), com direito a uma espécie de making of da própria Globo tentando justificar como a matéria do JN foi jornalisticamente “equilibrada” e “séria”.
A denúncia-escada do JN não passou de um conjunto de ilações, uma operação psicológica ao estilo de uma “false flag” típica das agências de inteligência – “Operação bandeira falsa” ou “inside job”, espécie de auto-terrorismo onde atentados são criados pelo próprio Estado para justificar uma agenda política.
Objetivos da Psyop
Uma operação psicológica (psyop) com três objetivos bem definidos:
(a) A performance à la Bruno Ganz de Bolsonaro tenta se conectar ao nacionalismo do suicídio de Getúlio Vargas e o imaginário de um presidente morto supostamente por interesses anti-patrióticos;
(b) Roubar das esquerdas a pauta anti-Globo. Mesmo sabendo-se que essa matéria do JN foi apenas um estalo perto das denúncias feitas, em um passado recente, diariamente contra Lula, tendo ao fundo dos apresentadores do telejornal a indefectível imagem do oleoduto jorrando dinheiro;
(c) Reação às eleições argentinas e comprometedores protestos anti-neoliberalismo no Chile e Equador. Enquanto o capital estrangeiro começa a fugir do País no momento em que a ficha cai diante da real conjuntura, a Globo News tenta criar uma bolha de euforia nos mercados financeiros que supostamente contaminaria indústria, comércio, empreendedores, startups etc. O mercado estaria eufórico com as “reformas”.
Portanto, nada melhor que uma vasta psyop para o País virar às costas para o Mercosul.
Como fenômeno de bolha, deverá durar poucos meses. Bolsonaro e seu clã sabem disso. E sabem também que só estão no poder para criarem a terra arrasada perfeita para a implementação a fórceps da agenda neoliberal – é a conhecida “tática vidraça quebrada” – clique aqui.
Por isso, o próximo e mais sombrio objetivo;
(d) A criação da conspiração perfeita! Com essa psyop de larga escala, criar a sensação crescente de alguma bomba prestes a explodir, um sentimento que todos os vetores do cenário estão acelerando para algum tipo de caos. “O cabaré está pegando fogo!”, é o que mais ouço no atual cinismo esclarecido ou autoconsciente das pessoas no cotidiano. Basta uma faísca, como no Chile.
Daí o sentido da críptica frase de Bolsonaro sobre a crise chilena: “eles estavam preparados…”, num elogio à repressão policial e militar daquele país.
Tática do vazamento na Guerra Híbrida
Delírio conspiratório?
Para responder essa pergunta, devemos entender que estamos diante de um governo militar que põe em prática táticas de guerra por meios não convencionais – a chamada guerra híbrida. Vazamentos propositais como a desse porteiro sem nome e sem rosto, prontamente desmentida pelo Mistério Público do Rio de Janeiro (cuja informação cinicamente a Globo diz que somente teve após o fechamento da matéria do JN), é típico modus operandi militar das psyops de uma guerra híbrida. A Globo supostamente cometeu o “erro” de não checar a informação com a própria figura misteriosa do “porteiro”.
Divulgou uma reportagem sem mostrar nada, a não ser dizer que naquele horário Bolsonaro estava em Brasília. Na verdade, a Globo criou uma ilação, uma simulação de denúncia sensacional.
O diálogo Bolsonaro/Globo
A live da Arábia do presidente apenas criou deixas oportunas para a Globo responder no dia seguinte em rede nacional.
Se o velho Leonel Brizola dizia, com todas as letras, que “a partir do primeiro dia, da primeira hora como presidente acabarei com o monopólio da Globo”, a indignação estudada do ex-capitão foi muitos tons abaixo disso: “O processo de concessão não será perseguição, mas o processo tem que tá enxuto, legal, não vai ter jeitinho pra vocês”.