Os ”delinquentes” do Rio

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Brizola pensou uma escola de tempo integral, ensino, saúde, esporte, cultura e arte. Alimentação e cuidados de higiene.

Por José do Vale Pinheiro Feitosa*, compartilhado de Viomundo




na foto: Leonel Brizola, governador do Rio de Janeiro por dois mandados, acreditava que pela educação se pode transformar uma sociedade desigual, como a brasileira. Daí, o ousado projeto dos CIEPS, implantado no seu governo e destruído politicamente pela Globo. Na foto à direita, Darcy Ribeiro, Brizola, Oscar Niemeyer e Jamil Haddad conversam sobre o projeto

Uma escola para formar uma nova sociedade, menos desigual, com oportunidades iguais, o que necessariamente implicaria aumentar a economia do Rio por maior distribuição da renda em todas as classes e territórios.

Recebeu forte oposição da elite carioca, especialmente da Zona Sul e da Copacabana “lacerdista”, um tipo bolsonarismo do século 20.

Brizola foi atacado, principalmente por ter dado passos importantes para mudar uma sociedade desigual, com classes privilegiadas.

Brizola acreditava que, por meio da educação, se pode transformar essa sociedade desigual.

A Rede Globo,  porta-voz do atraso, não queria isso.  E tornou Brizola o inimigo central da elite nacional (trabalho, aliás, iniciado anos antes com a participação dos Diários Associados).

Levou ao ar matérias tendenciosas, explorou as contradições de uma sociedade desigual como se Brizola fosse, por  exemplo, a causa da miséria da Baixada Fluminense e das favelas. Como se a violência urbana fosse culpa dele que nem havia chegado à metade do mandato de 4 anos.

A Globo “plantou” na sociedade uma comunicação tendenciosa e de psicologia social para rejeitar os chamados CIEPs, a escola de tempo integral com prédios da arquitetura de Oscar Niemeyer.

O programa de ensino integral dos CIEPs aplicava a pedagogia criadora de consciência livre, usava materiais de ensino de qualidade. Todas as atividades de ensino, saúde, cultura e esporte tinham grades evolutiva, conforme o desenvolvimento das crianças.

O programa de Brizola-Darcy tinha até editora própria para fazer materiais e estúdios para produção de filmes de ensino.

Bem, nas eleições de 1986, Darcy Ribeiro, mentor do programa e candidato de Brizola, foi derrotado na avalanche do Plano Cruzado que elegeu o PMDB, de cabo a rabo.

O Rio de Janeiro elegeu o facínora Moreira Franco, cujo primeiro ato foi acabar com os CIEPs, para agradar a elite.

Vale lembrar que a própria corporação dos professores foi contaminada pela propaganda reacionária e realizou movimentos contra o ensino integral.

Em 1990, Brizola retornou ao governo do Rio. Uma reparação do povo à sua luta.

Um ano antes, na eleição presidencial de 1989, ele ficou em terceiro lugar no primeiro turno. No segundo, apoiou Lula contra Collor de Mello, que foi o vencedor.

No segundo mandato como governador do Rio, Brizola ampliou o programa de construção, melhoria do equipamento de produção de materiais, qualificação didática e pedagógica e os CIEPs voltaram à agenda de Governo.

A Globo aumentou ainda mais ataques aos CIEPs nos noticiários, divulgando informações inverídicas.

O discurso era que tais escolas eram caras e o povo não precisaria delas.

Incutiu na sociedade a ideia mentirosa de que os CIEPs eram escolas para marginais, só pobres as frequentariam e, por isso, eram de má qualidade.

Não satisfeita, a Globo foi além.

No último andar de cada CIEP tinha um apartamento. A ideia era abrigar nele uma família de policiais, especialmente bombeiros, que pudesse cuidar de crianças que viviam nas ruas para que se tornassem alunas.

Foi a pedra de toque da campanha insidiosa, associando a marginalidade como uma corrupção humana absoluta, excluindo toda a realidade social. Pura maldade e reacionarismo.

Uma enorme mentira política e factual, mas que conseguiu contaminar até a população que se beneficiaria do programa.

O alerta nos chegou numa conversa com o jornalista José Augusto Ribeiro, grande quadro do jornalismo brasileiro, que chefiava o núcleo televisivo do programa dos CIEPs.

Ele nos disse que se plantara no povo a ideia que os CIEPs eram escola para marginais e pobres e ninguém queria se classificar como tal.

A derrota do povo do Rio de Janeiro e, por tabela, do Brasil, foi perfeitamente representada numa conversa em que estavam Hésio Cordeiro, reitor da UERJ, Tatiana Memória, grande diretora do programa dos CIEPs, Darcy Ribeiro, seu criador, executivo e então vice-governador, e eu.

Darcy até cobrou da Tatiana Memória o que fazer. Mas nos disse claramente que entendia que o povo do Rio não iria lutar pelo legado dos CIEPS.

A Globo, via sua comunicação criminosa e elitista, havia destruído politicamente o programa dos CIEPs.

A elite nacional não queria mudar o Brasil naquela época, assim como não quer até hoje.

Curiosamente, a classe média da Zona Sul e Barra da Tijuca, que votou maciçamente em Bolsonaro, atualmente se apavora com as “gangues” de moradores de rua apinhados nas calçadas.

Nos últimos anos, houve um aumento brutal de gente nessa situação. São pessoas que perderam o emprego, o sustento da família.

Não são bandidos. Por isso, gangues entre aspas, ou seja, ”gangues”

É contra esses ”delinquentes” que a classe média insensível do Rio pede a violência do Estado.

Há formas de violência. Elas nem sempre são físicas de face.

O certo é que, com o tempo, ela destrói futuro e diminui esperança de vida ao nascer.

*José do Vale Pinheiro Feitosa é médico sanitarista

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