Por Eduardo Guimarães, do Blog da Cidadania –
Ao menos este blogueiro não se surpreendeu em nada com o “editorial” publicado neste domingo (3 de abril) pelo (ainda) principal tentáculo da família Frias, o jornal Folha de São Paulo. O texto “decreta” que a presidente Dilma Rousseff reununcie ao mandato concedido pela maioria dos brasileiros em 2014.
Por que seria diferente? O conceito de democracia da Folha ficou bem expresso em outro editorial que esse veículo publicou em 2009 e que emitiu outro “decreto”, o de que a ditadura militar brasileira não foi dura, foi branda, uma “ditabranda”.
Sabe por que, leitor? Porque, segundo a família Frias, a ditadura brasileira matou “pouca” gente em comparação com o que mataram as ditaduras militares argentina e chilena.
Confesso que, em 2009, fiquei surpreso com a Folha. Tão surpreso que, através deste Blog, convoquei leitores paulistanos a irem comigo para diante do jornal para protestar contra aquela barbaridade.
A Folha de São Paulo foi obrigada a registrar um ato que, diferentemente do que diz o jornal, reuniu mais de 500 pessoas na Barão de Limeira, entre estudantes, sindicalistas, vítimas de ditadura, políticos e demais cidadãos indignados com aquela tese aviltante à memória de tantos quantos lutaram contra a ditadura.
Era falta de informação da minha parte me surpreender com os “editoriais” da Folha. Eu sabia que o jornal tinha apoiado a ditadura, mas só fui entender direito qual o nível de desprezo da família Frias pela democracia quando, após o editorial e a manjifestação que convoquei contra a “ditabranda” inventada pelo jornal, começaram a surgir livros, artigos e estudos sobre a atuação do veículo naquele período e, mais do que isso, sobre a natureza de seu fundador.
Vamos jogar um pouco de luz sobre o fundador da Folha.
O homem fardado e a declaração proferida por ele que o leitor pode conferir na foto no alto desta página correspondem a Otávio Frias de Oliveira, o falecido fundador do jornal Folha de São Paulo.
Imagem e palavras pertencem a momentos distintos de sua vida. Todavia, unidas explicam por que seus herdeiros foram resgatar em arquivos dos órgãos de repressão da ditadura militar as desculpas usadas por esta para prender e torturar Dilma Vana Rousseff, a presidente eleita do Brasil.
Vendo, porém, o perfil do fundador da Folha, entede-se tudo.
Frias de Oliveira lutou na Revolução Constitucionalista de 1932, que tentou dar um golpe de Estado contra Getúlio Vargas. Coerente com seu apreço pelo militarismo e pela derrubada de governos dos quais não gostava, apoiou o golpe militar de 1964.
Naquele período, a Folha de São Paulo serviu de voz e pernas para os ditadores que se sucederiam no poder ao exaltá-los e ao transportar para eles seus presos políticos até os centros de tortura do regime.
No dia 21 de setembro de 1971, a Ação Libertadora Nacional (ALN) incendiou camionetes da Folha que eram utilizadas para entregar jornais. Os responsáveis acusavam o dono do jornal de emprestar os veículos para transporte de presos políticos. Frias de Oliveira respondeu ao atentado publicando um editorial na primeira página no dia seguinte, sob o título “Banditismo”.
Eis um trecho do texto:
“Os ataques do terrorismo não alterarão a nossa linha de conduta. Como o pior cego é o que não quer ver, o pior do terrorismo é não compreender que no Brasil não há lugar para ele. Nunca houve. E de maneira especial não há hoje, quando um governo sério, responsável, respeitável e com indiscutível apoio popular está levando o Brasil pelos seguros caminhos do desenvolvimento com justiça social-realidade que nenhum brasileiro lúcido pode negar, e que o mundo todo reconhece e proclama. […] Um país, enfim, de onde a subversão -que se alimenta do ódio e cultiva a violência – está sendo definitivamente erradicada, com o decidido apoio do povo e da imprensa, que reflete os sentimentos deste. Essa mesma imprensa que os remanescentes do terror querem golpear.”
O editorial “Banditismo” foi publicado em 22 de setembro de 1971. Foi escrito por Octavio Frias de Oliveira, fundador da Folha de São Paulo.
O presidente da República de então era Emílio Garrastazu Médici. Nomeado presidente pelos militares, comandou o período mais duro da ditadura militar. Foi a época do auge das prisões, torturas e assassinatos de militantes políticos de esquerda pelo regime.
Apesar dos elogios de Frias de Oliveira à ditadura, segundo a Fundação Getúlio Vargas foi no governo Médici que a miséria e a concentração de renda ganharam impulso. O Brasil teve o 9º Produto Nacional Bruto do mundo no período, mas em desnutrição perdia apenas para Índia, Indonésia, Bangladesh, Paquistão e Filipinas.
O jornal que escreveu esse “editorial” infame pedindo a cassação de 54 milhões de votos com base em manifestações de rua e na índole golpista da imprensa e da oposição se coaduna à perfeição com a natureza do homem que fundou essa pocilga que alguns chamam de “jornal”.