Os jogos no mercado sempre são na véspera. Especula-se no boato e se assenta no fato.
Durante meses o mercado especulou em torno das eleições. Se as pesquisas apontavam Dilma na frente, vendiam-se ações e compravam-se dólares. Se Aécio (ou Marina) na frente, compravam-se ações e vendiam-se dólares.
Qual a fundamentação desses movimentos? Nenhuma. Fosse quem fosse o eleito, a política econômica seria muito semelhante, em função das restrições econômicas, fiscais e políticas.
Eleita Dilma, no primeiro dia a Bolsa caiu, independentemente de seu discurso de vitória; no segundo dia a Bolsa subiu, independentemente das suas declarações sobre o próximo governo.
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Esse mesmo movimento se manifestou em torno da decisão do FED (o Banco Central norte-americano) de injetar liquidez na economia, através do resgate dos títulos públicos no vencimento. Durante longo período, a cada rodada do FED o mercado especulava sobre o dia em que acabariam os resgates, haveria um aumento dos juros internos nos EUA atraindo dólares do mundo inteiro e provocando terremotos nos países mais vulneráveis – como o Brasil.
Ontem, o FED anunciou o fim das injeções de liquidez. E o dólar caiu no mercado brasileiro. A Bolsa também caiu mas por razões que nada tiveram a ver com o mercado internacional.
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Esses movimentos de mercado – de especular no boato e realizar no fato – acabaram enredando o Banco Central. Parte da alta da Selic, nos últimos dois anos, deveu-se a manobras defensivas contra o chamado Dia D, para segurar o capital especulativo quando o grande aspirador de dólares fosse ligado.
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O segundo governo Dilma terá grandes desafios pela frente. Demorará um tempo para regularizar a questão fiscal, reconquistar a confiança do mercado e retomar os grandes investimentos em infraestrutura. Neste final de ano, a maioria dos desembolsos foi contingenciado nas mais diferentes áreas.
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No segundo governo, a política econômica terá definitivamente que casar política monetária, cambial e fiscal com as necessidades de caixa dos programas sociais e das políticas industriais. Não dá mais para cada qual caminhar para um lado, como se fossem peças independentes.
E aí se volta ao sistema de metas inflacionarias adotado pelo BC: aumentar a taxa Selic para combater a inflação. Não há nenhuma comprovação empírica da eficácia desse sistema. Com a economia parando, é ridículo pensar em pressão de demanda – único tipo de inflação que justificaria aumento de juros.
No entanto, a alta de juros desmonta toda a estratégia de retomada dos investimentos.
De um lado, compromete parcelas expressivas do orçamento público, reduzindo o espaço fiscal do governo. De outro, atrasando a reciclagem da poupança dos ativos de renda fixa para títulos de renda variável de longo prazo, relevantes para o financiamento de investimentos.
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No início do primeiro governo, Dilma tentou derrubar os juros. Acabou recuando devido à pouca segurança passada pelo BC.
Um dos desafios de Dilma será colocar à frente do BC técnicos com credibilidade e conhecimento de mercado capazes de substituir o sistema de metas inflacionárias por outras formas de coordenar expectativas sem as enormes contraindicações do sistema atual.