Compartilhado de O Tijolaço –
O massacre de Paraisópolis – já a ninguém estranha falar-se assim – não vai ser assunto sepultado junto com os oito rapazes e a moça mortos na brutal ação da PM na madrugada de domingo.
Por mais que se despeje por sobre o caso camadas de silêncio e hipocrisia, está evidente que há mais ali que uma ação desastrada das forças policiais.
Tal como no caso da menina Ágatha Félix, no Rio, o pacto corporativo policial de encobrimento não será suficiente, ao que tudo indica, para manter a versão – gasta de tão usada – de que tudo foi apenas a reação a marginais que passavam numa motocicleta.
É evidente que não são soldados ou cabos da PM os responsáveis por um processo cujas responsabilidade ultrapassam as próprias forças policiais e alcançam Governo, Justiça e mídia.
O retrocesso, patrocinado por todos eles, aos conceitos da República Velha – “a questão social é um caso de polícia”, dizia a frase atribuída Washington Luís – faz parte de um caldo de cultura política que atribui à repressão policial-judicial o condão de resolver os problemas nacionais que, por sua vez, seriam o tráfico, o crime e a corrupção.
Os meninos e a menina mortos em Paraisópolis são uma metáfora cada vez mais entendida do que esta visão reserva ao povão: contente-se em não existir.
Tratam-no como estorvo, problema, incômodo.
Mas ele, teimosamente, existe.
Há meio século, Milton Nascimento e Ronaldo Bastos escreveram os versos de “Menino”: quem cala sobre teu corpo/consente na tua morte”.
É preciso a coragem consciente de não temer os imbecis que comemoraram massacres como imposição da ordem e mortes como defesa da vida.