Por Rogério Marques, jornalista, no Facebook
De todas as violências praticadas por grupos da extrema-direita na Bolívia, no atual processo golpista, o episódio mais chocante talvez tenha sido o sequestro de Patricia Arce, prefeita de Vinto, cidade de 60 mil habitantes na região de Cochabamba.
Patrícia teve os cabelos cortados por homens e foi pintada com uma tinta avermelhada, certamente por ser filiada ao Movimento ao Socialismo, mesmo partido do ex-presidente Evo Morales. Tudo filmado, fotografado e mostrado ao mundo através de redes sociais.
O episódio faz lembrar um outro ocorrido no Brasil em 1976, durante a ditadura militar, governo Geisel. O bispo católico de Nova Iguaçu, Baixada Fluminense, Dom Adriano Hypólito (1918 – 1996), também foi sequestrado e pintado de vermelho, além de sofrer espancamento e ter sido deixado nu.
Dom Adriano fazia um importante trabalho social na Baixada Fluminense e era um crítico da ditadura militar. O bastante para ser apontado como comunista por militares da extrema-direita, que na época praticavam atentados e assassinavam, na tortura, militantes como o operário Manuel Fiel Filho e o jornalista Vladimir Herzog, em São Paulo.
No caso da prefeita Patricia Arce, o ato de cortar os cabelos tem também um simbolismo machista, como em guerras e conflitos étnicos no passado. E a agressão não parou por aí: Patricia foi obrigada a caminhar pelas ruas suja, descalça, cabelos cortados, em meio ao bando que a xingava.
Depois de resgatada pela polícia, ainda atônita, muito abalada, a prefeita declarou aos jornalistas: “Sou livre e não vou me calar. Se querem me matar, que me matem. Como eu disse um dia, darei a minha vida por esse processo de mudança”.