Numa cruzada hoje quase solitária contra a vacinação de modo geral, e especificamente em crianças, o presidente Jair Bolsonaro atingiu o clímax da falta de senso e de sensibilidade ao afirmar que a variante Ômicron não é letal, tem efeito vacinal, logo é “bem-vinda”. Contrariando todos os dados estatísticos, ele afirmou também que não conhece casos de crianças que morreram por Covid-19.
Por Luiz Eduardo Rezende, compartilhado de Construir Resistência
Não bastasse a contestação de médicos, cientistas e de pessoas que tiveram parentes mortos pela doença, Bolsonaro foi repreendido pela Organização Mundial de Saúde, cujo diretor-executivo, Mike Ryan (foto) afirmou: nenhum vírus que mata pode ser bem-vindo.
É difícil entender a insistência de Bolsonaro em se posicionar contra a vacinação. As pesquisas mostram que ele perde votos com essa posição, mas o presidente, que só pensa em reeleição, não se importa. É contestado por aliados e auxiliares próximos, mas nem assim diminui as críticas. Briga com a Anvisa, com as associações médicas. Tem a postura de um herói solitário.
Do lado de Bolsonaro nessa questão das vacinas hoje só estão os seguidores mais radicais, mais raivosos, que ainda consideram o presidente um mito, uns por ideologia, outros por ingenuidade e muitos por ódio ao PT.
Ah, mas ainda tem aqueles que estão defendendo uma graninha!!!!
O TIGRE VIROU UM GATINHO
No subúrbio do Riachuelo, onde nasci e me criei, quando alguém não enfrentava uma daquelas brigas de garoto, dizia-se que “botou o galho dentro”. Essa expressão dos moleques da década de 1950 serve bem para o que aconteceu recentemente.
Bolsonaro, sempre metido a valentão, insinuou que havia corrupção na Anvisa para aprovação das vacinas, principalmente para crianças de cinco a onze anos. Bateu de frente com o presidente da agência, almirante Barra Torres, que também é médico. Foi desafiado a provar as acusações ou então a se retratar. O oficial superior não aceitou ser capacho do ex-capitão, como o general Eduardo Pazuello.
O presidente demorou, mas respondeu. Foi quase uma retratação. Disse que não falou em corrupção, apenas mostrou discordância com a posição da Anvisa. Tentou convencer Barra Torres e a população que a pergunta sobre o que estaria por trás da liberação das vacinas não era uma insinuação.
Não convenceu. O almirante, de posições ultra direitistas, fez valer a sua autoridade e enfrentou o capitão, um aliado de primeira hora. Barra Torres devia saber que Bolsonaro não respeita os amigos. Já deixou muitos na beira da estrada, basta não concordarem com o que ele pensa ou faz.
Mas desta vez botou mesmo o galho dentro para o almirante.
POUCO COM POUCO DÁ POUCO
Incomodado com os baixos índices nas pesquisas eleitorais, Ciro Gomes procura um mote para sensibilizar a população e tornar sua candidatura viável. Não encontrou até hoje. Mas tenta agora achar um vice que traga votos e lhe ofereça um discurso consistente.
A primeira opção anunciada foi Marina Silva, da Rede, aquela mesma que some durante quatro anos e aparece como por encanto nos meses que antecedem as eleições. Foi candidata várias vezes. Perdeu sempre. Já mostrou que não tem votos suficientes para disputar eleições majoritárias e dificilmente aceitaria ser vice do Coronel de Sobral, a não ser para tentar eleger uma boa bancada para a Rede, seu partido nanico.
Ciro Gomes nunca se preocupou com meio ambiente. É mais ligado aos temas econômicos. É muito preparado nesse campo. E Marina é samba de uma nota só, tem discurso único sobre preservação das nossas florestas e de defesa dos povos indígenas. Atuação elogiável, mas estreita para uma candidata a presidente.
Em matéria eleitoral, essa aliança seria o roto tentando ajudar o esfarrapado.
PANCADARIA NO PLANALTO
Está cada vez mais intensa, com a proximidade das eleições, a briga entre os grupos que cercam Bolsonaro. Os militares golpistas forçam para que o presidente endureça o discurso contra o STF e volte a defender abertamente o golpe de 64.
O pessoal que segue o pseudointelectual Olavo de Carvalho não se conforma com a influência cada vez maior do Centrão no governo, o que pode atrapalhar muito as pretensões dos que querem se candidatar a cargos eletivos, defendendo o bolsonarismo de raiz.
E o Centrão, cada vez mais beneficiado pelas gordas verbas do governo federal, reclama do negacionismo de Bolsonaro e está pronto para pular do barco em março ou abril, caso o presidente continue patinando nas pesquisas eleitorais. O Centrão não tem ideologia nem posição política. Onde houver poder e dinheiro, o grupo está junto.
Com isso, Bolsonaro vai ficando cada vez mais isolado.
QUANTA MENTIRA
Dois dos principais apoiadores de Jair Bolsonaro, o pastor Silas Malafaia e empresário Luciano Hang tiveram postagens retiradas das redes sociais por estarem divulgando informações falsas sobre a vacinação de crianças entre cinco e onze anos, em apoio à posição negacionista do presidente.
Silas Malafaia classificou a vacinação infantil como infanticídio, enquanto Luciano Hang postou a fala de um médico dizendo que a vacina é toxica e pode desenvolver câncer e problemas cardíacos nas crianças.
Dos dois não se poderia esperar nada diferente mesmo. O incrível é que a única punição para a divulgação de tantas mentiras seja a retirada dos posts das redes sociais. O que eles fizeram é crime, é expor a população, crianças em especial, a esse vírus que mata.
Onde está o Ministério Público que não toma providências? Malafaia e Hang têm que ser processados pelos crimes que cometeram.
VICE NUNCA
Na época do Mensalão, em evidência por suas posições radicalmente contrárias à corrupção, o ex-ministro do Supremo Tribunal Federal Joaquim Barbosa chegou a pensar em aceitar o convite para ser candidato a presidente da república. Não se lançou, mas deixou que seu nome circulasse nos meios políticos, sem desmentir a possibilidade da candidatura.
Vaidoso, tão logo percebeu pelas pesquisas que não ganharia as eleições, tratou de dizer que não era candidato. Se aposentou do STF e sumiu do noticiário, deixando uma imagem positiva de homem sério e justo. Reapareceu agora quando foi procurado pelo ex-juiz Sérgio Moro para uma conversa.
Moro foi convidar Joaquim Barbosa para ser seu vice. Mostrou não conhecer o ex-ministro. Joaquim Barbosa não aceitaria ser vice de ninguém. Ou era candidato a presidente ou nada.
Como dizia Leonel Brizola, Moro levou um não rotundo!
Luiz Eduardo Rezende é jornalista com passagem por grandes jornais do Rio de Janeiro, como O Globo e O Dia. Matéria originalmente publicada no Quarentena News.