Coronel da reserva da Força Aérea, Glauco Octaviano Guerra é sócio da CTU, representada no Brasil pela empresa do irmão, MHS Produtos e Serviços, que tem mais de 400 contratos que somam mais de R$ 1,4 milhão com as Forças Armadas.
POR PLINIO TEODORO, compartilhado da Revista Fórum
Sócio brasileiro da empresa estadunidense CTU Security LLC, que foi contratada pelo Gabinete de Intervenção Federal (GIF) no Rio para fornecer os mais de 9 mil coletes balísticos com um superfaturamento de R$ 4,6 milhões, o coronel Glaucio Octaviano Guerra, que entrou para a reserva em 2016, e a família têm uma longa ficha de negócios e tratativas escusas com órgãos do governo federal, em especial as Forças Armadas.
Nascido no Rio de Janeiro, Guerra é o irmão mais novo de uma família de militares e policiais que colecionam denúncias de corrupção e que mantêm relações com o clã Bolsonaro.
Durante a pandemia, o nome dele apareceu em conversas com Luiz Paulo Dominguetti como uma espécie de lobista da empresa estadunidense Davati Medical Supply, que tentou vender vacinas contra a Covid superfaturadas para o Ministério da Saúde quando a pasta era comandada pelo general Eduardo Pazuello, que passou para a reserva e foi eleito deputado estadual pelo PL/RJ.
Glaucio é irmão de Glauco Octaviano Guerra, ex-auditor fiscal que foi preso pela Polícia Federal em maio de 2020 na Operação Mercadores do Caos, que investigou uma organização criminosa que superfaturou venda de respiraDores pulmonares importados também durante a pandemia.
Glauco é dono da importadora MHS Produtos e Serviços, que mais de 400 contratos com as Forças Armadas que somam mais de R$ 1,4 milhão, incluindo o fornecimento de alimentos como leite condensado, sorvete de chocolate, cereja, salgadinhos de camarão.
O ex-auditor fiscal integra o grupo de investigados pela Corregedoria da Receita Federal por enriquecimento ilícito que alegaram que seus dados teriam sido acessados ilegalmente, mesma tese usada pelo senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) para anular o inquérito das “rachadinhas”.
Milícia venezuelana
A sociedade do “coronel Guerra” com o venezuelano Antonio Intriago na empresa de segurança CTU Security LLC motivou a comunicação de crime feita à Polícia Federal pela Agência de Investigações de Segurança Interna (Homeland Security Investigations, a HSI), que investiga nos EUA o assassinato do presidente haitiano Jovenel Moïse em julho de 2021.
Segunda a investigação, milicianos colombianos que trabalham na CTU teriam sido contratados pelo médico haitiano, residente na Flórida, Christian Emmanuel Sanon, para executar Moïse após ele prometer enviar às autoridades dos EUA uma lista de pessoas ligadas a uma rede de narcotráfico internacional.
Sócio de Guerra, Antonio Intriago “amigo pessoal de Juan Guaidó e Leopoldo López”, líderes da oposição ao governo Nicolás Maduro na Venezuela.
Na compra dos 9.360 coletes balísticos pelo Gabinete de Intervenção Federal, a CTU foi representada pela MMHS Produtos e Serviços, a mesma implicada na venda de vacinas durante a pandemia.
Braga Netto
O contrato para fornecimento dos coletes ao GIF foi assinado em 21 de dezembro de 2018 e previa o pagamento de US$ 9,4 milhões de dólares (mais de R$ 40 milhões no câmbio atual), com um superfaturamento de cerca de R$ 4,6 milhões.
No entanto, a contratação foi suspensa em 2019 pois o grupo não conseguia obter uma garantia financeira para efetivação do negócio.
Em setembro do mesmo ano, com Jair Bolsonaro (PL) na Presidência, o “coronel Guerra” acionou o general Paulo Roberto Corrêa Assis, mentor do também general Hamilton Mourão, então vice-presidente, para “dar uma força” para liberação da venda dos coletes.
“Estive em um almoço na sexta passada com o Gen Braga Netto e comentei sobre a liberação dos coletes de proteção balística para a Polícia do RJ, em estudo nessa Casa Civil da PR (Presidência da República). Ele disse que iria dar uma ‘força’ junto ao senhor para atender ao que pleiteamos”, diz Paulo Assis em mensagem de e-mail ao coronel Guerra, que foi interceptada pela PF.
À época, Braga Netto havia sido nomeado como chefe do Estado-Maior do Exército, cargo que ocupou até fevereiro de 2020, quando entrou para a reserva e se tornou ministro da Defesa de Bolsonaro.
O general Paulo Assis e o coronel Robson Queiroz Mota, também alvo da operação, passam a atuar como lobistas, negociando o fim do imbróglio para a contratação da empresa do coronel Guerra diretamente com Braga Netto.
Em mensagem a Guerra, Assis afirma que falou diretamente com o parecerista, Jorge Menezes, que havia marcado uma reunião com o então ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, e indagando se havia necessidade de falar diretamente com Bolsonaro ou Mourão.
“Gláucio, manda ele já falar com o Onyx e aí o Onyx fala com o Procurador o chefe lá da subsecretaria, aí porque, mas não fala que foi o General Paulo Assis, fala que foi pedido do Senador, que o Paulo Assis falou para o parecerista, pro Jorge Menezes, Eu preciso falar com o Mourão ou com o Bolsonaro sobre isso, eu vou falar com o Onyx. Ele não, não General, espera até sexta e graças a Deus o senhor veio aqui, que eu estava inclinado em dar um parecer negativo. Palavras do General pra mim e obviamente ele não vai mentir, ele esteve lá. Agora se vier uma outra pressão, não do General, entendeu? Ficaria Ideal”, diz o general Paulo Assis.
Já em dezembro de 2019, Assis relata que “almocei também com o Gen Braga Netto, que me prometeu interferir a nosso favor”.
O envolvimento direto de Braga Netto nos negócios da família Guerra é revelado também em mensagem de Paulo Assis, encaminhada por e-mail por Glauco ao parecerista Jorge Menezes e o coronel Queiroz.
No texto, ele relata que esteve “num almoço na sexta-feira passada com o general Braga Netto e comentei sobre a liberação dos coletes de proteção balística para a polícia do Rio em estudo nessa Casa Civil da PR”
“Ele me disse que iria dar uma ‘força’ junto ao senhor para atender ao que pleiteamos”, diz o texto enviado em 15 de dezembro de 2019.