‘Não aceitemos a mediocridade. JK fez a maioria nas ruas’

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Por Eduardo Maretti, publicado na Rede Brasil Atual – 

Em seminário promovido pelo Sindicato dos Bancários de São Paulo, economista vê Parlamento conservador como problema corrente no Brasil e cobra do governo plano de ação por apoio social

ILUSTRAÇÃO: GILBERTO MARINGONI
maringoniSão Paulo – O Brasil não fará um “ajuste” eficaz na economia se não incluir a reformulação do sistema tributário. O alerta foi feito hoje pelo economista Miguel Huertas, representante da CUT, em seminário que tem como tema e “alvo” o sistema de impostos no Brasil. Para Huertas, se o país está “discutindo ajuste fiscal e outras reformas um debate tão central e estruturante, como a reforma tributária, não poderia estar de fora como está”. Segundo ele, o sistema brasileiro onera o consumo e o investimento e é um dos principais fatores para a desigualdade social no nosso país.

O seminário De Qual Reforma Tributária o Brasil Precisa é promovido pelo Sindicato dos Bancários de São Paulo. A mesa de abertura teve a participação do presidente da central em São Paulo, Adi dos Santos Lima; da presidenta da União Nacional dos Estudantes (UNE), Carina Vitral; do professor do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Marcio Pochmann, presidente da Fundação Perseu Abramo, e mediação da presidenta do sindicato, Juvandia Moreira.

A presidenta da UNE reiterou a crítica à condução da política econômica. “O ajuste fiscal não mexe na injustiça tributária, mas no gasto social”, afirmou. Juvandia questionou sobre o desafio de travar esse debate no plano nacional ante a resistência do Congresso e dos meios de comunicação. “Como fazer uma reforma tributária com esse Congresso Nacional conservador e uma mídia interessada em manter esse status quo?”




Pochmann observou, então, que o país nunca teve tradição de congressos progressistas e que é tarefa do governo elaborar um plano de ação que conquiste, mais que os votos do Parlamento, o apoio da sociedade. “Dá para contar nos dedos um Congresso que tenha sido progressista. É necessário planejar o que vamos fazer nos próximos três anos. Juscelino Kubitschek não tinha maioria. Construiu a maioria na rua, com diálogo e articulação, com agenda de 50 anos em cinco, que foi feita com o povo. A agenda dele foi o Plano de Metas. Nós não podemos aceitar a mediocridade”, afirmou.

De acordo com o professor, também colunista da RBA, pagar impostos teoricamente é um ato de cidadania. “Mas infelizmente não somos um país de cidadania plena. Nossa tributação não se estende para todos. O Estado gasta com os ricos e não com os pobres. Os ricos são os que mais reclamam (de pagar impostos) e os que menos pagam. Precisamos construir uma nova maioria política para democraticamente caminhar no sentido da justiça tributária. Se nós da esquerda não pensarmos, a direita já tem tudo pronto”, disse Pochmann. “O Estado brasileiro não só arrecada dos pobres como gasta com os ricos. As famílias que ganham até dois salários mínimos pagam cerca de 47% do que ganham com pagamento de tributos.”

Cartilha

Durante o seminário, o sindicato lançou uma cartilha com a finalidade de apresentar as contradições do sistema de impostos no Brasil e alternativas para torná-lo mais justo como instrumento de distribuição. A publicação foi redigida pelo economista João Sicsú, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). O professor Gilberto Maringoni, da Universidade Federal do ABC e também cartunista, assina as ilustrações

O texto analisa o sistema tributário brasileiro como “complexo e regressivo” ao concentrar a arrecadação em impostos sobre consumo, seja de eletrodomésticos, bebidas ou alimentos. E exemplifica como o formato é injusto ao levar pobres e ricos a pagar o mesmo valor sobre um determinado produto. “O tributo que incide sobre um pacote de macarrão, por exemplo, pesa no orçamento de quem ganha um salário mínimo, mas os ricos nem sequer percebem esse valor.”

Segundo um estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), os 10% mais pobres destinam 32% das suas rendas para pagar impostos, enquanto os 10% mais ricos desembolsam apenas 21%. Isso decorre em parte do fato de o maior imposto do país, o ICMS, incidir sobre o consumo. É estadual e, sozinho, representa 20,32% (ou um quinto) de toda a arrecadação tributária do país. Sua carga é de 7,18% do PIB, diz a cartilha.

A edição observa que o ICMS é também responsável pela chamada “guerra fiscal” entre os estados. Cada unidade da federação tem a própria lei. Assim, os governos usam o imposto como instrumento para atrair empresas, por meio de benefícios fiscais. Para mexer no ICMS, é preciso discutir o próprio pacto federativo, defende o texto de João Sicsú.

cargaCarga tributária

De acordo com estudos do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) divulgado no ano passado, 55,74% da arrecadação tributária do país, incluindo União, estados e municípios vêm de impostos sobre consumo, enquanto 30,48%, da tributação da renda (15,64% da renda do trabalho). Mas a tributação sobre patrimônio é de apenas 3,7%. Outro problema é a recusa dos poderes de encarar questões para as quais falta vontade política. A Constituição Federal de 1988 prevê a cobrança do imposto sobre grandes fortunas, mas esse tributo precisa ser regulamentado por lei complementar, o que nunca foi feito pelo Congresso Nacional.

Sicsú observa que “os que não querem mudanças” desenvolvem campanhas que simplesmente condenam a carga tributária no Brasil. “Uma meia-verdade”, diz. Segundo dados da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), a carga tributária brasileira é inferior a muitos países. A carga tributária corresponde atualmente a 35% do PIB do Brasil, menor do que a da Alemanha (37,1%), Áustria (42,1%), Bélgica (44%), Dinamarca (48,1%) e Itália (42,9%), entre outros. “O problema é que em outro países há educação pública, sistemas de saúde e outros serviços, como transporte, gratuitos e de boa qualidade”, ressalva o autor.

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