Por Camila Vieira, no Portal Fórum –
Carolina Dieckmann se mudou com a família para uma mansão em um condomínio na Zona Sul do RJ. De acordo com o jornal Extra, “só o terreno custa R$ 3 milhões”. A notícia não causou indignação, mesmo se tratando da grande amiga e “organizadora” da festa da recém-casada, alvo do surto anti-ostentação seletivo. Em comum elas têm o fato de serem artistas e ricas, a diferença e que Carolina é branca, magra e Dieckmann enquanto a outra é gorda, Preta e Gil
Eu sigo @PretaGil no Insta há muito tempo, portanto acompanhei suas postagens sobre o casamento. Também sigo Godoy, o tal marido jovem e magro que decidiu casar com uma preta gorda.
A relação deste casal sempre foi questionada com ofensas e, explicitamente, com preconceito nojento. Achava estranho o fato de a cantora não colocar o dedo na ferida, mas, enfim, não era um assunto que debatia, mesmo pensando sobre o caso. Estas situações mexem muito comigo porque sou branca e tenho filhos negros. A vida deles é mais difícil que a minha na infância. Portanto meu olhar para estes fatos é de “tandera”.
Na última quarta-feira, dia 13 de maio, no fatídico dia em que a princesa assinou a lei mentirosa, o jornalista e crítico musical , André Forastieri, escreveu um texto que quase me fez vomitar. Acompanho o rapaz desde meus 13 anos quando ele criticava os meus preciosos discos de Engenheiros do Hawai e Guns n’ Roses. Ele usou um bom dia para mostrar as garras da Casa Grande e dar uma lembradinha sobre quem pode e quem não pode fazer festas caras e ostentadoras.
Não quero debater sobre o casamento, a festa, os gastos, os valores, o excesso , o luxo, as flores, os doces, as lembrancinhas, os famosos, suas roupas, seus looks, seus estilistas, suas cafonices, até porque, este não é meu mundo e nem é o mundo da maioria das pessoas que conheço e que quero conhecer. Mas este é o mundo da maioria dos ricos deste pais, é o dia a dia dos moradores dos nobres bairros das capitais brasileiras, é o mundo dos jovens ricos e brancos, filhos dos ricaços e o dado é assustador: 40% destes jovens não precisarão de nenhuma instrução/formação para continuarem sendo ricos, segundo a pesquisa de Marcelo Medeiros. Mas casamentos como os de Preta, ou até maiores que o dela, acontecem na mesma igreja, no mesmo hotel, no mesmo “maison”, no mesmo cabeleireiro, com os mesmos promoters, diariamente! E ninguém escreve uma linha para criticas, aliás, só para comemorar e afirmar.
É ai que mora o problema. O que faz o jornalista, como ele, escrever boas linhas para questionar o gasto do casamento de uma “Preta” e não de uma Branca? O que faz um veículo de comunicação publicar especificamente um questionamento sobre esta festa? O que faz alguém escrever um texto induzindo que a noiva recebeu afagos governistas para pagar uma suntuosa festa? O que faz André quando tenta politizar o evento de uma pessoa que defendeu panelaços, as marchas dominicais dos conservadores e não concorda politicamente com o pai, mas que parece ter sido financiada por Juca, o ministro governista? O que faz alguém não tolerar uma preta que fez uma série de internet (com poucos compartilhamentos, segundo o jornalista) mostrando o glamour dos casamentos dos ricos, mas no caso, o dela? O faz alguém questionar de onde vem o dinheiro do clã Gil? Afinal, é estranho que pessoas como eles tenham este valor de supostos 2 milhões para gastar em festas iguais as dos brancos ricos?
André Forastieri fala com o rancor de quem foi usurpado, traído por parte de sua “classe” que topou realizar festas de gente de fora de sua casta. Expressa o ódio racial travestido de questionamento social. Conheço os textos dele e muitas vezes debate temas interessantes, outras nem tanto, e desta vez foi infeliz, foi racista! Mas o racismo é tão sórdido que brota de nossos poros sem que a gente perceba o quanto é nocivo para nossa sociedade. Opiniões indignadas e seletivas! Num momento de obscurantismo, declarações de ódio explícito, hipocrisia generalizada e retrocessos sem precedentes, textos como este não contribuem para combater os ricos e suas extravagâncias. Ele foi feito para desconstruir uma família negra. A imagem da Preta, seu pai negro e seu filho gordo de cabelo black power na entrada de uma igreja, onde majoritariamente só entram brancos, é sim representativa. E representatividade importa!
“Carolina Dieckmann, 36, se mudou com a família para uma mansão em um condomínio no Joá, na Zona Sul do Rio de Janeiro”. De acordo com o jornal “Extra”, “só o terreno custa R$ 3 milhões”. Esta notícia, fruto da vida de ostentação dos ricos que tanto causa furor no “populacho” não causou uma onda de indignação, mesmo se tratando da grande amiga e “organizadora” da festa da recém-casada, alvo do surto anti-ostentação seletivo. Em comum elas têm o fato de serem artistas e ricas, a diferença e que Carolina é branca, magra e Dieckmann enquanto a outra é gorda, Preta e Gil.
Camila Vieira, jornalista, mãe de João Cândido, Ana Terra e Maria Heloísa
Foto: Reprodução/Instagram