Compartilhado de Outras Palavras –
Emissora distorce dados e tenta atrair opinião pública para “reforma” administrativa de Guedes. Objetivo: privatizar Saúde e Educação, oferecendo aos pobres “vouchers”, com os quais comprarão serviços de terceira qualidade
Uma carta aberta da Rede de Associações de Servidores de SP
Esta semana os grupos Globo e Estadão veicularam um suposto “estudo” elaborado pelo assumidamente neoliberal think tank Instituto Millenium, que congrega personalidades influentes do Governo, da Globo e de outras empresas de mídia e do setor financeiro.
Desmentindo o suposto “estudo”
Segundo o suposto “estudo”, em 2019 o Brasil teria gasto o equivalente a 13,7% do Produto Interno Bruto (PIB) de 2019, cerca de R$ 930 bilhões, com servidores públicos federais, estaduais e municipais. Este dado está correto.
Como qualquer pessoa leiga sabe e, supostamente, os “especialistas” do referido Instituto deveriam saber, os serviços públicos são realizados por servidores públicos, e não por robôs. Contudo, na mesma campanha de difamação veiculada pela Globo e pelo Estadão em defesa da tal “Reforma Administrativa”, compararam o gasto com salários (13,7% do PIB), de um lado, em oposição ao gasto com Educação (6% do PIB) e com Saúde (3,9% do PIB), como se as duas coisas não estivessem completamente relacionadas uma com a outra.
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Ou os economistas do Instituto Millenium não sabem que fizeram dupla contagem ao contrapor salários de um lado X saúde e educação do outro? Será mesmo que nenhum editor da Globo e do Estadão percebeu o “erro”, a fake news que veicularam?
Educação e Saúde são feitos por quem, robôs?
Ora, todos sabem que Educação e Saúde são áreas do serviço público intensivas em pessoal. Os principais gastos com Educação e Saúde não se confundem com os gastos feitos quando se constrói uma estrada e obras de infraestrutura que são intensivas em investimentos de capital (asfalto, concreto, máquinas etc.).
A maior parte do orçamento público destinado às áreas de Educação e Saúde é com pessoal: professores, médicos, enfermeiros e todos os outros profissionais. Isso deveria ser óbvio em qualquer debate que se pretenda honesto.
A disputa é pelo orçamento público
Nós compreendemos que ideólogos, economistas e jornalistas anti-serviço público prefiram que o orçamento público seja gasto com obras (chamadas no linguajar técnico de “investimentos”), com terceirizações e com toda sorte de mercadorias educacionais tais como sistemas apostilados, lousas digitais, sistemas EaD etc, que estão no centro do lobby empresarial em relação ao Fundeb, por exemplo.
Porém, tirando de lado o rent seeking desse empresariado que quer vampirizar o orçamento público, de quê adianta para a população esse fetiche por “investimentos” se não tivermos profissionais para trabalharem nas escolas e nos hospitais?
Não existe essa tal “imparcialidade”
Não há problema algum as famílias que mandam na Globo e no Estadão defenderem suas visões de mundo e os interesses de seus anunciantes. Mas isso deveria ser feito com honestidade. Essa suposta imparcialidade que dá espaço apenas para vozes de “especialistas” que se repetem entre si, sem espaço para a diversidade, para o contraditório, é desonestidade e não é em nada superior às fake news que circulam pelo esgoto das redes sociais.
A Globo, o Estadão e o atual grupo político que controla o Governo Federal são livres para se posicionarem contra a população do Brasil ter o direito de receber serviços públicos de qualidade. Contudo, deveriam ter a decência de assumir isso sem mentiras nem manipulações como esse “estudo” vergonhoso do Instituto Millenium.
É questão de matemática básica
Para que não reste qualquer dúvida:
6% do PIB com Educação + 3,9% do PIB com Saúde = 9,9% do PIB, já incluídos aqui, obviamente, os salários com os profissionais de Educação e de Saúde.
Se 13% do PIB é gasto com salários do serviço público (inclusive os salários com Educação e com Saúde), o problema estaria nos 4,1% restantes. Aprofundem nesses 4,1%, editores da Globo e do Estadão. É aqui que se encontram os altíssimos salários e mordomias dos Poderes Judiciário e Legislativo, as regalias do alto oficialato das Forças Armadas (como aposentadoria integral aos 35 anos de idade) e as distorções nos Poderes Executivos.
É preciso combater as castas privilegiadas, não o serviço público inteiro
Dos 11,4 milhões de postos de trabalho no setor público mais da metade é dos governos municipais, atuando nas áreas sociais. 40% das ocupações correspondem aos profissionais do “núcleo-duro” dos serviços de Educação e Saúde: professores, médicos, enfermeiros e agentes de saúde. Só na Educação e na Saúde públicas municipais são 2,6 milhões de profissionais. A cada 100 desses servidores, 22 são professores e 2 trabalham em outras áreas da educação; 16 são administradores; 11 são médicos, enfermeiros ou outras profissões da saúde; 5 fazem limpeza e 4 prestam serviços de segurança pública.
Quanto aos salários, em 2018, metade dos funcionários públicos ganhava até 3 salários mínimos (R$ 2,9 mil). Apenas 3% ganhava mais do que 20 salários mínimos (R$ 19,1 mil). Por quê o Governo não “reforma” esses 3% de altos salários?
As disparidades e os abusos devem ser apontados e resolvidos. O que não dá mais é para generalizar o conjunto dos profissionais do serviço público como se houvesse 100% de marajás no país. Essa tática é antiga, o “Caçador de Marajás” já a utilizava em 1989, e não engoliremos isso em 2020.
Alguém lucra com a destruição dos serviços públicos: quem?
O que realmente está por trás dos ataques aos servidores públicos é o lobby realizado por setores econômicos de quem tem planos de lucrar com a privatização de serviços sociais e com a retirada de direitos da população. Muitos desses, inclusive, são anunciantes da Globo e do Estadão. O objetivo é que as classes sociais que ainda dependem da Educação e da Saúde públicas sejam obrigadas a pagar por serviços essenciais — tal como já ocorre, hoje, com a classe média — se as “reformas” destruidoras de direitos do atual Governo forem adiante.
Em vez de defenderem a melhoria do serviço público, o projeto da confraria de interesses que se encontra em espaços como o Instituto Millenium trabalha para destruí-lo de vez.
A pandemia nos mostrou que o serviço público precisa ser melhorado, não destruído
Uma das principais lições que tiramos diante do terrível cenário epidemiológico atual é a importância do setor público no Brasil e a enorme dedicação dos servidores no enfrentamento à pandemia, que vem ceifando dezenas de milhares de vidas e modificando drasticamente nossa maneira de viver e de enxergar o mundo. Está claro agora, mais do que nunca, que os servidores são pilares fundamentais na formulação e na execução de políticas públicas e que, sem isso, as consequências da pandemia seriam ainda mais graves.
O que dizer dos servidores da saúde pública que estão lutando como verdadeiros guerreiros, inclusive perdendo suas vidas para cuidar das nossas? E dos professores que tiveram que reaprender uma nova didática para continuar levando conhecimento aos nossos jovens?
Como não valorizar os profissionais da área de segurança que se tornaram os responsáveis pelo cumprimento das medidas da quarentena nas nossas cidades? E dos profissionais em meio ambiente que alertam há décadas que novas doenças são uma das consequências da degradação ambiental desenfreada? O quê dizer dos nossos pesquisadores científicos que, mesmo num sistema sucateado, estão desenvolvendo pesquisas relevantes na busca de tratamentos, remédios e vacinas? E dos demais servidores públicos que fazem a gestão e o controle de todo o sistema público?
Justamente nesse período pandêmico, estamos sofrendo de outra doença que já se tornou epidemia no Brasil: o desrespeito aos cidadãos cuja profissão é servir ao interesse público.
Considerações finais
Repudiamos tais ataques covardes, oportunistas e desonestos da mídia que ainda controla grande parte da opinião pública e tenta, por interesses obscuros, nos estigmatizar como se fôssemos nós os inimigos da população e como se tivéssemos nós algum poder para corrigir os inúmeros erros cometidos pela banda podre da classe política brasileira.
90% dos servidores públicos faz parte do povo e da classe trabalhadora assalariada, comprometida, guerreira, e que faz a diferença na luta para que o Brasil se torne um país mais justo e fraterno!
Para quem tiver interesse em material técnico de qualidade sobre o serviço público brasileiro, recomendamos o Atlas do Estado Brasileiro e a nota técnica Três décadas de funcionalismo brasileiro (1986-2017), elaborados pelo Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (órgão técnico de excelência vinculado ao Governo Federal que também está sob forte ataque).
Assinam essa Carta Aberta as organizações que fazem parte da Rede de Associações de Carreiras do Estado de São Paulo — RACESP:
Associação dos Assistentes Agropecuários do Estado de São Paulo — AGROESP
Associação dos Especialistas Ambientais do Estado de São Paulo — AEAESP Associação dos Especialistas em Políticas Públicas do Estado de São Paulo — AEPPSP
Associação dos Gestores Públicos do Estado de São Paulo — AGESP Associação dos Profissionais das Agências Reguladoras do Estado de São Paulo — APARSP
Associação dos Servidores e Servidoras da Defensoria Pública do Estado de São Paulo — ASDPESP
Associação dos Trabalhadores da Secretaria de Desenvolvimento Social do Estado de São Paulo — ATDSESP
Executivos Públicos Associados do Estado de São Paulo — EPAESP