Porque a Folha não encara uma discussão honesta sobre o Golpe

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Por Luis Felipe Miguel, No Facebook,  publicado em Jornal GGN – 

Não tenho o hábito de ler Otávio Frias Filho (o patrão da Folha de S. Paulo). Muitos anos atrás, quando eu escrevia crítica de livros para um jornal de Brasília, chegou às minhas mãos um volume com suas peças teatrais, mas eu não dei conta de lê-las.

Hoje, ele dedica um texto a criticar os cursos sobre o golpe de 2016, com as ofensas de costume à universidade e, em particular, às ciências humanas. O ponto, claro, é que não houve golpe. Primeiro ele diz que as “pedaladas fiscais” são, sim, motivo para o impeachment, mas logo reconhece que não passaram de “pretexto”. Em seguida, afirma que foi seguido todo o rito legal “sob supervisão de um Supremo independente”. Passa à ideia de que, sendo um julgamento “político”, um impeachment não precisa dar atenção ao fundamento jurídico. Depois, a questão é que um governo que não consegue o apoio de um terço do Congresso não merece governar. Enfim, estabelece a lei histórica de que quando a economia fica em recessão por dois anos seguidos o governo cai, logo o impeachment era tão inevitável como a lua minguante depois da lua cheia.




O deslizamento constante entre formalismo e pragmatismo permite que Frias Filho evite todas as questões espinhosas. Do começo ao fim do texto, não há o mínimo esforço para entender o que é um golpe. Também se mantém um foco exclusivo no processo dentro do Congresso, em 2016, vedando a conexão entre a derrubada de Dilma e o realinhamento das forças políticas que permitiu a implantação de um projeto que, submetido às regras até então vigentes, sempre fora derrotado – o que é essencial para a compreensão do golpe que alçou Temer ao poder.

Na página seguinte, aparece um artigo de Steve Pinker, o psicólogo cognitivo que, de uns tempos para cá, assumiu o papel de Dr. Pangloss da sociedade liberal, em co-autoria com um certo Robert Muggah. O objetivo deles é negar que a democracia liberal esteja em crise. Usando o índice da Economist para definir que países são democráticos, demonstram que o número dos países que adotam as regras da liberal-democráticas não está em queda e que, na maioria dos países, a maioria das pessoas apoia a democracia.

É uma bela maneira de fugir do debate. O que se aponta, quando se fala de “pós-democracia” e de “desdemocratização”, é a crescente incapacidade dos regimes democráticos liberais de responderem aos interesses da maioria da população. Suas políticas atendem, de maneira cada vez mais escancarada, ao 1%, aos mercados financeiros – e as regras democráticas tornam-se praticamente decorativas. Para Pinker e Muggah, nada disso está no horizonte. Sua análise das democracias liberais nem sonha em conectar as regras formais com noções como soberania popular ou igualdade política efetiva. Tamanha cegueira para tudo que esteja fora da institucionalidade estrita deveria valer, para eles, um título de cientistas políticos honorários

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