Por Luis Nassif, publicado no Jornal GGN –
Insisto: a venda da Eletrobras, como anunciada, é uma negociata, provavelmente a maior da história; e trará consequências pesadas sobre o sistema elétrico brasileiro.
Nem se fale do Ministro de fato, Paulo Pedrosa, secretário executivo do Ministério de Minas e Energia (MME), indicado para a ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica), presidente de duas associações do mercado privado de energia – a dos Comercializadores e dos Grandes Consumidores – também diretor da Equatorial e da Light Rio.
Seu perfil foi sempre ligado ao setor privado. Sua preocupação nunca foi com a atividade-fim – os consumidores -, nem com os objetivos de uma política energética – universalização do acesso e modicidade tarifária -, mas em eliminar qualquer obstáculo ao desenvolvimento do mercado privado de comercialização.
Na privatização do governo FHC, a análise de preços se baseava no fluxo futuro de resultados da empresa, trazidas a valor presente mediante determinada taxa de juros. As espertezas consistiam em considerar o fluxo de caixa histórico, com todas as amarras a que as empresas estavam submetidas enquanto estatais, e manipular a taxa interna de retorno – colocada em níveis extremamente elevados para depreciar o preço.
Agora, não: é manipulação na veia.
Os cálculos e projeções apresentados para avaliar o preço se baseiam nos valores contábeis dos ATIVOS e PASSIVOS de balanço. Trata-se de um engodo monumental, uma metodologia que a 3G – que elaborou os estudos – jamais utilizou em qualquer processo de fusão e aquisição de mercado, porque não tem valor nenhum. O que sempre valeu é a projeção de resultados, ajustados por fatores como risco e volatilidade das ações.
O engodo está no fato da Eletrobras ter 184 usinas e produzir 42.000 MW de energia. E o valor das concessões não entra em seu balanço.
Para efeito de comparação, a Usina São Simão, da CEMIG, antiga, com 1.710 MW de potência instalada, teve uma concessão vendida há três meses por R$ 7,1 bilhões. Esse valor não estava em nenhum balanço. Por uma regra de três simples, apenas as concessões da Eletrobras deveriam valer R$ 289 bilhões. Esses valores não entram nas projeções do valor da privatização. Como se não existem economicamente.
A Espanha não é nenhuma potência hidrelétrica. No entanto, a Iberdrola, segunda empresa elétrica da Espanha, tem valor de mercado equivalente a R$ 138 bilhões. Contra R$ 12 a 15 bilhões da Eletrobras.
A privatização da Eletrobrás será o maior negocio da privatização da historia brasileira, maior do que o da Vale e da telefonia. Quem representa o interesse publico nesse processo se quem vende e quem compra estão do mesmo lado?
Os especialistas do setor estão abismados com a leviandade e falta de debate com que se conduz esse mega processo.
Na Era das privatizações de FHC o debate foi muito maior, as discussões mais aprofundadas, havia consultorias internacionais para avaliar os valores, o BNDES foi o agente financeiro das vendas, o que mesmo formalmente é mais um filtro no processo. Agora o BNDES sequer aparece.
Consumada a privatização, além do golpe monumental no erário público, haverá o comprometimento do equilíbrio do mercado de energia, dos investimentos futuros na integração da energia na América Latina.