Por Maurício Thuswohl, compartilhado de RBA –
Para sindicato, cidade não está preparada para “novo normal” após quarentena: “Não vamos permitir que profissionais sejam submetidos à contaminação”
Rio de Janeiro – Os professores e demais profissionais que atuam no setor de Educação no Rio de Janeiro estão de prontidão para lutar – até mesmo com a deflagração de greve, se necessário – contra a reabertura gradual das escolas e volta às aulas prevista pela prefeitura da capital. O prefeito Marcelo Crivella divulgou na segunda-feira (1°) um programa de retomada das atividades na cidade que determina para uma terceira fase de abertura – prevista para julho – a volta das atividades presenciais em creches e escolas do ensino fundamental (5⁰ a 9⁰ ano) das redes pública e privada.
O Sindicato Estadual dos Profissionais da Educação do Rio de Janeiro (Sepe-RJ) questiona os critérios adotados para essa tomada de decisão: “O sindicato não vê como voltar. Muitos especialistas que discutem a pandemia avaliam que antes de setembro não é possível uma volta”, afirma Izabel Costa, coordenadora-geral do Sepe-RJ.
O sindicato admite “utilizar todos os meios necessários” para defender professores, demais profissionais do setor e alunos de uma possível segunda onda de contaminação: “Vamos ao Ministério Público, vamos à Justiça para que a gente não volte. Em última instância, vamos convocar a categoria para uma assembleia. O Sepe-RJ não tem ainda decisão de fazer greve, mas, se for necessário… Nós vamos cumprir todos os trâmites para que não se chegue a uma greve, mas não vamos permitir que a nossa categoria volte antes do tempo e seja submetida à contaminação”, diz Izabel.
Compromisso
Vice-presidente do Sindicato dos Professores do Município do Rio de Janeiro (Sinpro-RJ), Afonso Celso também acena com a possibilidade do que ele classifica como “uma greve pela vida” em caso de insistência por parte da Prefeitura em uma retomada das aulas considerada prematura pela categoria: “Estamos vendo tudo isso com muita preocupação. Provavelmente, caso a reabertura se confirme, nós deveremos convocar uma assembleia e poderemos, sim, até deflagrar uma greve. Uma greve pela vida, para que a gente não retorne para possíveis matadouros que serão as salas de aula”.
Os professores cobram maior participação nas discussões sobre a retomada: “Ainda não há sequer um protocolo de retorno. Estávamos organizando um debate com especialistas para pensar em como retornar e fomos surpreendidos com essa decisão da Prefeitura. A maioria das professoras e professores não tem nenhuma disposição para fazer uma volta agora, ainda mais da maneira como estão querendo fazer. Esta decisão é muito prematura. Os especialistas estão falando que a gente ainda está em uma ascendente da covid-19. Então, você voltar, mesmo que de forma parcial, numa crescente da doença é muito perigoso”, diz Afonso.
Os sindicatos da categoria afirmam ter obtido da secretária municipal de Educação, Talma Suane, o compromisso de que as atividades em sala de aula não serão retomadas antes de agosto, pelo menos: “Em uma audiência solicitada por nós e realizada na sexta-feira (29), a Secretaria Municipal de Educação garantiu que as aulas não voltam em junho de forma nenhuma e que a volta para julho ainda não está sendo discutida”, conta Izabel Costa.
Sem novo normal
Além da questão prioritária da saúde, existe também o problema educacional em si: “Nossa pressão é para que haja uma ampla discussão sobre o retorno pós-pandemia. O calendário letivo não pode ser normalizado, não existe ‘novo normal’ quando esses alunos tiveram basicamente 15 dias de aulas presenciais. No Rio de Janeiro, as aulas só começam de fato após o carnaval. O reinício das aulas deve servir para a discussão, para a organização das atividades, para reforço”.
“Não podemos esquecer que o início do ano letivo na rede municipal do Rio de Janeiro foi marcado pelo drama da crise do abastecimento de água pela Cedae, que provocou o seu adiamento. Diante desse quadro de defasagem, qualquer retomada mal planejada fere o calendário letivo. Crivella, com seu projeto político de reeleição e de conquista da base de Bolsonaro, se alinha cada vez mais à prática de necropolítica do governo federal. Nós estamos pressionando para que isso não chegue às escolas da rede municipal do Rio”, acrescenta a coordenadora-geral do Sepe-RJ.
Educação Infantil
Um grande debate realizado pelos profissionais da Educação diz respeito à educação infantil: “Imagina qual distanciamento pode haver com crianças se o contato faz parte do cuidado, assim como as brincadeiras, as interações. As crianças muitas vezes são vetores da doença, embora não as tenham. No Brasil já há estudos de que as crianças estão contraindo o vírus e apresentando outras formas de manifestação da doença que não as tradicionais. De zero a dois anos é um fator perigosíssimo. Então, não tem como pensar na educação infantil voltando em julho ou em agosto”, avalia Izabel Costa.
Com uma base sindical composta em grande parte por professores da rede privada de ensino, o Sinpro-RJ também manifesta a preocupação da categoria com o retorno das atividades na educação infantil: “A gente sabe que muitas escolas têm um número grande de alunos em sala de aula. Como é que você vai fazer esse protocolo de distanciamento?”, indaga Afonso Celso.
“Além disso, quanto à educação infantil, há um aspecto que é puramente econômico porque muitos responsáveis estão trancando as matrículas e as escolas, sem ter como sobreviver, pressionam para que se volte às aulas imediatamente. Isso, sem a menor preocupação com a saúde não só dos professores como também das crianças. O Sinpro-RJ vai cobrar da Prefeitura porque ela só convocou os donos de escola, e não o sindicato dos trabalhadores, para uma conversa sobre isso”, diz o sindicalista.