Qual é a estratégia de Trump ao matar Soleimani? Especialistas americanos respondem

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Compartilhado de BBC News – 

A decisão do presidente americano, Donald Trump, de autorizar o ataque de drone que resultou na morte do general iraniano Qasem Soleimani, na quinta-feira (02), elevou as tensões entre EUA e Irã ao longo da última semana, com trocas de ameaças e outras declarações hostis de parte a parte.

Trump ao lado do líder republicano no Senado, Mitch McConnell, nesta segunda-feira
Direito de imagemREUTERS Image captionTrump ao lado do líder republicano no Senado, Mitch McConnell, nesta segunda-feira; ele prometeu reagir caso o Irã ataque alvos americanos

Qual é a estratégia de Trump no longo prazo, e o que pode acontecer agora?

Uma das principais promessas de Trump na Presidência foi a de retirar as tropas americanas das “guerras intermináveis” no Oriente Médio.

Agora, essa promessa é colocada em xeque, enquanto o Irã promete “vingança severa” pela morte do segundo homem mais poderoso do país e o próprio Trump promete retaliar contra 52 possíveis alvos “importantes para o Irã e a cultura iraniana”.




“Os EUA acabaram de gastar dois trilhões de dólares em equipamento militar. Somos os maiores e de longe os melhores do mundo”, tuitou o presidente americano no domingo (05). “Se o Irã atacar uma base americana, ou qualquer americano, vamos mandar alguns desses belos novos equipamentos na direção deles… sem hesitar.”

A seguir, três pessoas próximas à política externa americana explicam à BBC o que acham que motivou a decisão de Trump de matar Soleimani e quais as implicações disso para as relações iraniano-americanas no futuro próximo.

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‘Trump não é um grande estrategista’

PJ Crowley, ex-secretário assistente de Estado sob o governo Barack Obama e autor do livro “Red Line: American Foreign Policy in a Time of Fractured Politics and Failing States” (em tradução livre, Linha Vermelha: Política Externa Americana em Tempos de Política Fraturada e Estados Falidos”)

Por que agora?

Integrantes de milícia iraquiana caminham sobre foto de Trump em Bagdá nesta segunda-feira
Direito de imagemAFP Image captionIntegrantes de milícia iraquiana caminham sobre foto de Trump em Bagdá nesta segunda-feira; decisão de matar Soleimani coloca em xeque promessa de sair do Oriente Médio

Houve ataques pela milícia apoiada pelo Irã (ele se refere a ações, ao longo dos dois últimos meses, contra bases iraquianas que abrigavam tropas americanas no Iraque, além do ataque à embaixada americana no Iraque, no final de 2019) e as respostas contra instalações dessa milícia no Iraque e na Síria.

O governo Trump ficou surpreso com a magnitude do ataque contra a Embaixada em Bagdá, visto como uma escalada, e acreditou que Soleimani estava por trás disso. Apresentado com uma oportunidade de alvo, o presidente autorizou o ataque (contra o general).

Qual é a estratégia de Trump?

Donald Trump não é um grande estrategista. Ele vive no momento e age por instinto. Eu ficaria surpreso se ele tivesse pensado (no momento do ataque) sobre os desdobramentos.

Ele foi apresentado à oportunidade de eliminar um “homem mau”, que Obama não teve. Provavelmente foi tudo o que ele precisou escutar.

O que acontece agora?

O Irã prometeu responder, e há muitos grupos próximos ao país que vão procurar oportunidades de atingir alvos pela região. Eles entendem o suficiente sobre política americana para saber que a chave para a reeleição de Trump é a economia. Se eles conseguirem abalá-la, o farão.

Na teoria, o objetivo final de Trump é forçar o Irã a voltar à mesa de negociações para obter um “acordo melhor”, que leve em conta não apenas as ambições nuclerares iranianas, mas seu programa de mísseis e seu comportamento regional também (o Irã é conhecido por patrocinar milícias e grupos xiitas no Oriente Médio e por ter ajudado a defender o regime de Bashar al-Assad na Síria).

É implausível ver como isto (o assassinato de Soleimani) nos aproxima dessas negociações. O secretário de Estado (Mike) Pompeo está sonhando quando diz que nós (EUA) seremos amplamente aplaudidos na região. Seremos em Jerusalém e Riad (pelos governos israelense e saudita, adversários do Irã), mas o restante da região está apreensivo.

E a promessa de Trump de sair do Oriente Médio?

O presidente nunca resolveu a contradição inerente de sua política para o Irã. Ele quer exercer o máximo de pressão, enquanto tenta retirar os EUA da região.

Embora o presidente tenha consistentemente criticado as guerras do Oriente Médio, ele agiu (com a morte de Soleimani) de modo que, ao menos no curto prazo, aumenta o risco de que o atual conflito político-econômico entre Irã e EUA escale para uma guerra.

Trump em 3 de janeiro
Direito de imagemAFP Image caption’Se o Irã atacar uma base americana, ou qualquer americano, vamos mandar alguns desses belos novos equipamentos na direção deles… sem hesitar’, afirmou Trump via Twitter
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‘Política de castigo e recompensa’

William Tobey é senior fellow no Centro Belfer para Ciências e Assuntos Internacionais da Harvard Kennedy School, além de ex-vice-administrador de não proliferação nuclear da Agência de Segurança Nuclear dos EUA

Por que agora?

O “timing” provavelmente reflete o fato de que a campanha de pressão máxima tem sido surpreendentemente eficiente.

Teerã escolheu escalar (a rivalidade com os EUA) da dimensão econômica para a militar, primeiro com ataques contra navios petroleiros e instalações e, mais tarde, contra terceirizados (em referência à morte de um civil americano no Iraque, em ataque atribuído a milícias apoiadas pelo Irã, em dezembro).

É possível ver isso (a morte de Soleimani) como uma tentativa de interromoper essa escalada, de dizer a Teerã que isso não vai funcionar.

Qual é a estratégia de Trump?

Ele está tentando uma política complexa: tentar aplicar pressão o suficiente para que o Irã sinta que literalmente não tem escolha senão voltar à mesa de negociação e obter um acordo melhor. Ao mesmo tempo, a pressão não pode ser grande demais ao ponto de levar o Irã a desistir totalmente de negociar.

De certo modo, há (uma estratégia de) castigo — o ataque ao comboio de Soleimani — mas uma recompensa, com o presidente (Trump) dizendo: “Não quero ir para a guerra com o Irã”.

Ele está tentando manter no ar a ideia de que não vê o conflito aberto como um caminho construtivo.

Houve protestos por Soleimani também fora no Irã, por exemplo no Iraque e no Paquistão (acima)
Direito de imagemAFP Image captionHouve protestos por Soleimani também fora no Irã, por exemplo no Iraque e no Paquistão (acima)

O que acontece agora?

O Irã tem sofrido com a alta inflação e a desvalorização da sua moeda. Tendo lutado uma batalha perdida no front de sanções econômicas, o país decidiu abrir uma nova frente: de ataques militares. Acredito que países que sintam que estão sendo lesados ou atacados se vejam mais propensos a assumir riscos.

Com certeza estamos vendo uma alta tolerância a riscos pelo governo de Teerã. E suspeito que sua vontade de assumir mais riscos vai aumentar.

Então, a questão é: o que vai acabar primeiro, a campanha de pressão máxima ou a capacidade de Teerã para resistir?

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‘Trump foi encurralado’

Luke Coffey é diretor do Centro Allison de Política Internacional da Fundação Heritage, centro de estudos de orientação conservadora em Washington, e também um veterano do Exército americano e ex-conselheiro especial do Ministério da Defesa britânico.

Por que agora?

Acho que cada pessoa tem um limite. Quando olhamos tudo o que o Irã fez ao longo do último ano (…), me parece claro que o país estava tentando provocar algum tipo de resposta dos EUA.

Trump, por não ser muito intervencionista militarmente, estava tentando evitar essa situação. Suspeito que ele tenha sido apresentado a essa opção (de matar Soleimani) antes e tenha rejeitado, mas na última semana pode ter decidido que chegou ao seu limite.

Ele continua a dizer que quer um acordo negociado com o Irã, sem precondições para as conversas. Trump chegou a um ponto em que tinha de revidar.

Qual é a estratégia de Trump?

A campanha de pressão máxima é a estratégia — o governo tem sido muito consistente nisso.

Trump mostrou que está tentando levar os iranianos de volta à mesa de negociações, e acho que está tentando fazê-lo com o mínimo possível de ação militar.

Acho que Trump de fato vê a si mesmo como um grande negociador e queria ser a pessoa a fazer esse acordo, mas foi encurralado porque o Irã continuava a aumentar sua pressão.

Iraniana com foto de Soleimani
Direito de imagemREUTERS Image captionIraniana com foto de Soleimani; general era o segundo homem mais poderoso do Irã

Você não acorda um dia e simplesmente decide matar Qasem Soleimani. Foi preciso planejamento entre diferentes setores de governo e militares para monitorar seu paradeiro e identificar janelas de oportunidade.

Não podemos esquecer que Soleimani era um combatente dentro de uma zona de combate. Sem dúvida que, se os iranianos tivessem a oportunidade de eliminar alguém similar dos EUA, o fariam.

Isso é parte do ritmo do conflito em que estamos presos no Oriente Médio. Não acho que isso vai escalar até se tornar a Terceira Guerra Mundial.

O que acontece agora?

O Irã certamente não vai voltar à mesa de negociações agora.

Isso não era um motivo para não fazer o ataque — falando francamente, Soleimani teve o que mereceu. Ele tem o sangue de soldados americanos nas mãos e aterrorizou grande parte do Oriente Médio por mais de uma década. Só porque Trump quer negociar com o Irã não significa que ele não deveria eliminar Soleimani.

Não acho que ele agiu pensando em política; acho que ele queria evitar essa situação, ou teria feito isso (o ataque) antes. Mas, politicamente falando, isso faz ele parecer como um líder mais forte entre seus apoiadores.

E a promessa de Trump de sair do Oriente Médio?

Trump mal gosta de ter tropas americanas na Alemanha, então a ideia de que Trump enviará tropas para o Irã em um ano eleitoral é, para mim, inconcebível.

Mas ele também tem de mostrar que os EUA só aceitarão ser pressionados até determinado ponto.

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