Por João Victor Barbosa Ferreira, publicado em Justificando –
Sou homem branco e escrevo sobre presídio feminino, direitos sexuais e reprodutivos, segurança pública, desigualdades e racismo no Brasil. Na minha condição de privilégio, a pergunta é “qual é o meu lugar de fala na comunicação acadêmica?”.
O primeiro passo para tentar responder o questionamento perpassa como enxergamos o mundo. Existe um padrão na produção do conhecimento científico: quem escreve são brancos, com ideias eurocentricas e coloniais sobre formas e espaços de poder reservados às elites que pertencem.
Não existe o devido recorte de gênero e raça no que comumente escreve a academia. Muita ciência é produzida sem antes provocar “quem escreve?”, “como escreve?” e “com base em que escreve?”.
Por isso existem duas formas de se compreender o que é esse tal ‘lugar de fala’. A primeira é pela ótica do movimento negro feminista que reivindica espaço de voz e representação na produção científica, a partir e além das experiências empíricas que perpassam as condições dos corpos.
É parte de um processo de (des)construção da lógica dominante na produção das vozes que ecoam não só pela ciência, mas também nas outras formas de produção cultural social.
A segunda e como parte da autocrítica aos privilégios dos corpos. É o compromisso do pesquisador de fazer ciência de qualidade que seja focalizada a narrar as experiências de desigualdade social, mesmo que não sejam inerentes ao seu processo de construção.
Lugar de fala não deve ser lido como sinônimo de silenciamento daqueles que não compartilham as mesmas vivências ou experiências corpóreas. Mas é dizer que, antes de falar, os privilégios devem ser reconhecidos para que eu possa primeiro ouvir e entender a experiência do outro.
Todos nós temos lugar de fala, mas é preciso que reconheçamos nossa posição no mundo para enxerga-la criticamente em contraste com tudo que nos rodeia.
Por isso fale e escreva muito, seja ativo na militância dos seus e dos que são silenciados. Use seu lugar de fala com responsabilidade: o silêncio é cúmplice do privilégio.
João Victor Barbosa Ferreira é bacharel em Direito e estudante de Antropologia pela Universidade de Brasília. Advogado.