Quando a vaidade é só o que importa em um julgamento

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Por Bruno Tardelli, advogado, Justificando – 

O Diabo em forma de advogado, vivido por Al Pacino nas telas do cinema, já dizia que a vaidade era seu pecado favorito. Ao comentar a necessidade de seu discípulo se exibir antes de praticar qualquer coisa próxima ao justo, revelou as mais profundas entranhas do Sistema Judiciário como um todo.

Nossos Deuses do Olimpo Jurídico Brasileiro, por exemplo, não cansam de desfilar a erudição em frente às câmeras de televisão. Parece que vem do âmago a incontrolável carência de ser reconhecido como a sumidade de seja lá o que estiver sendo discutido. Não importa se a questão já tiver sido julgada e o voto apenas seguirá com a maré. A necessidade de se sentir importante e pertencente é maior do que tudo. Algo como –  como assim vou passar por essa discussão sem mostrar ao mundo do que sou capaz?




Precisamos ouvir por uma, duas, três horas monólogos que muitas vezes tem como efeito prático nada. Zero. Mas, enfim, são ministros e ministras e, aparentemente, devem nos ensinar tudo. O atraso ocasionado pelo ego é tão evidente, que tem incomodado alguns na corte, como quando o ministro Marco Aurélio disse ter “pena” dos jurisdicionados em geral, empurrados com a barriga enquanto o Supremo demora uma hora para transformar um 10×0 em um 11×0.

Dirá uma pessoa um pouco mais formal, que é esperável um julgamento tecnicamente diferenciado da mais alta corte do país. Outra um pouco mais atenta lembrará a simbologia de 11×0 acachapante em um tema sensível para a democracia, ou quando há uma grande emoção envolvida por parte da população – como a união homoafetiva, por exemplo. Ambos pensamentos têm grande valor.

Mas qual é a linha entre a fundamentação no julgamento e a vaidade pura e simples?

Vale lembrar que no caso específico brasileiro, optou-se por concentrar um caminhão de competências no Supremo, que julga desde as trilionárias dívidas da caderneta de poupança até onde deve tramitar um inquérito numa ação penal, passando por decisões de inconstitucionalidades de leis que afetam todo país.

Tudo isso para 11 pessoas. Loucura né? Cada um dos ministros com dezenas de milhares de ações sobre os mais variados temas se encontram todos duas vezes por semana (quarta e quinta) para discutir os casos levados a julgamento.

Por isso, quando um ministro decide se mostrar inteligente e decidir algo com zero reflexo prático, ao mesmo tempo admite adiar para um futuro indeterminado decisões que afetam em muitos aspectos as vidas de milhões de pessoas. Frise-se: nada é mais incompreensível que um dia inteiro de trabalho para julgar um caso que tem votação unânime e nenhum apelo emocional. É o famoso “debate de pessoas que concordam”.

Por isso, para responder qual é a linha entre vaidade e a necessidade de julgamento com conteúdo ou simbólico, uma lição já vale: bom senso.

Brenno Tardelli é advogado e diretor de redação do Justificando. 

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