Quando Conheci Neil Young

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Por Claudio Lovato, jornalista e escritor – 

             Copacabana, madrugada de 21 de janeiro de 2001…




 Eu estava num quiosque na Avenida Atlântica, na altura da rua Rodolfo Dantas, em frente ao Copacabana Palace, tomando cerveja, sozinho. Havia algumas poucas horas eu tinha vivido uma experiência mágica. Eu não cabia em mim.

A minha terceira lata de cerveja já ia pela metade quando, de repente, vi um sujeito de chapéu, camiseta branca e calça jeans caminhando na beira da praia. A primeira coisa que pensei foi: “Esse cara está se arriscando”.

Em certo momento, ele deu as costas ao mar e começou a caminhar em direção à calçada. Vinha bem na minha direção. Eu só havia tomado algumas cervejas a noite toda; portanto, estava nas minhas “faculdades”. O fato é que, conforme o cara se aproximava, fui reconhecendo-o. Porra, não tinha engano. Era ele. Neil Young! Fiquei com medo de enfartar.

Ele saiu da areia e subiu para o calçadão. O Marcinho Dedão, dono do quiosque, estava vendo TV e não se deu conta do que estava acontecendo. Aquela figura de chapéu – o meu grande ídolo, não só da música, mas de tudo o mais – ia passar direto por mim, mãos nos bolsos, cabeça baixa.

“Neil?”, eu disse, usando o tom mais controlado que consegui.

Ele parou, quando já estava, provavelmente, pensando em atravessar a rua, e disse:

How ya doin’, buddy?”

“Cara, me desculpa, eu não acredito que é você…”, eu disse, nervoso, no meu inglês bem mais ou menos.

Ele apontou displicentemente para uma cadeira de plástico amarelo e me perguntou:

“Posso me sentar aí?”

Não preciso dizer que eu não estava acreditando naquilo. E ia bater um papo com o cara que era o meu maior herói desde que eu tinha 16 anos.

“Claro, cara, por favor, senta aí…”

E depois, gaguejando:

“Você quer uma cerveja?”

Ele me respondeu de bate-pronto:

“Essa é uma boa ideia.”

Olhei para o quiosque, mas o Marcinho Dedão tinha sumido. (Daí eu não ter testemunhas desta história.)

Xinguei o Dedão em pensamento e fui pegar a cerveja. Voltei com duas latas bem geladas e fizemos um rápido brinde (um brinde com o Neil Young, cacete!).

“Você foi ao show?”, ele me perguntou.

“Quando cheguei lá ainda era começo da tarde”, respondi.

“Gostou?”

Fiquei olhando para ele enquanto pensava numa maneira de ser sincero sem parecer um fã babaca.

“Foi a realização de um sonho!”

Ele sorriu e olhou para cima, para as estrelas.

“Legal”, ele disse.

“Comecei a ouvir você quando eu tinha 16 anos”, eu disse, tentando a conter a torrente que ameaçava romper a represa. “O primeiro disco seu que eu comprei foi Hawks and Doves.”

“Anos 80. Tempos esquisitos. Mas quais não são?”

Ele bebeu a cerveja, direto da lata, e depois me perguntou:

“Você se lembra de qual foi a primeira música minha que você ouviu?”

 “Sugar Mountain”.

“Mesmo?”

“Sim. Num compacto de 1972. Era de um primo meu em segundo grau. Depois eu roubei aquele compacto.”

Ele deu uma risadinha de canto de boca e disse:

“Espero que você não tenha cumprido pena por isso.”

Os carros passavam na Avenida Atlântica, mas o calçadão estava deserto de pedestres.

“Vocês fazem uma música maravilhosa aqui”, ele disse.

“Você conseguiu ouvir alguma coisa?”

“Um dos nossos roadies me mostrou algumas coisas do Paulinho da Viola e do Chico de Buarque. Me perdoa a pronúncia. São geniais.”

Ele olhou para cima, como se estivesse tentando saber se ia dar praia dali a algumas horas, e disse:

“Bom, vou nessa antes que a Pegi mande o Frank, o Billy ou o Ralph atrás de mim.”

“Ou os três juntos”.

“É”, ele disse, rindo.

“O Crazy Horse completo.”

“É isso aí, cara”.

Ele se levantou, levou a mão ao bolso da calça jeans remendada, mas eu disse a ele que, por favor, a cerveja era por minha conta. Ele perguntou se eu tinha certeza e eu disse a ele:

“Quando eu for à Califórnia, você paga a cerveja.”

“Combinado”.

Ele levantou a mão e tocou a aba do chapéu.

“Se cuida, parceiro”, ele disse.

“Você também”.

Ele se afastou, olhou para o lado, esperou um pouco, atravessou e entrou no Copacabana Palace.

Tomei um susto quando o Marcinho Dedão gritou lá do quiosque:

“Vai querer mais uma? Vou fechar esta porra!”

Ele tinha acabado de voltar de um papo com a Virgininha, que trabalhava no quiosque vizinho.

Por que eu resolvi contar essa história só agora, mais de 15 anos depois? Não sei. Acho que é porque agora já estou suficientemente convencido de que ela aconteceu de verdade.

“Ain’t it funny how you feel when you’re finding out it’s real?” 

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