“Queiroz federal” de Bolsonaro foi o pivô da demissão do comandante do Exército

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O tenente-coronel Mauro Cesar Barbosa Cid, o Mauro Cid ou “coronel Cid”, como é conhecido, representou muito mais que o Queiroz para o esquema Bolsonaro. Era um “consiglieri” típico dos grupos mafiosos

Por Mauro Lopes, compartilhado da Revista Fórum




Bolsonaro e o coronel Mauro Cid.Créditos: PR

Nos filmes, livros e documentários sobre esquemas mafiosos, há sempre uma figura-chave: a do conselheiro do chefe. O mais famoso deles é Tom Hagen, personagem do clássico “O Poderoso Chefão”, interpretado por Robert Duvall. Era  “consiglieri” de Don Vito Corleone, interpretado por Marlon Brando.

Bolsonaro, que liderou o governo de um esquema mafioso-miliciano, tinha o seu conselheiro. O  tenente-coronel Mauro Cesar Barbosa Cid, o Mauro Cid ou “coronel Cid”, como é conhecido. Assim como o “consiglieri” de Corleone, o de Bolsonaro é muito mais jovem que ele, 25 anos, ambos com idade para serem filhos dos patrões. A juventude não os fez menos ouvidos e respeitados. Tinham ambos enorme influência sobre os chefes. 

Talvez seja até pecado compará-los aos personagens e atores do filme Coppola de 1972. Estes de agora são dois  canastrões, sinistros e patéticos. Mas a lógica da relação é semelhante.

Durante o governo Bolsonaro, Mauro Cid assumiu de fato o papel de conselheiro-geral do chefe, causando ciumeira no Palácio do Planalto. Mas nem o ciúmes nem as intrigas palacianas abalaram seu posto. Suas interferências alcançaram temas relacionados a saúde, economia, meio ambiente, questões jurídicas e sobre o que mais Bolsonaro tivesse dúvidas.

Mais que isso, descobriu-se agora, depois de findo o governo, graças a uma reportagem do Metrópoles, que o coronel Cid era mesmo o “Queiroz federal” e funcionava como responsável pelo caixa 2 dentro do Palácio do Planalto, com dinheiro vivo proveniente, de saques feitos a partir de cartões corporativos da Presidência e de quartéis das Forças Armadas. A troca de Queiroz por Cid foi um salto na carreira de Bolsonaro. Ele trocou um ex-subtenente da PM do Rio, envolvido em dez assassinatos, por um major ilustrado, que foi promovido a tenente-coronel pelo chefe. Trocou um PM tosco e iletrado por um doutor em Ciências Militares, fluente em inglês e espanhol, além de compreender bem francês e alemão.

Mauro Cid fez muito para Bolsonaro. Tanto fez que foi premiado. Ganhou a designação como comandante do 1º Batalhão de Ações e Comandos, o 1º BAC, uma das unidades do prestigiado e temido Comando de Operações Especiais, com sede em Goiânia. O  1º BAC reúne reúne as mais bem treinadas tropas de elite do Exército. Cid foi escolhido para o posto em maio de 2022, mas só o assumiria em fevereiro. 

A nomeação, ou melhor, a negativa do ex-comandante do Exército de revogá-la, por seu caráter escandaloso, foi a gota d’água para a demissão do general  Júlio César de Arruda neste sábado. A demissão deveu-se a um acumulado de gestos de insubordinação do general, mas foi o coronel Mauro Cid o pivô do ato final.

O acúmulo de escândalos ao redor do tenente-coronel causa espanto. E mais ainda que o Exército o tenha designado para um posto estratégico e de altíssimo prestígio. É uma evidência da simbiose entre o comando do Exército e Bolsonaro.  

O poderoso Mauro Cid

As relações entre as “famiglia” Bolsonaro e Cid são antigas. Mauro Cid é filho do general Mauro Cesar Lourena Cid, que foi colega do de Jair Bolsonaro no curso de formação de oficiais do Exército. Desde esse período, ambos mantêm uma grande amizade.

Seu nome ganhou notoriedade nesta sexta-feira (20), após reportagem de Rodrigo Rangel, do portal Metrópoles, apontar que investigações da PF, sob o comando do Supremo Tribunal Federal (STF), indicaram que ele operava um “caixa paralelo” de Bolsonaro na Presidência. 

Mas, muito antes disso, ele já era conhecido nos meios políticos, militares, no governo e na imprensa. 

Conselheiro-chefe de Bolsonaro, era criticado por integrantes do governo por supostamente se intrometer em assuntos que não lhe cabiam. Alguns o classificavam como excessivamente proativo e, por isso, capaz de criar embaraços desnecessários a Bolsonaro. Uma das reclamações passa pela forma como Cid atendia a demandas presidenciais, buscando respostas por meios próprios, em vez de recorrer às áreas técnicas do governo.

Cid tem admiração de Bolsonaro por sua fluência em línguas estrangeiras, e isso fez dele uma companhia inseparável em todas as viagens do então presidente. Ele era útil para pedir um lanche ao mesmo tempo que fazia a ponte entre Bolsonaro e os raros líderes estrangeiros que dele se aproximavam. Logo pela manhã, era função dele selecionar reportagens e textos da imprensa que considerava importantes para Bolsonaro. Além disso, recebia centenas de mensagens diariamente no WhatsApp com pedidos de audiência, recados e até denúncias para serem selecionadas e repassadas ao presidente.

Por conta disso, Cid funcionou com ponte entre Bolsonaro e os blogueiros e comunicadores de extrema direita. Sua relação com Allan dos Santos, o mais notório deles, foragido da Justiça brasileira, foi objeto de indagações da Polícia Federal em setembro de 2020, quando o então ajudante de ordens foi convocado a depor no inquérito sobre a organização e financiamento de atos antidemocráticos. A crise não abalou a posição de Cid. Após o episódio, Bolsonaro o chamou para dizer que nada mudaria na relação entre eles.

Em dezembro de 2021, a Polícia Federal (PF) concluiu que Mauro Cid, junto com Bolsonaro, cometeu crime por divulgar informações falsas sobre Covid-19. A acusação é de que Bolsonaro cometeu o delito de incitação a crime sanitário por estimular as pessoas a não usarem máscaras. O inquérito foi aberto a pedido da CPI da Covid por causa de uma “live” na qual o então presidente fez uma associação falaciosa entre o uso da vacina contra o coronavírus ao vírus da Aids. Mauro Cid continuou firme como uma rocha no Planalto.

Verdadeiro faz-tudo, Cid ainda ajudava o chefe do Executivo a preparar discursos e roteiros das transmissões ao vivo que ele faz pela internet, tarefas que não costumam ser entregues a ajudantes de ordens. 

Foi ele o autor da apresentação feita por Bolsonaro em 18 de julho 2022 aos embaixadores e diplomatas estrangeiros sediados no Brasil que se resumia a um ataque às eleições. Cid é também apontado como o responsável pelo erro na apresentação que viralizou nas redes sociais: a palavra “briefing” virou “brienfing”.

Veja:

O fim do governo Bolsonaro não conteve as crises ao redor e para o coronel Mauro Cid e agora, em janeiro, ele foi apresentado ao país como o “Queiroz federal” de Bolsonaro e como pivô da demissão do comandante do Exército.

Veja mais fotos da dupla Bolsonaro-Cid:

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