Ex-presidente da Bolívia alugou espaço na cabeça de Bolsonaro
Por Antonio Mello, compartilhado de Fórum
Um fantasma aterroriza Bolsonaro. É uma mulher boliviana que anda como um espectro pelas catacumbas da cabeça do ex-presidente, uma alma penada que o arrasta para dentro de seu pior pesadelo, o aterroriza por saber que devem partilhar um destino comum: a cadeia.
Esse fantasma tem nome e o mesmo cargo atual de Bolsonaro: ex-presidente. O nome dela é Jeanine Añez, a ex-presidente da Bolívia, condenada a dez anos de prisão junto com seu grupo golpista naquele país.
Na recente exibição da gravação da reunião do golpe entre Bolsonaro e seus ministros, em 2022, o ex-ministro da Justiça Anderson Torres exteriorizou o terror que Jeanine provoca no grupo e a certeza de seu destino comum:
“Mas eu queria começar com uma frase que a gente colocou aqui que eu acho muito verdadeira, e o exemplo da Bolívia é um grande exemplo para todos nós. Senhores, todos vão se f*der! Eu quero deixar bem claro isso. Porque se, eu não estou dizendo que, eu quero que cada um pense no que pode fazer previamente porque todos vão se f*der. Eu não tenho dúvida disso“, disse Torres.
O terror
Quando da votação na Câmara em favor do impeachment de Dilma, o então deputado Jair Bolsonaro deu seu voto infame, soprado em seu ouvido pelo filho Eduardo: “pela memória do coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, o pavor de Dilma Rousseff“.
Deveria ter saído preso dali e perdido seu mandato, por elogiar um torturador reconhecido pela Justiça brasileira como tal. Um ser ignominioso, que levou crianças pequenas para assistirem ao martírio da mãe.
Agora, o que Bolsonaro disse de Ustra serve para ele, numa virada da História: “Pela memória de Jeanine Añez, o pavor de Jair Bolsonaro“.
A ex-presidente interina da Bolívia foi condenada em junho de 2022 a 10 anos de prisão por violação de deveres e resoluções contrárias à Constituição daquele país.
Hoje, Jeanine está presa. E presos estão os comandantes militares envolvidos no golpe.
Na ocasião, Bolsonaro pareceu intuir que ali talvez estivesse traçado também seu destino:
“A turma dela perdeu (as eleições), voltou a turma do Evo Morales. O que aconteceu um ano atrás? Ela foi presa preventivamente. E agora foi confirmado dez anos de cadeia para ela. Qual a acusação? Atos antidemocráticos. Alguém faz alguma correlação com Alexandre de Moraes e os inquéritos por atos antidemocráticos? Ou seja, é uma ameaça para mim quando deixar o governo?”, questionou em junho de 2022, em visita a Orlando. [BBC]
Bolsonaro chegou a oferecer asilo político a ela aqui no Brasil, mas ela recusou achando que iria se safar. Assim como ele tem esperança de que aconteça com ele, por milagre.
Mas o fantasma dela atravessa seus pesadelos, arrasta correntes pelos corredores vazios, e o barulho da porta da cadeia se fechando ecoa e reverbera em sua cabeça aterrorizando suas noites intranquilas.
Añez tomou a cabeça de Bolsonaro de tal jeito que, em pânico, ele passou a falar mais baixo e pausadamente. Reúne-se com admiradores no quintal de sua casa em Angra para orar, com o intuito de causar pena.
Mas quem terá pena de um homem que, em plena pandemia, vociferou que os brasileiros deixassem de prantear seus mortos com a infame frase “Chega de mimimi!“?
Quem vai ter pena de um homem que zombou dos que morreram por falta de oxigênio em Manaus? Dos que ouviram como palavra de consolo do presidente “E daí, eu não sou coveiro?“.
Os golpistas do 8 de janeiro estão sendo condenados a mais de 17 anos de cadeia. Esse deve ser o piso de Bolsonaro. A ele devem ser somadas penas de outros incontáveis crimes, como falsificação de cartão de vacina, apropriação de relógios e outras joias. E os denunciados na CPI da Covid.
Crimes atribuídos a Bolsonaro pela CPI da Covid
1) Epidemia com resultado morte (art. 267 do Código Penal, § 1º)
“Causar epidemia, mediante a propagação de germes patogênicos”.
Pena: de dez a quinze anos de reclusão, com aplicação em dobro pela causa morte.
2) Infração de medida sanitária preventiva (art. 268 do Código Penal)
“Infringir determinação do poder público, destinada a impedir introdução ou propagação de doença contagiosa”.
Pena: de um mês a um ano de prisão e multa.
3) Charlatanismo (art. 283 do Código Penal)
“Inculcar ou anunciar cura por meio secreto ou infalível”.
Pena: três meses a um ano de detenção e multa.
4) Incitação ao crime (art. 286 do Código Penal)
“Incitar, publicamente, a prática de crime”.
Pena: três a seis meses de detenção ou multa.
5) Falsificação de documento particular (art. 298 do Código Penal)
“Falsificar, no todo ou em parte, documento particular ou alterar documento particular verdadeiro”.
Pena: de um a cinco anos de detenção e multa.
6) Emprego irregular de verbas públicas (art. 315 do Código Penal)
“Dar às verbas ou rendas públicas aplicação diversa da estabelecida em lei”.
Pena – de um a três meses de detenção ou multa.
7) Prevaricação (art. 319 do Código Penal)
“Retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal”.
Pena: três meses a um ano de detenção e multa.
8) Crimes de responsabilidade
Previstos na Lei nº 1.079, de 10 de abril de 1950, os crimes de responsabilidade “são passíveis da pena de perda do cargo, com inabilitação, até cinco anos, para o exercício de qualquer função pública, imposta pelo Senado Federal nos processos contra o Presidente da República ou Ministros de Estado, contra os Ministros do Supremo Tribunal Federal ou contra o Procurador Geral da República.”
O relatório final da CPI acusa Bolsonaro de ter infringido os arts. 7º, item 9 (violação de direito social) e 9º, item 7 (incompatibilidade com dignidade, honra e decoro do cargo).
9) Crimes contra a humanidade
O Tratado de Roma, do qual o Brasil é signatário desde 2002, estabeleceu a criação de um Tribunal Penal Internacional que pudesse julgar a ocorrência de genocídio, crimes contra a humanidade, crimes de guerra e crime de agressão.
A CPI acusa Bolsonaro de ter cometido crimes contra a humanidade nas modalidades extermínio, perseguição e outros atos desumanos, contidos no art. 7º, parágrafo 1, b, h e k, e parágrafo 2, b e g. [CNN]