Razões de uma insônia coletiva

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Por Ulisses Capozzoli, jornalista

Pesquisa informal sugere que é grande o número de pessoas com insônia, para quem soníferos não são solução. O problema, neste caso, não é pessoal, mas coletivo, o que significa dizer que trata-se de uma questão de saúde social. E um problema social provocado por motivos reais como a mudança acelerada nos padrões de vida, com risco de perda de emprego e as consequência que isso pode trazer. O número de marginalizados, vivendo em barracas ou sob marquises nas grandes cidades é uma demonstração cotidiana dessa ameaça real. Mas há outras razões.




No Brasil, a ressaca do fascismo, de que julgávamos livres, provoca retrocessos ainda não dimensionados de uma parcela que pode se equiparar à metade da população, sem condições de reflexão com conteúdo minimamente crítico, o que provoca corrosão da postura mais sensível, sob todos os aspectos sociais, do governo Lula, recém empossado.

A parte visível desse iceberg social é o neopentecostalismo, o Cavalo de Tróia que o sul escravista dos Estados Unidos implantou aqui para surfar na escabrosa exploração da fé, ao mesmo tempo em que freia, de forma conveniente para o império, mudanças indesejáveis. E uma consideração de passagem, para não parecer uma afirmação reducionista: a sociedade americana é complexa suficiente para não permitir simplificações, mas isso não anula raciocínios mais localizados.

O congresso nacional é parte significativa desse contexto devido ao estilo senhorial que cultiva e também resultado histórico de um processo de escravização ainda longe de extinto, apesar do 13 de maio de 1888. Isso de um ponto de vista interno.

No cenário externo as condições não são menos duras. A emergência em alta voltagem da inteligência artificial (IA) é uma questão clara para inteligências mais refinadas mas, ao mesmo tempo em que fascina, também assusta parcelas menos sensibilizadas para capacidade de um juízo mais crítico.

Aqui pode se dizer que uma condição instintiva, do que vem por aí, certamente atua de maneira ainda não devidamente destrinchada, mas é real. Uma Idade Mágica da humanidade ainda não foi extinta e talvez nunca seja e em última instância talvez ela seja o última recurso para uma busca de sobrevivência.

O conflito entre Rússia e Ucrânia (na verdade um falso conflito, porque se trata de um choque de interesses com os Estados Unidos, determinados a manter a polaridade de poder que prevalece desde o fim da Segunda Guerra Mundial). A consciência dessa situação, que pode levar a um conflito nuclear (que Albert Einstein profetizou com ironia que, se ocorrer, terminará com adversários lutando com “pedras e paus”) é de compreensão crítica ainda mais difícil por parte da maioria das pessoas, por falta de capacidade de raciocínio elementar combinado a uma carência de dados reflexivos ainda mais fundamentais, legado clássico do processo de escravização entre nós.

A essa altura certamente é o caso de se deixar claro que Vladimir Putin não é alguém a que se possa referir como “flor que se cheire”, mas essa não é a questão central. O fundamental, aqui, é perceber que o que os Estados Unidos pretendem é praticar o que recusaram em 1962, com a crise de mísseis em Cuba, ou seja, ameaçar a Rússia (17 milhões de quilômetros quadrados de área, o dobro da área do Brasil com recursos naturais abundantes em todas as áreas estratégicas) de bem perto.

Putin vem advertindo que não aceita essa posição e gente bem informada como o ex-secretário de Estado americano, o intervencionista Henry Kissinger (99 anos) vem prevenindo sobre essa situação ao longo de pelo menos as duas últimas décadas.

Para o grande público a guerra é um horror, o que de fato é mesmo, na verdade o horror dos horrores, mas exatamente isso deveria fazer as pessoas refletirem sobre as razões de uma guerra que, em princípio, não interessa a ninguém. Sobretudo uma guerra nuclear. Mas aqui sobram opiniões/lamentos e falta raciocínio para inteligibilidade indispensável.

A guerra na Ucrânia (parte indissociável da própria Rússia e, ainda mais, do que foi, por curto espaço de tempo a União Soviética) está intimamente associada ao estágio de ruptura do monopólio do poder econômico-militar por parte dos Estados Unidos desde o final da Segunda Guerra Mundial e aí a China entra em cena.

Para compreensão mínima da posição política da China certamente é o caso de se pensar sobre as Guerras do Ópio, do século 19, provocadas pela truculência do imperialismo inglês que, como um polvo gigante sugou, por boa parte da história contemporânea, países do mundo inteiro. Antes de ser derrubado exatamente pelos Estados Unidos que passaram a ser os detentores dessa posição intervencionista de acordo com interesses unilaterais.

Uma postagem no Face deve ser curta, com a intenção de provocação (expressão que deriva do latim “provocare”, com sentido de “fazer falar”, o que leva à inevitabilidade de um “fazer pensar”.

Imagem: Tentação de Santo Antão/Salvador Dali.

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