Por Ulisses Capozzoli, jornalista. Mais um texto denso, forte e emocionante como uma chuva de verão.
De brinde, neste belo texto, Caetano Veloso cantando “Chuvas de Verão”, de Fernando Lobo. Ressentimentos passam como o vento / São coisas de momento / São chuvas de verão….
As primeiras chuvas de verão. Ao menos por aqui (São Paulo, Capital). Poderosas, ruidosas, precedidas de ventos fortes, mensageiros do que chega em poucas horas. Peguei essas tempestades, hoje mesmo, mais ao norte. O leito da autopista transformado em rios, corredeiras, trazendo plantas aflitas arrancadas do leito, terra vermelha por enorme concentração de ferro.
O ferro que faz com que o sangue de nossos corpos seja vermelho, rubro, de muitas maneiras incandescente, antes de ser azul e branco, as temperaturas máximas. Vale para o chama do fogão doméstico, o “fogo” que no Brasil colonial identificava uma casa, vivendas de famílias dilatadas.
Duas a três gerações sob o mesmo teto. Se um livro antigo cair nas suas mãos e lá estiver registrado um certo número de “fogos”, entenda como um determinado número de casas, moradias, vivendas. Abrigos humanos.
Chuvas poderosas, com inúmeros automóveis de rodas para o ar na autopista, resultado da enorme quantidade de energia absorvida pela Terra por ter uma face, devidamente inclinada, voltada para o Sol ao longo de alguns meses do ano, o ano, a quantidade de tempo que a Terra precisa para completar um ciclo, uma volta, um giro, como uma bailarina em torno do Sol: a idade que você tem.
Quer fazer uma brincadeira divertida? Então, anote. Uma volta inteira da Terra, em torno do Sol tem, em média, 950 milhões de quilômetros e se você multiplicar a idade que tem, digamos (tô bonzinho hoje) 40 anos. A multiplicação de 950 por 40 dará o que? Te digo: 38 bilhões de quilômetros. Então, só em torno do Sol, até os 40 anos, você viajou 38 bilhões de quilômetros.
Muito? Nem tanto. O Sol também se desloca num voo em que leva junto todo o Sistema Solar (os outros planetas, com suas luas todas) os cometas e os asteroides periódicos, aqueles que foram gravitacionalmente capturados pelo Sol, com sua musculatura poderosas.
O Sol voa à velocidade de 19 km/segundo (esse voo tem um nome, Ápex Solar) que soma (aproximadamente) 28 mil quilômetros a cada dia. Então multiplique esses 28 mil por 365 e terá outros 10 milhões (aproximado) ao final de cada ano que, multiplicado pelos 40 anos de sua vida, chegarão a 400 milhões de quilômetros que, acrescido dos 38 bilhões chegarão próximos de 40 bilhões de quilômetros.
Ah! Mas tem um outro efeito e quase me esqueço dele. O volume do espaço (do Universo inteiro) também está se expandindo. Quanto? Para alguém que nos observe dos limites do universo observável (até onde podemos ver, com os telescópios mais poderosos disponíveis) viajamos à velocidade da luz. Mas, se pudéssemos observar outros viajantes nos limites do universo observável), diríamos que eles é que estão se afastando de nós.
Então, só neste caso teríamos 9,5 trilhões de quilômetros por ano que, multiplicado pelos 40 anos de sua jovem vida, dariam 380 trilhões de quilômetros de viagem. Some tudo (sem precisar levar ao forno) e descobrirá que você não tem a mínima noção de quanto viajou se dispusesse de um referencial inercial, o que significa dizer, um suposto ponto fixo, uma espécie de farol em terra firme, enquanto você se desloca no oceano cósmico e isso se não me enganei na passagem de um desses simples cálculos com números abissais.
E tudo isso motivado por uma chuva de verão, que caia há pouco com a fúria de todos os deuses reunidos, depois de esgotarem inúmeras garrafas de vinho. Mas com a efemeridade típica das tempestades, ela já se foi.
O único que se pode sentir agora, na verdade, ouvir, são os restos de trovões ecoando nas profundezas do céu, em ondas que se superpõem, um longo “BRRRUUUUuuummmnnn…
A tempestade que se afasta do ponto em que estamos para levar toda sua pirotecnia para outra regiões e tudo porque é verão e é verão no hemisfério Sul porque essa face da Terra, devido a sua órbita inclinada, está mais exposta à radiação solar.
Ao menos até o 22 de março, quando começa o outono e o Sol aparentemente parecer cruzar o equador para visitar o hemisfério norte. Muita gente, apesar de este ser um texto escrito, teima em dizer que isso está errado, porque o Sol não faz esse movimento. Se esquecem de considerar a expressão “APARENTE”, escrita com todas as letras, ou seja, parece que é aos nossos sentidos, mas não é de verdade devido ao fato de a Terra ser oblóide, esférica, se quiserem.
Mas isso, óbvio, para quem raciocina com base em uma Terra de forma esférica porque o pessoal da “terra plana” tem outros conceitos e nunca me ocorreu pensar onde eles buscam explicações para tudo o que consideramos nesta rapidíssima conversa sobre chuva de verão.
Pode parecer até que fomos longe demais, mas isso é ilusão, tanto quanto a ideia de que na base do arco-íris tem um pote de ouro. O problema é que, se você se deslocar, o arco-íris acompanhará o seu movimento, numa fuga propositada. Brincando com as suas noções de realidade.
Você, eventualmente pode considerar que a realidade é tão sólida quanto um tijolo, ainda que um tijolo, de um ponto de vista atômico, seja apenas um grande vazio.
Mas o pessoal que enxerga a realidade como se fosse um tijolo não sabe disso, portanto não perca tempo discutindo com eles.
O tempo de cada um de nós na Terra é curto. Curtíssimo e, por isso mesmo, precioso.
“Chuvas de Verão” (Fernando Lobo)