Estudo mostra São e Rio de Janeiro entre as metrópoles com períodos de estiagem cada vez mais prolongados; crise climática provoca alterações extremas
Por Oscar Valporto, compartilhado de Projeto Colabora
na foto: Distribuição de água durante período de seca e calor em São Paulo: 100 cidades mais populosas do mundo estão se tornando cada vez mais expostas a inundações e secas (Foto: Paulo Pinto / Agência Brasil – 11/02/2025)
As 100 cidades mais populosas do mundo estão se tornando cada vez mais expostas a secas e inundações, colocando em risco a segurança e a sobrevivência de suas comunidades, de acordo com estudo, desenvolvido por pesquisadores das universidades de Bristol (Inglaterra) e Cardiff (País de Gales) com a WaterAid, ONG internacional com foco no acesso à agua. A crise climática vêm levando a mudanças extremas no nível de precipitação nas metrópoles. Quase 1 em cada 5 (17%) das cidades estudadas emergem como experimentando “chicote climático” — a intensificação de secas e de inundações — e 20% das cidades testemunharam grande mudança de um extremo para o outro.
As duas maiores cidades brasileiras (as únicas entre as 100 mais populosas) aparecem no ranking das cidades que vêm sendo mais atingidas por secas extremas – São Paulo em 13º lugar, o Rio de Janeiro em 20º: as capitais passaram por longos períodos de estiagem, em meio a ondas de calor, nas primeiras semanas de 2025. “Lugares que eram historicamente úmidos estão se tornando secos e vice-versa. Outros lugares agora são cada vez mais atingidos pelos dois eventos – inundações e secas extremas. Uma compreensão mais profunda dos riscos climáticos localizados pode dar suporte a um planejamento mais inteligente e personalizado nas principais cidades”, afirmou Katerina Michaelides, professora de Hidrologia na Universidade de Bristol e uma das líderes da pesquisa.
O relatório mostra como as cidades do sul da Ásia estão se tornando extremamente propensas a inundações e as cidades europeias estão exibindo tendências significativas de seca, tudo isso pode impactar o acesso das pessoas à água limpa e a segurança hídrica. Todas as cidades europeias analisadas exibem tendências de seca nos últimos 42 anos, incluindo Madri, Paris e Londres – o que pode levar o continente a enfrentar secas cada vez mais frequentes e duradouras.
À medida que a natureza e a intensidade dos riscos naturais mudam, seus impactos nas comunidades urbanas serão significativamente moldados por vulnerabilidades sociais e de infraestrutura. Em outras palavras, o risco não é apenas sobre a chance de uma inundação ou seca ocorrer, mas também sobre o o quanto as comunidades estão preparadas para lidar com esses riscos
Sean Fox
Professor da Universidade de Bristol
Madri e Barcelona mostram “inversões de risco climático”, com Madri em segundo lugar na lista de cidades que experimentam uma mudança para condições de seca extrema. “Um resultado interessante deste estudo é como muitas das tendências de risco climático parecem se espalhar por regiões amplas, sugerindo que pode haver desafios significativos de adaptação a novos regimes de risco, mas também oportunidades regionais de colaboração entre nações para se tornarem mais resilientes às mudanças climáticas em centros urbanos”, disse o professor Michael Singer, vice-diretor do Instituto de Pesquisa da Água da Universidade de Cardiff, no anúncio do resultado da pesquisa.
Dos 20% de cidades que enfrentam “inversões de risco climático”, cerca de 13% estão mudando para um clima úmido mais extremo, enquanto os 7% restantes estão mudando para um clima seco mais extremo. Essa alternação climática afeta mais de 250 milhões de pessoas globalmente em cidades como Kano, cidade de quase 4 milhões de habitantes no norte da Nigéria, Bogotá na Colômbia e Cairo no Egito, limitando significativamente o acesso à água segura e limpa. “As descobertas do nosso estudo ilustram o quão diferente e dramaticamente as mudanças climáticas estão se expressando ao redor do globo – e não há uma solução única para todos”, acrescentou Katerina Michaelides.
O estudo compara as vulnerabilidades sociais e de infraestrutura hídrica de cada cidade com novos dados sobre riscos climáticos abrangendo 40 anos para identificar quais são os mais vulneráveis a mudanças climáticas extremas e os menos equipados para lidar com elas. As vulnerabilidades examinadas variam de pobreza a sistemas precários de água e coleta de resíduos. Inundações urbanas severas podem danificar instalações de saneamento, espalhando doenças, enquanto as secas prolongadas podem deixar milhões de famílias sem acesso à água potável. Os pontos críticos de risco elevado compreendiam duas regiões principais: sul e sudeste da Ásia e norte e leste da África.
As cidades identificadas como mais vulneráveis incluem Cartum, no Sudão, Faisalabad e Lahore, no Paquistão, Bagdá no Iraque, e Surabaya na Indonésia, Nairóbi no Quênia, e Addis Ababa na Etiópia. “À medida que a natureza e a intensidade dos riscos naturais mudam, seus impactos nas comunidades urbanas serão significativamente moldados por vulnerabilidades sociais e de infraestrutura. Em outras palavras, o risco não é apenas sobre a chance de uma inundação ou seca ocorrer, mas também sobre o o quanto as comunidades estão preparadas para lidar com esses riscos”, explicou o economista Sean Fox, professor de Desenvolvimento Global na Universidade de Bristol.
Cidades europeias – como Barcelona, Berlim e Paris – aparecem com risco maior do que aquelas na América do Norte e Austrália, devido à infraestrutura de água e esgoto envelhecida do continente, potencialmente deixando as populações urbanas mais expostas.
Os especialistas da WaterAid afirmaram que 90% de todos os desastres climáticos são causados por muita ou pouca água, citando a seca recente em metrópoles como Madri e a Cidade do Cabo, na África do Sul, e as inundações em larga escala em cidades de Bangladesh e Paquistão. “A pesquisa destaca as mudanças devastadoras nos padrões climáticos extremos em todos os continentes, com o impacto sentido mais claramente em países de baixa renda, onde a ausência de água se torna não apenas um desafio, mas uma questão de vida ou morte”, disse Tim Wainwright, presidente-executivo da WaterAid no Reino Unido.
Presente em 22 países, a organização trabalha com parceiros locais para garantir que as pessoas tenham a água de que precisam para se adaptar aos impactos das mudanças climáticas – inclusive em ambientes urbanos e suas periferias. “Esta pesquisa chega em um momento crucial, pois estamos vendo uma onda de cortes globais de ajuda, o que pode deixar os direitos humanos básicos em jogo”, lembrou Wainwright, em referência a medidas do Governo Trump para reduzir drasticamente programas de auxílio internacional dos EUA. “Inundações e secas estão destruindo a base de sobrevivência das pessoas — a água. Mas com um suprimento confiável de água limpa, as comunidades podem se recuperar de desastres, permanecer saudáveis e estar prontas para o que quer que o futuro reserve. Tudo começa com água limpa”, acrescentou.
Oscar Valporto é carioca e jornalista – carioca de mar e bar, de samba e futebol; jornalista, desde 1981, no Jornal do Brasil, O Globo, O Dia, no Governo do Rio, no Viva Rio, no Comitê Olímpico Brasileiro. Voltou ao Rio, em 2016, após oito anos no Correio* (Salvador, Bahia), onde foi editor executivo e editor-chefe. Contribui com o #Colabora desde sua fundação e, desde 2019, é um dos editores do site onde também pública as crônicas #RioéRua, sobre suas andanças pela cidade
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