Enquanto vários países europeus intensificam os seus esforços na preparação da população para situações de crise, especialistas alertam para a falta de planeamento em Portugal.
Compartilhado de Executive Digest
A inexistência de medidas concretas e informação acessível pode deixar o país vulnerável em caso de uma crise inesperada, como um desastre natural, um conflito armado ou uma ameaça nuclear.
Nos últimos meses, vários países europeus lançaram manuais de sobrevivência com instruções claras para as populações. O governo francês, por exemplo, anunciou a distribuição de um documento de 20 páginas com diretrizes sobre como agir em situações de emergência. Polónia, Finlândia, Suécia e Noruega seguiram a mesma estratégia, destacando a importância de preparar os cidadãos para cenários de guerra. Contudo, em Portugal, esta mobilização é inexistente.
O major-general Isidro de Morais Pereira considera que o país está a subestimar os riscos. “É uma ameaça à nossa forma de vida, à nossa liberdade, à nossa democracia e à nossa tolerância. Se queremos preservar a nossa forma de viver, temos de nos proteger. Portugal deve seguir o exemplo de outros países europeus que já estão a tomar medidas e a orientar as populações”, afirmou à CNN Portugal. O especialista em Proteção Civil Duarte Caldeira também sublinha que a falta de preparação em Portugal é “total” devido a um “défice tremendo de informação”. “A generalidade dos cidadãos portugueses nunca passou por um conflito bélico nem recebeu qualquer tipo de formação nesse sentido. As pessoas não sabem que medidas de autoproteção devem adotar numa situação destas”, alertou.
A preocupação com a defesa civil é partilhada pela União Europeia, que anunciou uma estratégia de preparação para tempos de crise, garantindo que tanto a população civil como as autoridades estejam prontas para enfrentar situações de emergência. Nos países nórdicos, por exemplo, a distribuição de manuais de sobrevivência é uma prática antiga: a Suécia emitiu o seu primeiro folheto durante a Segunda Guerra Mundial. Em contraste, em Portugal, o único material informativo da Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil centra-se no risco sísmico, deixando de lado outros cenários.
A defesa civil também implica a criação de infraestruturas adaptadas para emergências. A Alemanha está a desenvolver uma aplicação que indica os bunkers mais próximos em caso de ataque, e a Polónia inclui nos seus manuais informações sobre sistemas de alerta, abrigos antiaéreos e segurança digital. “O que é que nós temos em Portugal? Temos a rede metropolitana, algumas instalações militares e alguns parques de estacionamento subterrâneos, mas tudo isto precisa de ser adaptado. É necessário um plano sério para transformar estas estruturas em locais seguros para a população em caso de ataque”, defendeu o major-general Isidro de Morais Pereira.
Outra vertente crucial da preparação é o financiamento da defesa. A França anunciou um fundo de 450 milhões de euros exclusivamente para a Defesa, seguindo o exemplo da Alemanha. Polónia, Estónia, Letónia, Finlândia e Suécia também anunciaram um reforço dos orçamentos militares, beneficiando da flexibilização das normas fiscais da União Europeia para este setor. O major-general defende que Portugal deveria seguir a mesma abordagem. “É essencial criar um fundo de Defesa para cobrir as principais lacunas do país, e a prioridade deve ser a aquisição de sistemas de defesa antiaérea. Não temos capacidade para defender os nossos órgãos de soberania. Se Portugal for atacado por um míssil antibalístico dirigido à Assembleia da República, não temos maneira de o parar”, alertou.
Diante deste cenário, os cidadãos também podem tomar medidas individuais para se protegerem em caso de crise. Duarte Caldeira recomenda que cada família tenha um “kit de sobrevivência” com mantimentos não perecíveis, água, enlatados, pilhas, lanternas, um rádio e um conjunto de primeiros socorros. O governo francês vai mais longe e aconselha a manter jogos de tabuleiro ou cartas para entreter as crianças durante situações de confinamento. No entanto, Duarte Caldeira alerta que estas soluções individuais têm limites. “Nenhuma família pode sustentar-se sozinha durante longos períodos de crise. Isso é inviável. Têm de ser as autoridades, devidamente organizadas, a garantir esse apoio logístico”, concluiu.