Se “Cry Macho” for o último filme de Clint Eastwood, faz sentido

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Faroeste em cartaz na HBO Max tem como protagonista caubói que anda com chapéu na cabeça, mas sem arma na cinta

Por Irinêo Baptista Netto, compartilhado do Site Plural




A certa altura do filme “Cry Macho”, uma família está pronta para jantar. O cozinheiro é Mike, caubói que fez fama em rodeios muito, muito tempo atrás. Agora, ele é só um velho mal-humorado que lida com a vida como se ela fosse uma sequência interminável de aporrinhações. Mas pelo menos o jantar parece ser uma exceção.

Ele serve a comida e assume seu lugar à mesa. E é nesse momento que o velho caubói arrasta a cadeira pelo espaldar, apoia a mão esquerda na mesa e, por três longos segundos, cede devagarinho até sentar. Bem devagarinho, como a pessoa de idade que ele de fato é.

Seria uma cena trivial se o homem velho de movimentos lentos, aquele senhor frágil, não fosse Clint Eastwood. Nunca o autor se mostrou tão vulnerável – e já não era sem tempo.

Faz décadas que Eastwood interpreta personagens velhos e ranzinzas, mas eles eram sempre cheios de brios. Sempre com um último serviço a fazer. Em alguns casos, o serviço envolvia uns tiroteios aqui e ali. A situação é diferente em “Cry Macho”. Essa é a primeira vez que Eastwood, que também dirige o filme, aparece com um chapéu de caubói na cabeça, mas sem uma arma na cinta. Numa história em que nenhum tiro é disparado.

Não se pode dizer que Mike é cheio de brios. Porém, ele também tem um último serviço a fazer: buscar um adolescente no México e trazê-lo para o Texas. O garoto é Rafael, filho do fazendeiro que ajudou Mike no pior momento de sua vida, quando ele perdeu a esposa e o filho em um acidente de carro. Rafo está sendo explorado pela mãe mexicana da pior maneira possível, daí o pai querer resgatar o rebento.

Mike pega sua caminhonete, encara a estrada e encontra Rafo no submundo de uma cidadezinha mexicana. Para escapar dos abusos da mãe, o guri vive nas ruas, ganhando dinheiro em rinhas com a ajuda de seu bicho de estimação: um galo chamado Macho.

O galo, imagine você, é uma metáfora pouco sutil e às vezes engraçada. Os americanos usam cock também para se referir ao pênis. Que o cock se chame Macho é só uma das piadas possíveis com o bicho, algumas delas feitas pelo próprio filme.

O trio Mike, Rafo e Macho pegam a estrada de volta para os Estados Unidos. É na estrada que boa parte da história se desenrola. Num diálogo-chave, Rafo começa dizendo que Mike era alguém importante no passado porque frequentava rodeios, montava touros e domava cavalos. “Você era forte. Macho. E agora você não é nada”, diz o menino.

“É”, diz Mike. “Eu era várias coisas, mas não sou mais. E vou te contar uma coisa: isso de ser macho é besteira. Funciona para ele [o galo], mas é besteira.”

Mike está ao volante, olhando para a estrada: “É como tudo na vida. Você acha que sabe as respostas. Mas, quando fica velho, se dá conta de que não sabe resposta nenhuma. E você só entende isso tarde demais.”

Quem está dizendo isso é Mike Milo, um caubói que viu sua carreira terminar depois de fraturar a coluna ao cair de um cavalo. Mas não se pode ignorar que quem está dizendo isso também é Clint Eastwood: “Isso de ser macho é besteira”.

Ver esse senhor frágil de 91 anos em sintonia com os tempos atuais é impressionante. Se esse for seu último filme, terá sido uma bela despedida.

“Cry Macho” acabou de estrear no serviço de streaming da HBO Max.

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