Sebastião Salgado e a natureza intocada em ‘Gênesis’

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Uma jornada fotográfica por lugares intocados, onde o homem convive em harmonia com a natureza. Um hino visual à grandeza e à fragilidade da Terra.

Por Revista Prosa Verso e Arte




Em “Gênesis”, projeto em que Sebastião Salgado, durante oito anos, fotografou recantos intocados do planeta, o seu tempo de formiguinha o levou, por exemplo, a caminhar 850 quilômetros, a pé, nas montanhas no Norte da Etiópia, no que diz ter sido “a viagem mais fabulosa” de sua vida. Salgado cruzou o mundo, visitando 32 regiões extremas. Suas lentes registraram imagens impactantes, a divindade e fragilidade da natureza, além da sua relação com o homem e os animais.

“…A humanidade é uma espécie sem saída. Não somos uma espécie sustentável, destruímos tudo à nossa volta ao ponto de haver lugares onde já não é possível viver por causa da nossa destruição. A única espécie realmente predadora somos nós. Quando terminei Migrações não acreditava na espécie humana, como não acredito até hoje. Fiquei desesperado, porque os humanos eram a minha única referência. Mas depois, quando comecei a replantar uma floresta na nossa quinta no Brasil (Vale do Rio Doce, Aimorés), quando decidimos fundar o Instituto Terra e depois da concretização de Gênesis comecei a viver em paz. Compreendi que se a nossa espécie desaparecer, sobreviverão muitas outras, a das formigas, a dos camaleões, a dos rinocerontes… São espécies tão importantes como a nossa. […] Se não mudarmos o nosso comportamento em relação à natureza, vamos desaparecer. E o certo é que não estamos mudando esse comportamento, pelo contrário, estamos usando cada vez mais espaços que não são os nossos. Mas, hoje, vivo em paz porque me aproximei tanto da natureza que me tornei natureza.”
– Sebastião Salgado, em entrevista a Sérgio B. Gomes | Público. 26.3.2015.

Sebastião Salgado | ©Amazonas images – ‘Gênesis’: Vista da confluência do Colorado e do Little Colorado, a partir do território dos navajos, no Parque Nacional do Grand Canyon, Arizona, EUA, em abril de 2010.
Sebastião Salgado | ©Amazonas images – ‘Gênesis’: Iceberg entre a ilha Paulet e as ilhas Shetland do Sul no mar Weddell, na península Antártida, em 2005.
Sebastião Salgado | ©Amazonas images – ‘Gênesis’: Filhotes de elefante marinho na baía de Saint Andrews. Geórgia do Sul, 2009.
Sebastião Salgado | ©Amazonas images – ‘Gênesis’: Perseguidos por caçadores furtivos na Zâmbia, os elefantes (Loxodonta africana) têm medo dos homens e dos veículos, e geralmente, entram rapidamente no mato, assustados. Parque Nacional de Kafue, Zâmbia, 2010.
Sebastião Salgado | ©Amazonas images – Leões-marinhos (Zalophus californianus) em Cerro Brujo, na Ilha de São Cristóvão. Leões-marinhos são comuns em todas as ilhas que têm praias arenosas, mas, na verdade, eles estão por toda parte. Galápagos, no Equador, em 2004.
Sebastião Salgado | ©Amazonas images – Um iguana-marinho (Amblyrhynchus cristatus) junto a um atobá-grande (Sula dactylatra) em Punta Suarez, na Ilha Espanhola. Os iguanas-marinhos são bem especiais, eles são grandes (até 1,20 m) e têm uma cor brilhante. Galápagos, Equador, 2004.
Sebastião Salgado | ©Amazonas images – Tartaruga-gigante-das-galápagos na orla da cratera do vulcão Alcedo, na Ilha Isabela. Podem pesar até 250 quilos e viver mais de 150 anos. Galápagos, Equador, em 2004.
Sebastião Salgado | ©Amazonas images – ‘Gênesis’: Pinguins-de-barbicha (Pygoscelis antarctica) sobre icebergs localizados entre as ilhas Zavodovski e Visokoi, nas Ilhas Sandwich do Sul, em 2009.

“Se existe um Deus esse Deus é a natureza. É certo que as teorias que foram criadas em torno da evolução natural são muito estritas, tão estritas como se crê que Deus seja estrito. As regras da natureza são invioláveis, não falham, a justiça que a natureza pratica às vezes custa a chegar, mas ela chega. Estas duas dimensões são muito parecidas. Se existe um enviado pelo senhor da natureza, esse homem é Darwin. Eu não sou crente. Não acredito em religião nenhuma. Mas creio que existe uma ordem criada pela evolução. Escolhi as ilhas Galápagos como a primeira viagem de Gênesis para tentar compreender o que Darwin compreendeu. Li o diário dele e pude perceber onde ele esteve exatamente em Galápagos. Tentei ir aonde ele foi, tentei ver a vida que ele viu, ir às crateras e aos vulcões que ele descreveu. Foi muito importante compreender a vida daquelas tartarugas gigantes, das iguanas, sentir a evolução através destes animais. Sentir que a evolução surge de uma maneira diferente em cada uma daquelas ilhas, dependendo de cada um dos seus ecossistemas. Foi uma lição fantástica. Quando a compreendi, fui embora.”
– Sebastião Salgado, em entrevista a Sérgio B. Gomes | Público. 26.3.2015.https://1ad89ba07ea2547a029243a0cf6b0fa8.safeframe.googlesyndication.com/safeframe/1-0-38/html/container.htmlx

Sebastião Salgado | ©Amazonas images – ‘Gênesis’: Teureum, sikeirei (xamã) e chefe de clã da tribo Mentawai. Este xamã está preparando um filtro para o sagu, a partir das folhas do próprio saguzeiro. Ilha Siberut, Sumatra Ocidental. Indonésia, 2008.
Sebastião Salgado | ©Amazonas images – ‘Gênesis’: No Alto Xingu, Mato Grosso, índios waurá pescam na lagoa Piyulaga, perto da sua aldeia. Mato Grosso, Brasil, 2005.
Sebastião Salgado | ©Amazonas images – ‘Gênesis’: Quando o clima é particularmente hostil, os nenets e suas renas podem passar vários dias no mesmo lugar. Norte do Golfo de Ob, dentro do círculo ártico, na península de Yamal, na Sibéria, Rússia, em 2011.
Sebastião Salgado | ©Amazonas images – ‘Gênesis’: Quando o clima é particularmente hostil, os Nenets e suas renas podem passar vários dias no mesmo lugar. Norte do Golfo de Ob, dentro do círculo ártico, na península de Yamal, na Sibéria, Rússia, em 2011.
Sebastião Salgado | ©Amazonas images – ‘Gênesis’: Grandes dunas entre Albrg e Tin Merzouga, Tadrart, no sul de Djanet, Argélia, em 2009.

“Mas eu fui ver a terra. Caminhei muito, muito. Subi a montanhas… Lembro-me que no Alasca um aviãozinho largava-me num ponto e vinha-me buscar dez dias depois, ou duas semanas depois, dependendo do clima. Ficava em paz, sozinho. Subi àquelas montanhas a aprender a ver o meu planeta, a integrar-me nele. A partir de um momento era parte daquele todo. Quis muito olhar o todo. Fui o anão e o gigante ao mesmo tempo, porque eu também sou natureza, estive ligado a tudo. O nosso planeta é de uma beleza, de uma vastidão, de uma vivacidade… Tudo é vivo. Havia montanhas que imaginava mortas, mas elas são mais vivas do que eu. Se tivesse a capacidade de ver a natureza em milhares de anos, eu perceberia que aquilo tudo era móvel. Montanhas jovens, a crescer, ou velhas, a erodir e a renascer outra vez. Estive em cima de rochas que tinham um dia de existência. Tive de levantar um pé e pousar o outro por causa da temperatura com que vinham dos vulcões. Assim como estive em cima das rochas mais antigas do mundo, que ficam nas montanhas Guiana, na Venezuela. Foi um privilégio.”
– Sebastião Salgado, em entrevista a Sérgio B. Gomes | Público. 26.3.2015.

Sebastião Salgado | ©Amazonas images: O Lado Oriental de Brooks Range, Arctic National Wildlife Refuge, Alasca, EUA, 2009.

“Tenho uma enorme admiração pelo continente africano. Para os brasileiros, África tem uma conotação muito especial, mesmo que a maioria dos brasileiros não a compreenda inteiramente. Há 150 milhões de anos o continente africano e o americano eram um só. Basta olhar para os contornos dos continentes do lado atlântico. Eles encaixam. O que nós no Brasil temos de minerais, do lado africano também tem, os vegetais, apesar de uma certa evolução, também não são tão diferentes assim. Houve um movimento de população importante iniciado com o comércio de escravos pelos portugueses. Uma das grandes componentes raciais brasileira é a africana. Para mim, a África terá sempre uma conotação especial. É o continente principal. Se a Etiópia é o umbigo do mundo, a África é a cabeça do mundo. É um continente completo, em culturas, em línguas, em história. É muito especial para mim.
– Sebastião Salgado, em entrevista a Sérgio B. Gomes | Público. 26.3.2015.

Sebastião Salgado, ©Amazonas images – ‘Gênesis’: Norte da Etiópia, 2008.
Sebastião Salgado, ©Amazonas images – ‘Gênesis’: Norte da Etiópia, 2008.

O livro Gênesis é à “minha carta de amor para o planeta”

:: Gênesis, de Sebastião Salgado. São Paulo: Taschen, 2013.
O livro “Gênesis” reúne imagens do fotógrafo Sebastião Salgado que apresentam os paraísos terrestres e seus agrupamentos humanos que vivem como nos tempos primordiais. Fruto do projeto homônimo, inspirado no livro bíblico, a edição, com capa dura e mais de 500 páginas, retrata montanhas, desertos e oceanos, animais e pessoas, as imagens foram feitas entre os anos 2004 e 2012. Divididos em capítulos: “Extremo Sul do Planeta”, “Extremo Norte do Planeta”, “África”, “Amazônia/Pantanal” e “Santuários do Planeta”.

Sebastião Salgado, ©Amazonas images – ‘Gênesis’ – Árvores baobá (Adansonia rubrostipa) numa ‘ilha cogumelo’ na baía de Moramba. Madagascar. 2010.

Sebastião Salgado nasceu em 1944 em Aimorés, Minas Gerais. Formado em Economia, rendeu-se ao mundo da fotografia em 1973. Trabalhou extensivamente para a imprensa internacional ganhando reconhecimento e muitos prêmios por suas reportagens na África. Na década de 90, mergulhou junto com sua esposa, Lélia Wanick, num projeto de vida que foi o embrião da expedição fotográfica Gênesis: a recuperação de uma propriedade completamente degradada, que hoje é o Instituto Terra, instituição dedicada a constituir o ecossistema florestal da região do Vale do Rio Doce, em Minas Gerais. Salgado é também embaixador da Boa Vontade da UNICEF e membro honorário da Academia de Artes e Ciências dos EUA.https://1ad89ba07ea2547a029243a0cf6b0fa8.safeframe.googlesyndication.com/safeframe/1-0-38/html/container.html

Sebastião Salgado e a mulher Lélia Wanick Salgado: vida em comum dedicada à fotografia – foto: Ricardo Beliel

“Um fotógrafo é literalmente alguém que desenha com a luz. Um homem que escreve e reescreve o mundo com luz e sombra. Coloque vários deles em um mesmo lugar e eles tirarão sempre fotos diferentes. Cada um tem sua maneira de ver em função da sua história.”
– Sebastião Salgado, no documentário “O Sal da Terra”. direção: Juliano Ribeiro Salgado e Wim Wenders (2014).

Saiba mais sobre Sebastião Salgado:
Site oficial de Sebastião Salgado:

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