Ao ler o terno texto de Fernanda Japiassu no Facebook, lembramos de Darcy Ribeiro. Fernanda, aqui o que disse o grande Darcy e é isso que nos acalenta:
Fracassei em tudo o que tentei na vida.
Tentei alfabetizar as crianças brasileiras, não consegui.
Tentei salvar os índios, não consegui.
Tentei fazer uma universidade séria e fracassei.
Tentei fazer o Brasil desenvolver-se autonomamente e fracassei.
Mas os fracassos são minhas vitórias.
Eu detestaria estar no lugar de quem me venceu.
Por Fernanda Japiassu – Facebook
Queria entender por que mudei tanto. Nasci na ditadura e “aproveitei” muito. Vivi na Praia Grande em Arraial do cabo, toda minha infância e adolescência. Enquanto meu pai e amigos discutiam a fase de trevas, em apenas duas casas: uma do Jaguar, outra do Henfil que estavam alugadas para a gente e amigos, a praia era só nossa. A Marinha não deixava ninguém entrar para fazer nada, nem os surfistas podiam aproveitar as ondas. Foi assim que vivi o início da minha vida.
Com a separação dos meus pais, fui criada pela minha mãe, coxinha de carteirinha. Vivi no Leblon e Ipanema, aproveitando festas, praias e namorados. Trabalhei muito porque sempre precisei ser independente, mas até o trabalho era uma festa pra mim. Publicidade! Nem precisava me esforçar.
De repente, por um motivo importante, mudei. Para meu “azar”, isso aconteceu na época que me dei conta que vivia em um país horrível; enquanto eu tinha tudo, a maioria estava na merda. Mais “azar” ainda, isso aconteceu no inicio de 2000, quando um governo me deu a esperança que íamos sair da merda; que o ser humano é bom e vai mudar os quadros absurdos de pobreza, fome e desigualdade.
As redes sociais me mostravam que saímos do mapa da fome, pagamos o FMI, as pessoas mais pobres estavam conseguindo formar seus filhos. Poxa, que sorte a minha: alienada quando a tortura existia nos porões e “antenada” quando tudo estava melhorando. Ledo engano! Foi só a pirâmide social começar a se mexer que os poderosos, donos de empresas, mídia e a escória da política nascida no útero de uma das ditaduras mais cruel do mundo, iniciou seu projeto de destruição de uma esperança.
Também, Fernanda, era só lembrar nossa história escravagista, corrupta e obscurantista para deixar de ser burra e ver que tudo que está acontecendo, claro que ia acontecer. Para manter o poder, dinheiro e privilégios de poucos, nosso povo deixou que destruíssem a esperança de um país mais justo, sem pobreza e bem educado. Que idiota foi o Lula e gente, como eu, que acreditou poder mudar a alma escrota do nosso país.
Agora, estou com minha energia contaminada pela raiva e tristeza em ver que tudo está sendo destruído, principalmente quem teve a ousadia de ser o melhor presidente que tivemos, onde todos eram mais felizes, até essa gente, e muita gente queridíssima, que está vibrando com o resultado do STF.
Um resultado que ilustra o momento que vivemos: cruel e injusto. Minha maior raiva é não conseguir voltar a ser aquela moça alienada, para tentar canalizar essa minha energia raivosa para ajudar os bichos, meu projeto de vida e minha contribuição para um mundo que jamais teremos, mas que nunca devemos parar de lutar por ele.
Meu pai me disse uma vez: “vc escolheu o lado que sempre perde”. Achei dramático e errado. Como sempre, ele estava certíssimo.