O Bem Blogado volta com o Show de Bolão. Desta vez, nosso grande baterista e cronista nos fala de Animal, Alexandre Gonçalves Pinto (1870-1950), músico, chorão.
O artista fala seriamente (sim, Bolão fala sério também) sobre o músico Animal e um livro que escreveu sobre os chorões de sua época, “O Choro — reminiscências dos chorões antigos”.
Leia, além da preciosa prosa de Bolão, uma tese de pós-graduação e veja vídeo, de Pedro Aragão, sobre o Animal. Nada a ver com o jogador aquele.
“Pedro Aragão, músico e professor, é escritor do “O Baú do Animal” (Editora Folha Seca), um estudo sobre a obra de Alexandre Gonçalves Pinto, de outras fontes populares da época, e sobre como essas narrativas do passado conformaram diferentes percepções sobre o choro e a música brasileira na atualidade” (Funarte)
Oscar Bolão
Bons dias. O texto abaixo foi publicado no jornal A Ilha, aqui em Paquetá. É uma homenagem sincera. Quem já leu a obra citada vai entender o estilo do texto. Quem não, talvez fique curioso pra conhecê-la. Os termos entre aspas eram usados pelo autor.
Quero me dirigir aos “chorões modernos e também antigos” e pedir desculpas, aos leitores que me lêem, pelas minhas pobres palavras desprovidas de riqueza literária.
Pois não sendo eu literato, não tenho o discernimento correto para escrever as palavras elogiosas que Alexandre Gonçalves Pinto, conhecido nos choros primordiais como Animal, tem por merecimento. Sendo que depois que li seu inigualável livro de memórias, que é chamado de ‘O Choro – reminiscências dos chorões antigos’, foi que percebi o quão importante é esta obra para o conhecimento deste gênero que é o choro e para a história desta Cidade Maravilhosa, que é o Rio de Janeiro, e para a eternização da “avalanche” dos grandes artistas renomados que viveram suas vidas para esta música.
Na minha “pobreza de inteligência” não atino por que tinha o Animal este epíteto – visto que nas suas narrativas percebemos se tratar de uma “pomba sem fel” que expressava seus melhores sentimentos de respeito aos seus “congêneres” e até mesmo aos “facões”, que eram aqueles que tocavam muito mal. Chorão de “nomeada”, respeitado nas rodas, era inveterado nos “bons e péssimos bailes” onde podia tocar seu cavaquinho e também seu violão.
Carteiro de 1ª classe, pessoa de pouca instrução, ele demonstrou, no entretanto, a grande sabedoria daqueles que se preocupam com a história “dos dias que passaram e não voltam mais”. Isso tem muito valor!
Infelizes daqueles que do alto da sua erudição metem a ridículo o simplório Alexandre porque não conhecem a grandeza do espírito humano. Tais homens de academia, desprovidos das boas intenções, são cegos que tateiam pelos caminhos da vaidade e não conseguem ler o que está escrito no meio de tantas letras, e que são coisas importantes.
Aos “tocadores batutas” da “nova guarda”, como também aos “fraquinhos”, fica então o aconselhamento desta leitura. O virar das páginas será como o descortinar de cada “feito dos grandes mestres” – que “gostavam muito de ir a pagodes onde também houvesse farta mesa, com o competente molho, para bem descer o mastigo”.
Vê-se também nesta obra meritória que nestes “choros moles” a alegria e a camaradagem prevaleciam – mesmo quando a virtuosidade dos “instrumentos cantantes” de “primeira grandeza” faziam “cair” até os “acompanhadores seguros”.
Querido Alexandre, “primus inter pares”, eu queria te dar um abraço mas você já “desapareceu do meio dos vivos”. Saiba, em que celeste choro você esteja, que serás para sempre o Animal da estimação de todos nós. Imagino o esforço que tu fizeste com a cabeça, escarafunchando a memória e perseguindo as palavras melhores.
Alexandre, teu livro é uma enciclopédia! Os chorões dos tempos de agora, e dos que virão, ficarão para sempre emocionados pelo seu ufanoso e heroico serviço prestado à música do choro.
Então, terminando de escrever o que eu tinha para falar, deixo vocês com as palavras que o Animal disse e que poderiam ser minhas:
“Os que comungam com os meus sentimentos de apaixonado veterano e saudoso folião, encontrarão erros absurdos nas minhas narrativas.
Mas o velho Alexandre não escreveu para ser criticado e sim para relembrar tudo que passou e que em nossos corações de velhos ainda vive! Leitores, perdoem todos os erros, mas façam justiça a este folião que Deus conservou para rabiscar estas linhas de recordações e saudades”.
Estamos fazendo. Muito obrigado, Alexandre Gonçalves Pinto!
Bossa Criativa| Casa do Choro| Pedro Aragão | Princípios do choro (Personagens do choro)
Pedro Aragão fala sobre um livro imprescindível, maior referência da música carioca do século XIX: “O Choro – reminiscências dos chorões antigos”, lançado em 1936 por um modesto carteiro e músico amador, Alexandre Gonçalves Pinto, o “Animal”.
Novo vídeo da série Personagens do Choro, parceria entre Funarte e UFRJ, aborda livro sobre o tema
Obra de Alexandre Gonçalves Pinto, lançada em 1936, é considerada a maior referência da música carioca do século 19
Casa do Choro: Enciclopédia Ilustrada do Choro no Séc. XIX
“O Animal”
O Baú do Animal: Alexandre Gonçalves Pinto e o Choro
Programa, tese, de pós-graduação e música, Universidade Federal do Rio de Janeiro