Por Luis Felipe Miguel, cientista político –
Colunista da Folha, ontem, escreveu que a “presença ostensiva de partidos de esquerda” nas manifestações de sábado “ofereceu de bandeja um discurso fácil” para os bolsonaristas.
É a justificativa também para a ausência de muitos daqueles que dizem que são pelo impeachment, mas vetam qualquer pressão para que ele aconteça.
Vejo este discurso repercutindo também em gente do nosso lado, que acha que é bom retirar das ruas as bandeiras, as faixas, o vermelho, a fim de atrair nossos possíveis parceiros da “frente ampla”.
Creio que é uma percepção profundamente equivocada.
É claro que a agenda das manifestações é muito mais ampla do que a esquerda: vacina para todos, políticas de saúde baseadas em evidências científicas, fim da carreira do genocida no poder.
Uma direita minimamente civilizada tem que estar de acordo.
As ruas têm que estar abertas para todos que apoiem esta pauta mínima. E estão, de fato: ninguém proibiu a direita de se juntar às manifestações.
Tenho certeza de que seria bem vinda.
Mas estar aberto a todos significa que ninguém tem que se esconder. Nem a esquerda.
Mais ainda: não implica esquecer o passado, nem apagar responsabilidades.
Que venham todos que hoje são contra Bolsonaro. Mas cabe lembrar: quem nunca aceitou o discurso dos “dois extremos”?
Quem nunca caiu na balela da “chance de ouro de ressignificar a política no Brasil”?
Quem não foi passear em Paris?
Quem sempre defendeu o SUS?
Silenciar a esquerda, apagar a esquerda, retirar a esquerda do debate público – este é o projeto de quem deseja uma retomada apenas parcial e limitada da democracia, de quem não é capaz de superar os motivos que levaram à aliança hoje renegada com o bolsonarismo.