STF suprime direitos dos trabalhadores à proteção sindical, por Sérgio Nobre e Valeir Ertle

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Por Sérgio Nobre, compartilhado de Jornal GGN – 

A crise acentua a necessidade dos sindicatos e de que os acordos sejam coletivos e não individuais, para evitar proteger os trabalhadores

O STF (Supremo Tribunal Federal), instituição a qual cabe zelar e defender a Constituição federal, chancelou na sexta-feira (17) a assinatura de acordos individuais sem a presença e participação dos sindicatos de trabalhadores. A decisão ocorreu quando o STF julgava a ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade) nº 6.363.

A justificativa dos ministros de que se tratava de uma excepcionalidade foi usada para deixar os de baixo, especialmente trabalhadores e trabalhadoras que recebem até três salários-mínimos, abandonados à sua própria sorte, diante da pressão dos empregadores para que assinem acordos individuais. O interesse da classe patronal é reduzir os salários ou não os pagar, por meio da suspensão do contrato de trabalho no período da pandemia.




O raciocínio preponderante no STF guarda relação com o Direito Penal do Inimigo. No caso, com os direitos dos trabalhadores e trabalhadoras de baixa renda, tratados como inimigos de classe. A exclusão dos sindicatos visa assegurar que as pretensões do patrão prevaleçam sobre as necessidades de quem tem apenas sua capacidade de trabalho e seu suor a oferecer. Exclui os sindicatos para manter a desigualdade na relação entre patrão e empregado, para, na verdade, excluir os direitos dos de baixo e privilegiar os de cima.

Rasgaram a Constituição, mesmo reconhecendo que ela exige expressamente negociação coletiva e a presença dos sindicatos para discutir propostas de acordo que envolvam redução salarial. Não se trata de ignorância, mas da posição de alguns ministros favoráveis aos de sua classe e contrários aos trabalhadores de baixa renda. Suas posturas jurídicas antissindicais vão levar o Brasil a subir mais alguns degraus na lista da OIT dos países que desrespeitam os direitos sindicais.

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Destaque merecem os ministros Luiz Fux e Roberto Barroso por negarem o papel histórico dos sindicatos na construção e defesa de direitos, desde a conquista da jornada máxima de trabalho de 8 horas até a proteção das trabalhadoras contra o assédio sexual e moral. Para eles, os sindicatos atrapalham. Posição comum entre os empregadores que vivem do suor alheio e que não querem limites à exploração dos trabalhadores. Adotaram uma postura arrogante, de desrespeito e forte ódio aos sindicatos pela defesa que fazem dos de baixo contra a espoliação praticada pelos de cima.

A postura conciliadora do ministro relator Ricardo Lewandowski, apoiado até pela Advocacia-Geral da União, que representa o governo, foi superada pelo desejo daqueles que não conseguem se livrar de suas posições de classe contra os trabalhadores de baixa renda. Dessa forma, rejeitaram até a posição do relator, que se posicionou muito aquém do que diz expressamente a Constituição, como reconheceram o ministro Edson Fachin e a Ministra Rosa Weber.

A Constituição exige o acordo com participação do sindicato em qualquer situação, especialmente naquelas onde o trabalhador se encontra sujeito à pressão, obrigado a aceitar qualquer coisa que lhe ofereçam para salvar seu emprego, como está ocorrendo com a pandemia do coronavírus. A existência de uma crise acentua a necessidade da presença dos sindicatos e de que os acordos sejam coletivos e não individuais, para evitar que o trabalhador tenha que aceitar as condições oferecidas ou ser demitido.

A crise apresentada pelos ministros do STF não justifica submeter trabalhadores de baixa renda a acordos individuais.  Não fosse em função da crise e da quarentena, qual o motivo de reduzir salários? A redução de salários, as suspensões de contratos com redução de benefícios sempre ocorrem e são produto de crises. O Programa de Proteção ao Emprego (PPE), o afastamento temporário e o lay-off foram implementados em situações de crise e, em todos esses casos, a presença dos sindicatos foi assegurada e suas atuações, fundamentais.

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Para a CUT, garantir os empregos e salários decentes é questão essencial para quem vive de seu trabalho, situação absolutamente diferente daqueles que vivem de renda, de juros e da exploração do trabalho alheio. A CUT defende que os empregos têm que ser de qualidade. Que a vida humana, a saúde, a decência e a integridade são conquistas civilizatórias, são direitos e não favores da elite do País.

Os argumentos apresentados pela maioria dos ministros do STF representam visão retrógrada, típica dos donos do poder e da Casa Grande, para quem os direitos dos trabalhadores são favores. Visão típica de coronéis, de escravagistas, de gente como o dono da Havan e latifundiários.

A lamentável decisão do STF dispensa a obrigatoriedade do sindicato para os acordos de redução salarial ou suspensão de contratos, por 60 dias, no período da pandemia, para trabalhadores na faixa salarial de até 3 salários-mínimos, mas não impede que sejam celebrados acordos coletivos para dar mais segurança e proteção.

Os acordos coletivos protegem trabalhadores, de um lado, e dão mais segurança às empresas, por outro. Os acordos individuais, ao contrário, podem resultar em milhares de questionamentos judiciais. Qualquer trabalhador que assinar um acordo, coagido pela situação, passada a crise poderá questionar os termos do acordo na Justiça.

Apesar da decisão do STF, os sindicatos vão continuar cumprindo seu papel e intensificar suas ações pela realização de acordos e convenções coletivas especiais, que assegurem garantias de emprego, salário e renda, a manutenção do isolamento social e o retorno das atividades no momento adequado e em segurança.

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A MP 936/20 já está em vigor mas poderá ser alterada ou derrubada pelo Congresso Nacional. Ainda terá que ser votada na Câmara dos Deputados e no Senado Federal. A decisão do STF foi apenas um lance perdido, mas a partida continua. A vitória que obtivemos ao sepultar a MP 905/19 nos leva a convocar novamente todas as forças democráticas e populares a se unirem contra as arbitrariedades estabelecidas na MP 936/20. Temos inúmeras batalhas pela frente, dentre as quais está a de impedir que os retrocessos previstos nesta MP sejam convertidos em lei.

Temos a tarefa de reduzir o estrago dessa lamentável decisão do STF, atuando firmemente no Congresso Nacional, onde pressionaremos e defenderemos os interesses dos trabalhadores e das trabalhadoras contra todas as medidas arbitrárias deste “desgoverno”. Em defesa da vida, dos empregos, com salários e renda dignos para todos.

Sérgio Nobre, presidente nacional da CUT e Valeir Ertle, secretário nacional de Assuntos Jurídicos da CUT

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