Por Carlos Eduardo Alves, jornalista, para o Bem Blogado
Não há como o governo Lula fugir dessa batalha pela correção do Imposto de Renda. É preciso ir além e tributar os milionários beneficiários da farra de isenções. Será preciso rua para arrancar a justiça.
Com rapidez se levarmos em conta a tragédia que herdou, o governo Lula vai reconstruindo o Brasil. A civilidade já foi recuperada, a normalidade democrática virou felizmente rotina e avanços significativos já podem ser observados na Economia. Em tão pouco tempo, agências internacionais de avaliação de risco já modificaram para melhor as notas do País, o dólar caiu, a Bolsa subiu e até o desemprego “despiorou”, embora ainda de qualidade ruim. Mas o governo por enquanto não enfrentou algumas batalhas decisivas e não basta jogar tudo nas costas de Lula para atingir objetivos mais ambiciosos, mas necessários.
Noticia-se, mesmo que meio escondido, por exemplo, que o ministro Fernando Haddad pretende mandar à Câmara dos Deputados proposta para taxar os super ricos brasileiros, que por meio de brechas absurdas cavadas pelo chamado “planejamento tributário” não pagam imposto algum, ao contrário de cidadãos com renda pequena. A isenção estendida a lucros e dividendos é também um acinte no País já tão injusto socialmente.
Não à toa, o presidente da Câmara, Artur Lira, nem dissimula a má vontade para discutir a questão. Lira representa a média de um Congresso majoritariamente conservador, que não endossa modificações que alterem o modelo tributário que pune o consumo e os pobres e poupa os muito ricos.
Não há como o governo Lula fugir dessa batalha pela correção do Imposto de Renda. Não basta isentar os que ganham pouco hoje e são descontados em folha. É preciso ir além e tributar os milionários beneficiários da farra de isenções. E aí não se pode contar com tramitação fácil no Parlamento. Será preciso rua para arrancar a justiça.
Até agora, talvez pelo alívio advindo do fim de 6 anos de governos (Temer e Bolsonaro) tenebrosos, o campo progressista está assistindo pela TV e redes sociais o esforço de Lula e equipe. Os acréscimos até agora foram frutos de competência e da lei não escrita que dá crédito a um governo recém-eleito pelas urnas. É quando, usando uma figura de linguagem antiga, o tinteiro está cheio.
Isso mesmo se Lula conseguir cooptar para seu governo novas siglas da direita civilizada. O parto que está sendo aprovar uma reforma tributária cordata e sem resultados a curto prazo já dá ideia de como será o campo de uma batalha mais impactante para o cotidiano dos brasileiros que será fazer os milionários pagarem imposto minimamente justo.
Não há dinheiro suficiente para cumprir o arcabouço fiscal se não aumentar a arrecadação. Remendos aqui e ali, como a correta taxação das apostas esportivas, não resolverão o problema.
A maneira mais legítima e justa socialmente será corrigir a distorção que sobretaxa o consumo de todos e deixa escapar do Fisco o rendimento exorbitante dos muitos ricos. É isso não será conseguido sem que exista pressão, legítima no sistema democrático.
A quase letargia da sociedade civil organizada e dos partidos políticos progressistas é preocupante. A mesma letargia foi em parte responsável pela facilidade com que foi desferido o golpe contra Dilma. A direita se apossou da rua naquela triste ocasião.
Lula não corre o mesmo risco mas só poderá avançar se tiver respaldo com mobilização. É bom que ocorra logo. A direita aprendeu a trilha do asfalto, que antes era só nosso, e não será surpresa se, diante de nossa preguiça, ir antes para a rua para combater o fim de seus privilégios.
Lula pode muito, mas poderá muito mais se o povo organizado lutar com ele por mudanças na absurdamente atrasada estrutura tributária brasileira.