Milionários brasileiros têm no exterior R$ 1 trilhão de reais investidos em diversos fundos. Proposta de taxação faz parte de pacote do Ministério da Fazenda para elevar a arrecadação fiscal do governo.
Compartilhado do Portal da CUT
VALTER CAMPANATO / AGÊNCIA BRASIL
Nota de 100 dólares
A Câmara dos Deputados aprovou na noite desta quarta-feira (25) o projeto de lei que tributa os fundos exclusivos usados por super-ricos e de offshores (empresas de pessoas físicas sediadas no exterior). Foram 323 votos a favor e 119 contrários. O texto agora segue para análise no Senado.
A taxação dos super-ricos e dos offshores também foi uma luta da CUT para que haja mais justiça fiscal e social. Hoje no Brasil, é possível arrecadar cerca de R$ 300 bilhões ao ano tributando apenas 0,3% mais ricos da população, o que representa apenas 600 mil pessoas entre os 215 milhões de brasileiros, segundo dados do Instituto Justiça Fiscal (IJF). Dinheiro que poderia ser investido em obras essenciais, na saúde e na educação, entre outros setores
Em entrevista recente ao Portal CUT, o secretário de Administração e Finanças da CUT, disse que “a taxação dos super-ricos é necessária para que se possa alcançar uma reforma que busque diminuir as desigualdades que temos na tributação. Hoje ela é basicamente sobre o consumo. É preciso taxar quem vive de renda, de grandes cotas de ações e não apenas fazer uma reforma que simplifique os impostos sobre o consumo como foi o primeiro projeto de Haddad [ministro da Fazenda] a ser aprovado”.
Fundos exclusivos dos super ricos
Os fundos exclusivos de super-ricos têm aplicação mínima de entrada de R$ 10 milhões e taxa de manutenção de R$ 150 mil por ano. Hoje, apenas 2,5 mil brasileiros aplicam nesses fundos, que acumulam patrimônio de R$ 756,8 bilhões e respondem por 12,3% da indústria de fundos no país.
Atualmente, os fundos exclusivos pagam Imposto de Renda (IR), mas apenas no momento do resgate e com tabela regressiva, quanto mais tempo de aplicação, menor o imposto. O governo quer igualar os fundos exclusivos aos demais fundos de investimento, com cobrança semestral de IR conhecida como come-cotas. Além disso, quem antecipar o pagamento do imposto pagará alíquotas mais baixas.
Segundo o Banco Central (BC), se incluir na conta dos fundos o sistema offshore (legal, mas injusto do ponto de vista tributário brasileiro, onde os ricos não pagam impostos sobre lucros e dividendos), os milionários brasileiros têm no exterior R$ 1 trilhão de reais investidos.
A taxação dos offshores poderia gerar a arrecadação total de R$ 20 bilhões. Porém, mudanças realizadas na Câmara devem reduzir a previsão inicial de arrecadação.
Ariovaldo de Camargo, também já afirmou que a CUT é favorável a tributação do dinheiro em offshore. “Estamos falando de um volume muito grande dinheiro. Não é uma aplicação qualquer, uma poupança do trabalhador. São fortunas produzidas aqui que poderiam ser investidas na melhoria da saúde, da educação, em infraestrutura que gera emprego e renda, e nas demais políticas públicas que municípios, estados e a União promovem”.
A medida é considerada uma parte importante do pacote do Ministério da Fazenda, chefiado pelo ministro Fernando Haddad (PT), com o objetivo de zerar o déficit das contas públicas em 2024 e aumentar a arrecadação do governo.
A proposta aprovada
O texto aprovado estabelece que os lucros obtidos com recursos em offshores serão tributados em 15% sobre os ganhos, uma vez ao ano. Fundos exclusivos também serão taxados em 15%, semestralmente. Hoje, o tributo é recolhido somente no resgate das cotas ou na liquidação do fundo. A proposta original do governo previa uma taxação de 22,5%.
Além disso, a alíquota a ser paga pelos detentores dos fundos, tanto no Brasil quanto no exterior, passará de 6% para 8% na atualização dos ganhos acumulados até agora.
O relator, deputado Pedro Paulo (PSD-RJ), também realizou uma alteração na proposta original que modifica a quantidade de cotistas em Fundos de Investimento em Cadeias Agroindustriais (Fiagro).
O novo texto estabelece a redução de 300 para 100 o número de cotistas em cada fundo, sendo que apenas 30% podem ter parentesco de até segundo grau. Atualmente, o número mínimo de cotistas é de 50, e o governo havia proposto que subisse para 500. Segundo o governo, essa medida evitaria que membros da mesma família formem um fundo para escapar de impostos. Por se tratar de uma alteração na legislação do IR, o projeto de lei deverá ser aprovado nas duas casas legislativas e sancionado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva ainda este ano para começar a vigorar em 2024.
Confira o projeto da câmara
Fundos exclusivos
- Instrumento: originalmente era medida provisória, mas texto foi incorporado a projeto de lei;
- Como é: tributação apenas no momento do resgate do investimento;
- Tributação: alíquota de 15% (fundos de longo prazo) ou de 20% (fundos de curto prazo, de até um ano) de Imposto de Renda sobre os rendimentos uma vez a cada semestre por meio do mecanismo chamado “come-cotas” a partir do ano que vem. Fundos com maiores prazos de aplicação têm alíquotas mais baixas por causa da tabela regressiva de Imposto de Renda;
- Atualização antecipada: quem optar por começar a pagar o come-cotas em 2023 pagará 8% sobre o estoque dos rendimentos (tudo o que rendeu até 2023). O governo propôs dois modelos de pagamento
– 8% para quem parcelar em quatro vezes, com a primeira prestação a partir de dezembro. Na medida provisória, o governo tinha proposto alíquota de 10% nessa situação;
– 15% para quem parcelar em 24 vezes (dois anos), com primeira prestação a partir de maio de 2024.
Offshore e trusts
- Instrumento: projeto de lei;
- Como é: recursos investidos em offshores, empresas no exterior que abrigam fundos de investimentos, só pagam 15% de Imposto de Renda sobre ganho de capital se voltarem ao Brasil;
- Tributação: 15% de cobrança anual de rendimentos a partir de 2024, mesmo se dinheiro ficar no exterior. Governo tinha proposto alíquotas progressivas de 0% a 22,5%, conforme os rendimentos anuais
- Apuração: lucros das offshoresserão apurados até 31 de dezembro de cada ano
- Forma de cobrança: tributação dos trusts, relação jurídica em que dono do patrimônio transfere bens para terceiros administrarem.
- Como funcionam os trusts: atualmente, legislação brasileira não trata dessa modalidade de investimento, usada para reduzir o pagamento de tributos por meio de elisão fiscal (brechas na legislação) e facilitar distribuição de heranças em vida;
- Atualização antecipada: quem optar por atualizar o valor do estoque dos rendimentos (tudo o que rendeu até 2023) pagará menos. Nesse caso, a adesão é voluntária. O governo propôs dois modelos de pagamento
– 8% para quem parcelar em quatro vezes, com a primeira prestação a partir de dezembro. Na medida provisória, o governo tinha proposto alíquota de 10% nessa situação;
– 15% para quem parcelar em 24 vezes (dois anos), com primeira prestação a partir de maio de 2024.
- Variação cambial: lucro com alta do dólar não será tributado em duas situações
– variação cambial de depósitos em conta corrente ou em cartão de crédito ou débito no exterior, desde que os depósitos não sejam remunerados;
– variação cambial de moeda estrangeira para vendas de moeda de até US$ 5 mil por ano.
Fiagro e fundos de investimentos imobiliários
- Definição: Fiagros são fundos de investimento em cadeias agroindustriais, fundos de investimentos imobiliários são fundos que aplicam em imóveis
- Como é: fundos com pelo menos 50 cotistas e com cotas negociadas na bolsa de valores ou em mercados de balcão de derivativos têm isenção de Imposto de Renda
- O que muda: para obter isenção de IR, número mínimo de cotistas sobe para 100, com limite de cotas entre familiares a 30% do patrimônio líquido total, incluindo parentes até o segundo grau. Receita Federal tinha proposto 500 cotistas, depois reduziu proposta para 300
- Impacto: segundo relator, de 70 fundos do tipo, apenas quatro perderiam a isenção do IR
Com informações do Brasil de Fato e Agência Brasil