Por Leandro Fortes
Havia sido comprada por uns tostões na Feira do Paraguai pela mãe de meus filhos, em 2003, para viver com eles em um apartamento da Asa Norte. Mas, com cinco meses, havia se transformado numa espécie de Diabo da Tasmânia. Roía, mastigava e mordia tudo que via pela frente: móveis, tapetes, cortinas, CDs, aparelhos eletrônicos.
…
Iria ser doada para outra pessoa quando os meninos, ainda pequenos, imploraram para que eu ficasse com ela.
Eu, um homem solteiro, numa vida de poucas regras e sem nem um curió em casa para tomar conta.
Mas era um pedido de meus filhos e, além do mais, sempre amei cachorros.
Teca continuou roendo, mastigando e mordendo tudo da mesma maneira, só que, dessa vez, no meu apartamento. Mas em vez de ficar zangado, me apaixonei por ela.
Por treze anos, foi minha amiga querida, uma filha amada.
Nesse tempo, essa cadelinha cocker cor de caramelo e de temperamento instável e brincalhão ajudou a mudar minha visão sobre a vida e sobre mim mesmo.
Entre outras coisas, me ensinou a sorrir de suas pequenas tragédias e das minhas grandes preocupações. Com ela, por causa dela, aprendi a ver leveza mesmo nos momentos mais difíceis.
Acostumei-me, nesses anos, a acordar e dormir dentro de sua rotina. Juntos, criamos o amálgama de uma existência comum, humana e canina, a ponto de, em certo momento, passarmos a nos entender e a nos comunicar apenas pelo olhar.
Ela envelheceu a meu lado, fiel e solidária, desse jeito desprendido de amar que só os cães têm.
Hoje, vencida pelo tempo, ela se foi tranquila, nos meus braços, com o focinho banhado pelas minhas lágrimas, mas certa de que, enquanto esteve por aqui, foi a criatura mais amada que passou por essa vida, e não apenas por mim.
Todos os que vivemos com ela, em maior ou menor proximidade, estamos com o coração oco e a alma ferida.
Foi-se, animal do Cerrado, como veio: antes das chuvas.
Não está mais fuçando as plantas do quintal, nem implorando por biscoitos na porta da cozinha.
Mas sua presença enorme ainda ficará na casa, por muitos anos.
Insubstituível.