Por Fernando Horta do BLOGFERNANDO, publicado no Jornal GGN –
Foi publicado pela Universidade de Oxford um estudo sobre a propaganda na rede feita no Brasil de 2013 até 2016. O autor é Daniel Arnaudo pesquisador da Universidade de Washington. O tema é ainda muito novo, grande parte das referências de Arnaudo ainda são jornalísticas, mas isto não tira a importância das informações contidas no documento.
Segundo o estudo, o Brasil tem uma população com quase 210 milhões de habitantes e apenas 26 milhões tem acesso regular à internet via computador. Isto poderia parecer pouco e jogar contra a tese de que a atuação nas redes sociais poderia influir na política brasileira. Ocorre que temos quase 250 milhões de celulares aptos ao uso da internet. Em qualquer ponto aberto estes aparelhos se conectam ainda que por um período de tempo curto e seus aplicativos fazem o resto. Neste sentido, privilegiam-se os textos em migalhas (curtos), memes e vindos locais (sites) previamente escolhidos. Apesar da imensa quantidade de fontes de informação na internet, estes 250 milhões de celulares buscam nos mesmos espaços, previamente delimitado, suas informações. Não há busca, não há pesquisa, não há diversidade. É quase um público cativo de determinados fóruns e sítios.
O estudo traz o argumento de que as mídias tradicionais estão sendo “engolidas” pelos sistemas mais informais de fontes de informação. E que quase 95% do tempo dos brasileiros na internet é dedicado ao Facebook. Esta informação é sim muito preocupante. Com base nisto, o autor passa a perguntar como as redes (prioritariamente Facebook, Twitter, Whatsapp e etc.) se colocaram dentro da luta política no Brasil desde 2013, lembrando que este é um processo sem volta. Algumas projeções dão conta de que até 2020 todas as pessoas no mundo terão alguma ligação com a rede mundial de computadores.
Dentro da noção de “ação política digital” a SpamHaus Project (um grupo de empresas que monitoram a internet) afirmou que no dia 17 de maio de 2017 (escolhido aleatoriamente) foram detectados ativos e atuando nas redes brasileiras 485.133 bots. Bots são algoritmos digitais criados para agirem nas redes parecendo humanos. Eles podem dar “likes”, repercutir assuntos e alguns até fazerem interações escritas simples. O Brasil tinha, naquele dia, o quarto maior número de bots ativos no mundo, perdendo apenas para China, Índia e Rússia. “Curiosamente”, os BRICS.
O estudo afirma que estes bots foram usados durante a campanha de 2014 por todos os candidatos. Mas, enquanto Aécio Neves tinha um número de bots capazes de alcançar 80 milhões de pessoas com suas mensagens, Dilma Rousseff possuía número muito menor e atingia apenas 22 milhões. O custo, apenas das operações com bots, da campanhade Aécio Neves seria de algo próximo a R$ 10 milhões de reais. A lei brasileira proíbe que as campanhas dos candidatos contratem bots e outras formas de agência na rede. Mas não proíbe que “simpatizantes” dos candidatos o façam. Daí que a lei se torna obsoleta.
Enquanto a campanha de Dilma desativou a imensa maioria dos bots após a reeleição, mantendo apenas alguns poucos trabalhando para o governo federal (veiculando propaganda do governo), todo o arsenal de Aécio foi redirecionado para atuar em favor dos grupos “Revoltados OnLine” e “Vem pra Rua. Assim”, o ataque destes bots na rede (que atingiam cerca de 80 milhões de pessoas) continuou após 2014, veiculando notícias faltas, ofensas, repassando postagens negativas, incitando ódio ou conclamando a manifestações. Enquanto em 2013 o trabalho dos bots era contrarrestado por uma militância (ainda que caótica), em 2015 o padrão de ataque ao governo do PT, feito pelos bots, se torna claro e evidente.
O Brasil não é o único país a sofrer este tipo de ação. Nos EUA, na eleição de Trump, na França de Macron, por exemplo, os mesmos padrões de ação foram identificados. Inclusive a empresa que trabalhou e trabalha nestes países chegou ao Brasil recentemente, a Cambridge Analytica, demonstrando que as próximas campanhas enfrentarão os mesmos problemas. A discussão agora é como barrar este tipo de ataque e como mitigar seus efeitos que, claramente, solapam a democracia. Nos EUA, por exemplo, os democratas apostam na interferência de bots russos pró-Trump na última eleição e tentam criar marcos de controle para este tipo de ação. No Brasil não temos nem legislação para fiscalizar ongs como os Estudantes pela Liberdade, que dirá um marco legal efetivo para coibir os ataques digitais à democracia.
É claro que a comprovação deste tipo de ação deveria ensejar um posicionamento dos nossos órgãos superiores. Mas a discussão jamais chegou neste nível. Até porque, quem pagou por estas ações acredita que, ainda que elas sejam vis e antiéticas, o objetivo final era “acabar com o PT” e, para isto, qualquer esforço era bem-vindo. Infelizmente, no Brasil atual, cristalizou-se a ideia de que os fins justificam os meios. Reduziram o país a uma crise econômica com fronteiras e uma bandeira, cheia de pessoas se odiando para todos os lados. E tudo isto para evitar um projeto progressista, que não tinha nada de “revolucionário”. Diante das decisões de Gilmar Mendes barrando Lula ministro, da decisão do STF de acabar com o princípio da inocência e das reformas trabalhistas e previdenciária de Temer, o que são uns “botzinhos”. É o novo Brasil que se rege, sem nenhuma vergonha, pela lei do mais forte.