Temerosa trapalhada

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Por Arnaldo César, Blog Marcelo Auler – 

Qualquer recruta recém-chegado no quartel sabe que o Exército não é força de contemplação. Ao contrário. Trabalha sobre a lógica da eliminação de alvos e de inimigos. Quem já passou por uma escola militar, certamente, já ouviu a história da velinha e uma criança de colo que estão cruzando uma ponte prestes a ser dinamitada por um grupamento militar.

Tanques de guerra subiram no Vidigal em 2011
Tanques de guerra subiram no Vidigal em 2011

Aos iniciantes pergunta-se: o que fariam numa situação dessas? Aguardariam a senhora e sua acompanhante a completar o trajeto e depois executariam a missão? Antes de levarem uma bronca do instrutor todos optam por dar uma chance à dupla. A lição é que a destruição terá que ser feita não importando quem esteja dentro o próximo do alvo.

Essa história de caserna é corriqueira. O ministro da Defesa, Raul Jungmann, e o presidente golpista Michel Temer parecem desconhecê-la por completo. Talvez, se soubessem não teriam colocado a principal força militar do País numa roubada de tamanha envergadura: conter matanças em presídios.

Em novembro de 1994, aoocupar o Morro do Borel, na Tijuca (RJ) o Exército deixou um rastro de pessoas torturadas e ainda desmontou o Cruzeiro que a Igreja tinha colocado no alto da comunidade, achando que era coisa dos traficantes. Diuas depois, na Câmara Federal, o ministro do Exército, Zenildo Lucena, desculpou-se na Câmara Federal quando cobrado pelo deputado Miro Teixeira.
Em novembro de 1994, ao ocupar o Morro do Borel, na Tijuca (RJ) o Exército deixou um rastro de pessoas torturadas e ainda desmontou o Cruzeiro que a Igreja tinha colocado no alto da comunidade, achando que era coisa dos traficantes. Dias depois, na Câmara Federal, o ministro do Exército, Zenildo Lucena, desculpou-se na Câmara Federal quando cobrado pelo deputado Miro Teixeira.

No final de 1994, o recém-eleito governador do Rio, Marcello Alencar – temendo a escalada da violência no Estado que ia comandar – não se conteve e pediu a intervenção das Forças Armadas. Como era o desejo dele, as favelas foram sitiadas, em novembro daquele ano, nos estertores do segundo governo de Leonel Brizola (na verdade, quem ocupava a cadeira no Palácio Guanabara, naqueles dias, era o vice Nilo Batista).

"Resta torcer para que os militares não saiam (das operações nos presídios) mortos ou humilhado". Em novembro de 201o um soldado do Exército foi ferido quando a tropa ocupou o Morro do Alemão (Zona Norte do Rio)
“Resta torcer para que os militares não saiam (das operações nos presídios) mortos ou humilhado”. Em novembro de 201o um soldado do Exército foi ferido quando a tropa ocupou o Morro do Alemão (Zona Norte do Rio)

As incursões nos morros receberam os nomes de: “Operação Rio I e II”. Foi um tremendo fracasso. Depois se repetiram nos anos 2000 para a implantação das UPPs. Por muita sorte, não se registraram confrontos sangrentos. Embora inocentes tivessem sido torturados e se registrassem muitas trocas de tiros. A captura de armas, drogas e de bandidos seguiu o mesmo padrão do que vinha sendo realizado pelas forças policiais locais.

O coronel PM, Jorge da Silva, um dos pioneiros do estudo da violência nas grandes metrópoles , analisou os resultados desta aventura do tucano Marcello Alencar. Em 1995, recorda Silva, o número de homicídios no Estado do Rio bateu o recorde ao atingir  8.348 ocorrências. A bandidagem, depois da presepada de colocarem canhões mirando para favelas, saiu mais fortalecida do episódio. Se eram 3 mil, em 94, no ano da ‘Operação Rio”, em 95, já somavam 5 mil bandidos em armas.

Duas das instituições de maior credibilidade do País – o Exército e a Marinha – saíram humilhadas daquela encrenca. Já se passaram 23 anos da desastrada experiência e a lição não foi absorvida. Resta torcer para que os mil militares que serão mandados para colocar ordem nos presídios comandados pelo PCC e FDN não saiam de lá mortos ou humilhados.

Temer joga para a plateia ao convocar Exército para enfrentar crise nos presídios (Reprodução Brasil 247)
Temer joga para a plateia ao convocar Exército para enfrentar crise nos presídios (Reprodução Brasil 247)

Todo mundo já disse e escreveu que o usurpador Temer e seus jacarés amestrados não são os únicos responsáveis pelas cabeças cortadas e corações arrancados da mais recente crise da segurança pública brasileira. A coisa vem de longe. Do fim da ditadura para cá todos os governantes tiveram oportunidade atacar o problema. O fizeram com paliativos.

O pendular Temer está conduzindo a questão ao seu modo. Numa hora, minimiza as carnificinas nos presídios chamando-as de “acidente”. Depois, recrudesce prometendo mandar o Exército. E, muito provavelmente irá recuar, quando os amotinados do PCC e demais organizações criminosas direcionarem seus facões para os pescoços dos soldados.

Assim como na liberação (e agora contenção) dos créditos do FGTS, o atarantado Temer joga para a plateia. É oportuno lembrar que não está sozinho nesse picadeiro.

Ao encontrar-se com Temer, no sábado (07/01) a ministra Carmem Lúcia anunciou o censo nos presídios: "É muita desmoralização! Nem o número de pessoas encarceradas a presidente do STF e do Conselho Nacional de Justiça sabe ao certo".
Ao encontrar-se com Temer, no sábado (07/01) a ministra Cármen Lúcia anunciou o censo nos presídios: “É muita desmoralização! Nem o número de pessoas encarceradas a presidente do STF e do Conselho Nacional de Justiça sabe ao certo”.

A ministra Cármen Lúcia, presidente do STF, é outra que começou a andar de ladinho quando o bicho começou a pegar nos Amazonas, Rondônia e Rio Grande do Norte. Para conter a sanha da bandidagem em guerra aberta pelo controle dos tráficos de drogas e armas em todo o País, ela sugere a realização de um novo censo para medir a população carcerária brasileira.

Não há censo que dê jeito na barbárie incrustada nas cadeias. Estudos, teorias e planos existem aos borbotões. A cada crise dessas proporções os especialistas danam a produzir soluções. Que tal começar pela mais prosaica de todas as iniciativas: evitar a entrada de armas e telefones celulares nos presídios?

(*) Arnaldo César é jornalista e colaborador do Blog.

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