Terras Indígenas perderam apenas 1% de sua área de vegetação nativa em 30 anos

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Análise do MapBiomas confirma que povos originários são quem mais preservam a floresta mas alerta para avanço de desmatamento e garimpo

Por Oscar Valporto, compartilhado de Projeto ColaboraA professora e líder indígena Anália Nawa à beira de Igarapé, em meio na Amazônia: povo Nawá faz autodemarcação da Terra Indígena, no Acre, para preservar floresta (Foto: Alexandre Cruz Noronha / Amazônia Real – 05/07/2021)




Análise do MapBiomas – feita especialmente para o Dia do Índio ou Dia dos Povos Indígenas – aponta que, nos últimos 30 anos no Brasil, as Terras Indígenas perderam apenas 1% de sua área de vegetação nativa, enquanto, nas áreas privadas, a porcentagem de desmatamento foi 20,6%. “Os dados de satélite não deixam dúvidas que são os indígenas que estão retardando a destruição da floresta amazônica”, afirmou o engenheiro florestal Tasso Azevedo, coordenador-geral do MapBiomas, no lançamento da análise.

De acordo com dados da plataforma (iniciativa multi-institucional reunindo universidades, ONGs e empresas de tecnologia, e focada em monitorar as transformações na cobertura e no uso da terra no Brasil),  as terras indígenas ocupam 13,9% do território brasileiro, com 109,7 milhões de hectares de vegetação nativa, que correspondem a 19,5% da vegetação nativa no Brasil em 2020.

A perda geral de vegetação nativa no Brasil nos últimos 30 anos foi de 1,1 milhão de hectares. Dentre as categorias fundiárias, as TI estão entre as áreas mais protegidas. Apenas 1,6% do desmatamento recai sobre estas áreas. Por outro lado, nas áreas privadas a perda de vegetação nativa chegou a 47,2 milhões de hectares, o que representou 68,4% de toda a perda. “Sem os territórios indígenas, a floresta certamente estaria muito mais perto de seu ponto de inflexão a partir do qual ela deixa de prestar os serviços ambientais dos quais nossa agricultura, nossas indústrias e cidades dependem”, acrescentou Azevedo.

Os dados do MapBiomas também alertam para as ameaças nas terras indígenas. Nos últimos anos, o desmatamento detectado pelo Deter (Sistema de Alerta de Desmatamento do Inpe) na Amazônia sofreu forte aceleração nas TIs tendo se multiplicado por 1,7 na média dos três últimos anos quando comparado com a média de 2016 a 2018. “As comunidades indígenas já fazem trabalho de manejo do solo e na proteção das florestas, já que está dentro da nossa cultura e de nossos valores nos enxergarmos como parte da floresta”, apontou a deputada federal Joenia Wapichana (Rede/RR), única parlamentar indígena no Congresso Nacional, durante o Acampamento Terra Live, manifestação indígena que ocupou Brasília durante quase duas semanas.

A equipe do MapBiomas também comparou os alertas de desmatamento do Deter em territórios indígenas entre 2016 e março de 2022. Os números mostram saltos sucessivos, especialmente nos anos do governo Bolsonaro – tanto do desmatamento em geral, como do desmatamento por mineração. “Temos sofrido muito com a crescente pressão externa por conta do desmatamento ao redor das nossas terras”, destacou Joenia Wapichana.

Durante a COP26, foi especial destacado o trabalho feito pelos povos indígenas na proteção das florestas. “Foi um reconhecimento muito importante e também foi impactante ver tantas lideranças indígenas falarem sobre os temas em debate na COP26”, disse a parlamentar indígena, lembrando o compromisso de vários países para criar um fundo climático que teria os povos indígenas como referência. Reino Unido, Alemanha, Noruega e Holanda prometeram um fundo de US$ 1,7 bilhão para apoiar povos indígenas e comunidades locais na proteção de seus territórios.

Segundo o mapeamento de áreas de mineração do MapBiomas, de 2010 a 2020, a área ocupada pelo garimpo dentro de terras indígenas cresceu 495%.  As maiores áreas de garimpo em terras indígenas estão em território Kayapó (7602 hectares) e Munduruku (1592 hectares), no Pará, e Yanomami (414 hectares), no Amazonas e Roraima. A quase totalidade (93,7%) do garimpo do Brasil em 2020 concentrava-se na Amazônia.

Indígenas Yanomâmi em protesto na Praça dos Garimpeiros, em Boa Vista, capital de Roraima: violência foi recorde na Terra Indígena Yanomâmi, com a invasão de garimpos ilegais (Foto: Yolanda Mêne / Amazônia Real - 08/09/2021 )
Indígenas Yanomâmi em protesto na Praça dos Garimpeiros, em Boa Vista, capital de Roraima: violência foi recorde na Terra Indígena Yanomâmi, com a invasão de garimpos ilegais (Foto: Yolanda Mêne / Amazônia Real – 08/09/2021 )

Violência nas Terras Indígenas

As consequências das invasões a terras indígenas também estão registradas no Caderno de Conflitos no Campo 2021, relatório divulgado pela Comissão Pastoral da Terra (CPT) nesta segunda-feira (18). No total, foram registradas 1.768 ocorrências, uma média de 34 por semana. Nos dois primeiros anos de Bolsonaro na presidência, foram computadas 1.903 e 2.054 ocorrências, respectivamente. A média foi de 1.408 ocorrências de conflitos nos 18 anos anteriores (2001 a 2018).

Dos 35 assassinatos ocorridos por conflitos no campo, a CPT aponta que os indígenas foram a maioria das vítimas (10), seguidos por sem-terra (9), posseiros (6), quilombolas (3), quebradeiras de coco e assentados (dois cada), pequenos proprietários (2) e uma morte de pessoa considerada aliada da causa.

A situação dos indígenas Yanomamis foi destaque no relatório Conflitos no Campo 2021. A CPT computou três assassinatos de indígenas da etnia, 12 tentativas de assassinato e 101 mortes em consequência, relacionadas especialmente ao garimpo, à contaminação de rios com mercúrio, à proliferação de doenças e à desassistência na saúde pública. Além disso, o documento registra três ameaças de morte feitas por garimpeiros contra funcionários públicos que atuam na Terra Indígena Yanomami.

Para Josep Iborra Plans, da Articulação das CPTs da Amazônia, o governo tem se mostrado permissivo aos ataques em terras indígenas. “Há um incentivo explícito e implícito de um governo que tem tido a maior tolerância com os invasores de terra em áreas indígenas e acenado com a legalização do garimpo nessas terras. Isso tem incentivado muito os invasores e a invasão clandestina, de garimpo e também de desmatamento e grilagem de terras”, afirmou em entrevista a Agência Pública.

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