Por Claudio Lovato Filho, jornalista e escritor
Algumas palavras muito modestas sobre esses pequenos milagres e essas imensas bênçãos que dão às coisas simples o seu verdadeiro valor transcendental.
DE TEMPOS EM TEMPOS
De tempos em tempos é assim:
O homem chega e diz
“Vamos lá?”
E lá se vão
Ele e o guri
Jogar bola no terreno baldio
O homem tenta ensinar alguns truques ao guri
O chute com o peito do pé
A batida de chapa
A matada de bola
O guri tem dificuldade de aprender
Se esforça, mas os resultados são pífios
Mas o homem insiste
Com calma e paciência
Repete as orientações
Retoma os movimentos desde o início
E então deixa estar
E o guri corre com a bola
Tropeça na bola
E ri
Riem
O guri só quer se divertir
Só quer estar com seu velho
E o passe de chapa vira chute de bico
E a matada vira furada
E o cabeceio
O cabeceio nem pensar
E dali a um tempo os dois voltam para casa
O homem com a mão no ombro do guri
O guri com a bola embaixo do braço
A mãe esperando na rede
Tem pizza no jantar
Pizza e Coca-Cola
E quem sabe um jogo na TV
E depois, na hora de dormir
O guri se imagina fazendo coisas incríveis com a bola
Coisas de que até mesmo Deus duvida
E o homem agradece a Deus pelo que tem
Agradece por não ter dúvidas de que tem o melhor que podia ter
E todos adormecem na casa silenciosa
Com um sorriso que não é da boca
É da alma
De tempos em tempos é assim.