Por Adriana do Amaral, jornalista
No canteiro, numa travessa próxima à Avenida Paulista, na capital de São Paulo, as barracas são limpas e organizadas. Muito diferente das inúmeras barracas de sobreviventes ao descaso social evidenciado no centro financeiro e turístico brasileiro. “Este é o Acampamento do Papai-Noel. Estamos aqui porque moramos muito longe, e é difícil para ele levar os presentes. Por isso, as cartinhas. Quem quiser pode pegar e ser o portador dos desejos”, conta a matriarca kelly, mulher brasileira, que não foge à luta e vive e sonha cercada pela prole.
Há 11 anos, o acampamento é montado e, assim, os desejos das filhas que viraram mães são perseguidos. Alguns, realizados.
Kelly viveu em situação de rua, depois em ocupação e hoje mora em casa de bloco, conquistada depois do pedido da “filha do coração“.
Ainda jovem, Kelly perdeu uma das visões e tem dificuldade para caminhar devido à trombose. Mesmo assim teve o seu processo de aposentadoria indeferido e parece não ser carente o bastante para ter direito ao BPC- o Benefício de Prestação Continuada.
“Eu sou trabalhadora”, argumenta contando que paga o aluguel vendendo produtos de catálogos. Mas não há espaço para melancolia na vida da mãe e avó.
Cercada pelos familiares, aos poucos conta a história da caçula, de 11 anos, e que remete à trama de novela. A menina sorri com is lábios e os olhos, e demonstra um amor infindo pela mãe.
Prometeu que, um dia, contará algumas das histórias vividas, num livro. Vontade de contar algumas aqui, mas não tenho o direito de conter o protagoniamo da menina.
Num emaranhado de desencontros e encontros, Julia transpira felicidade. Já passou de ano, está de férias e estudando inglês. De presente quer uma roupa “bonita” e um calçado, mas aceita doações de alimentos.
Ano passado ela ganhou duas bicicletas, e deu uma à prima. “É preciso saber partilhar”, ensinou a mãe.
Quem passa pela rua e interrompe a passagem para um dedo de prosa conhece uma família. Os policiais ficam de olho, mas até o cachorrinho é cuidado com carinho.
O acampamento começa em novembro e seguirá até a véspera de Natal.
É a trégua de uma mulher que lida o ano todo para ser gente.
De perto, testemunhamos o milagre de Natal que inspira desejos.
A família brasileira que remete àquela do conto, os da história, dependendo de quem que ou não.
Para mim, o presépio real. No lugar do estábulo o asfalto, em invés de animais, carros.
Em algum lugar uma estrela invisível, devido à poluição e luzes da cidade, brilha!