Por Washington Luiz Araújo, jornalista –
“A injustiça num lugar qualquer é uma ameaça à justiça em todo o lugar”.
“Se o homem falhar em conciliar a justiça e a liberdade, então falha em tudo”.
Se combinarmos a primeira frase, atribuída ao pastor protestante e ativista político norte-americano Martin Luther King, à segunda, do escritor e filósofo franco-argelino Albert Camus, teremos, em palavras certeiras e definitivas, a visão do descalabro em que vivemos neste momento no Brasil.
Além do golpe parlamentar que tirou do poder legítimo Dilma Rousseff, vemos um ex-presidente sendo considerado réu sem prova, um ex-ministro sendo preso por não terem provas contra ele e outros que já estão trancafiados sem nada de substancial que justifique sua prisão, apenas e tão somente a palavra de corruptos confessos. Tudo isso acobertado por uma mídia que segue o preceito Rubens Ricúpero (ministro da Fazenda de Itamar Franco): “Eu não tenho escrúpulos; o que é bom, a gente fatura, o que é ruim, a gente esconde.” Ou seja, o que é bom ou ruim para eles.
O que se vê é uma prática de prisão arbitrária (sequestro?) para que, reféns e pessoas que com eles tiveram ligações, façam delações. A prova não é mais necessária, desde que o acusado seja do Partido dos Trabalhadores e tenha participado dos governos Lula e Dilma.
Como diz um amigo advogado, “vivemos a maior exceção jurídica da história do país. Os militares fizeram leis que deram suporte a seus excessos. Hoje, o judiciário adapta a lei aos fatos, conforme lhe interessa, e chamam isso de lei em movimento. Não consigo deixar de atribuir esse estado de coisas às pessoas minimamente esclarecidas que embarcaram nessa canoa”.
Muitos embarcam nessa canoa e aplaudem efusivamente o esfacelamento jurídico.Temos situações como a perpetrada pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4). O site Justificando noticia que o tribunal “arquivou, sob o argumento de que situações oferecidas pela Lava-Jato ‘trazem problemas inéditos e exigem soluções inéditas’, , a representação elaborada por 19 advogados contra o Juiz Federal Sérgio Moro em razão da divulgação ilegal de áudios entre a então presidenta Dilma e o ex-presidente Lula. Os advogados apontaram ainda que a conversa foi gravada quando a decisão autorizando a medida já havia expirado e que, não bastasse, o Juiz não tinha competência processual para apreciar a escuta clandestina, uma vez que Dilma usufruía de foro de prerrogativa por função”. O placar que deixou juristas estupefatos foi de 13 a 1.
Mas nem tudo está perdido, pois, como afirmou Darcy Ribeiro, “os fracassos são minhas vitórias. Eu detestaria estar no lugar de quem me venceu”. O único desembargador que votou contra o juiz Sérgio Moro, proferiu: “O levantamento do sigilo contemplou conversas que não guardam nenhuma relação com a investigação criminal, expondo à execração pública não apenas o investigado, mas também terceiras pessoas. De mais a mais, a decisão emanou de juízo incompetente, porquanto constatados diálogos com pessoas detentoras de foro por prerrogativa de função, o que deveria ter ensejado a imediata remessa do feito ao Supremo Tribunal Federal, conforme reiterada orientação daquela Corte”.
Esse é o triste cenário em que vivemos hoje. Cenário que certamente revoltaria Martin Luther King, Albert Camus, Darcy Ribeiro e tantos outros expoentes da liberdade civil no Brasil e no mundo.
Para refletirmos um pouco mais, seguem outras palavras do desembargador Rogério Favretto, ainda sobre a sentença no qual foi voto vencido, mas que, sem dúvida, tem apoio daqueles que lutam por uma justiça na completa e correta acepção da palavra: “O Poder Judiciário, ao qual é própria a função de pacificar as relações sociais, converteu-se em catalisador de conflitos. Não é atributo do Poder Judiciário avaliar o relevo social e político de conversas captadas em interceptação e submetê-las ao escrutínio popular. Ao fazê-lo, o Judiciário abdica da imparcialidade, despe-se da toga e veste-se de militante político”.
Estamos vivendo um momento no país em que utilizam instrumentos de modo que os fins justifiquem os meios, e os objetivos, obviamente, , nada tem a ver com a justiça plena.